Espelho do narcisismo
Pedro J. Bondaczuk
A vaidade é uma
característica inerente ao ser humano. Não há quem não a tenha,
consciente ou inconsciente, posto que em intensidades variáveis.
Alguns, levam-na a extremos (com ou sem razão). Outros, aparentam
não serem nem um pouco vaidosos, contudo, ficariam surpresos se
vasculhassem seu íntimo e trouxessem à tona o que não ousam
revelar a ninguém. Na devida proporção, já escrevi certa feita, a
vaidade sequer chega a se constituir em defeito. O problema (como em
tudo na vida) está no exagero. E este é muito mais comum do que se
pensa.
No duro, no duro, somos mais
do que meramente vaidosos em relação à nossa aparência, nossas
virtudes, nossas obras e nossas conquistas. Somos, em certa medida,
narcisistas. Não nos cansamos de admirar nossa figura no espelho da
mente e nos apaixonamos por ela. Alguns levam a paixão a extremos.
Outros aparentam não serem nem um pouco narcisistas, mas ficariam
surpresos se vasculhassem o seu íntimo e trouxessem à tona o que
não revelam a ninguém. Esta oração é semelhante a outra, mais
acima, mas foi repetida não por engano, mas de propósito. Afinal,
da vaidade saudável para o narcisismo insano basta um simples passo.
Todos, sem exceção, bem no
fundo do subconsciente, nos julgamos os mais belos (mesmo que sejamos
mais feios do que a mãe da peste e rivalizemos, em feiúra, com
Frankenstein ou com Quasimodo), mais sábios (embora sejamos mais
tapados que as toupeiras) e mais virtuosos (a despeito de termos mais
vícios que Nero e Messalina juntos) do mundo.
Muitos, a esta altura, estarão
reagindo à minha afirmação de modos bastante diferentes. Alguns se
limitarão a dizer, a si mesmos: “não sou assim”. No íntimo,
porém, terão plena convicção de que de fato são. Outros torcerão
o nariz e afirmarão, com empáfia e arrogância: “este sujeito é
uma besta! Só escreve bobagens” (referindo-se a mim, claro). São
aqueles aos quais a carapuça serve direitinho, sem necessitar do
mínimo ajuste. Raros admitirão que tenho razão.
Há narcisismo e narcisismo.
Ou seja, essa paixão incontrolável por si mesmo varia de
intensidade e de formas de manifestação. Até os que parecem mais
despojados e com baixa (ou aparentemente nula) auto-estima, são, no
fundo, no fundo, narcisistas. Aliás, estes o são, na maioria dos
casos, em grau superlativo. Levam seu narcisismo ao paroxismo. Apenas
manifestam-no, todavia, de forma negativa, como disfarce.
Algumas pessoas de real valor,
que tiveram acesso às melhores universidades e receberam todos os
tipos de oportunidades na vida (que a maioria jamais pôde, sequer,
sonhar), se omitem da responsabilidade de darem sua retribuição e
contribuírem, assim, para construir um mundo melhor, sob pretextos
esdrúxulos e covardes.
A maioria lesa, com isso, a
sociedade, que lhes proporcionou meios para que estudassem, já que
se forma, salvo raras exceções, em escolas superiores públicas, ou
seja, sustentadas por impostos cobrados, indiferentemente, de pobres
(que, proporcionalmente, pagam mais) e ricos.
Há quem prefira, após a
diplomação, vender cachorro-quente nas ruas de Nova York, do que
ser médico, advogado, engenheiro, professor etc. no país que lhe
proporcionou esses meios de ascensão. O interessante é que, quem
age assim, se utiliza de razões públicas para tentar justificar
emoções privadas. São, contudo, omissos, com todas as letras,
meros parasitas que vivem às custas alheias, irremissíveis
narcisistas.
Afirmam que é impossível
melhorar o mundo e que os que acreditam no poder da vontade humana
para o sucesso dessa tarefa, são alienados, malucos, meros
idealistas, tentando dar sentido pejorativo a essa nobre palavra.
Apregoam, aos quatro ventos,
como se sua afirmação fosse um dogma e que contrariá-lo, portanto,
se constitui em suprema heresia, que por mais que se esforce, o homem
não passa mesmo de animal, subjugado a irresistíveis instintos como
o sexo, a agressividade, a cobiça e vai por aí afora.
Argumentam que quem manda de
fato no mundo é o “mercado”, alçado quase à categoria de uma
divindade, onipotente e onipresente (no que não deixam de ter
razão). Que a violência jamais poderá ser sequer contida, quanto
mais eliminada. Que as drogas vieram para ficar, dada a fragilidade
psicológica de quem recorre a esse meio de fuga da realidade. Que a
vida, por ser única, é para ser gozada e “quem pode mais chora
menos”.
São, na verdade, narcisistas,
que se utilizam do sentimento de impotência como pretexto para a
omissão e, principalmente, para justificar seu imenso egoísmo. Sem
que se apercebam, fazem, apenas, da pretensa impotência, o mais
perfeito espelho que reflete por inteiro e sem omitir o mínimo
detalhe seu monumental narcisismo. A Literatura tratou, e segue
tratando, extensamente da vaidade, em seus variados aspectos. É
extensíssima a bibliografia sobre o tema. Proponho-me a abordar esse
aspecto oportunamente, dada sua extensão e complexidade. Por hoje...
paro por aqui.
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
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