Biblioteca virtual
Pedro J. Bondaczuk
A era da informática vem
contribuindo decisivamente para a racionalização da vida urbana,
fazendo, por exemplo, sem esforço, aquilo que as autoridades vêm
tentando fazer (sem grande sucesso, através dos inconvenientes, mas
necessários, rodízios): tirar centenas de milhares de veículos
motorizados das ruas, objetivando combater vários tipos de poluição
(atmosférica, sonora, visual etc.). Como? Através das chamadas
"cidades virtuais".
O cidadão já pode, se
quiser, realizar operações do cotidiano, como pagar e receber
contas, fazer depósitos e saques em bancos, comprar produtos em
supermercados e lojas etc., sem sair de casa pelo computador,
celular ou tablete. Quando John Naisbitt previu, no livro
"Megatendências", a possibilidade das residências se
transformarem em extensões das grandes empresas e corporações,
muitos viram na previsão novo exercício furado de "futurologia".
Hoje, milhões e milhões de pessoas, mundo afora, trabalham em suas
casas, com computadores próprios ou bancados pelos seus
empregadores. Como se vê, o futuro já chegou e não nos espantamos
com ele!
Todavia, a mim, que sou um
leitor compulsivo e obsessivo (ambos simultaneamente), o que mais me
fascina, nessas “cidades virtuais” que percorro, diariamente, há
mais de vinte anos, são as suas bibliotecas. Obras raras, às quais
pensei que jamais teria acesso – o que me causava, sem dúvida,
imensa frustração e despeito – estão agora ao meu dispor, sem
que eu precise sequer despender um único centavo (a não ser a taxa
mensal do Virtua e, claro, a conta de luz). Fora o fato que não
tenho que sair de casa para me dar esse prazer intelectual e esse
privilégio cultural.
Com toda a despesa que eu
possa ter com meu computador, sai, portanto, evidentemente, muito
mais barato valer-me das bibliotecas virtuais, do que adquirir esses
livros, não importa onde que, ademais, precisaria encontrar em sebos
e/ou livrarias. Muitos, no entanto, estão, há anos, esgotados e não
foram reimpressos há já décadas.
Em uma das minhas férias, por
exemplo, pude ler, nas tantas “bibliotecas virtuais” que visito,
cujos links estão entre os meus sites favoritos, os dois únicos
romances de Machado de Assis que não possuo: “Esaú e Jacó” e
“Memorial de Aires”. Procedi, em relação a eles, como tenho
feito em relação às outras tantas obras que possuo em minha
razoavelmente bem sortida (de mais de quatro mil volumes), mas
caótica biblioteca. Ou seja, elaborei as respectivas fichas de
leitura (que faço questão de serem manuais, naquela minha letrinha
miúda e exótica), anotando os trechos que considero fundamentais
dessas obras-primas do “Bruxo do Cosme Velho”, como Machadão
chegou a ser chamado na intimidade.
É verdade que a leitura na
telinha do computador, ou do tablete, é mais cansativa do que em
papel. Com o tempo, porém, a gente se acostuma. Para quem não se
acostumar de maneira alguma, existe o recurso de gastar pacote e meio
de sulfite e imprimir os livros que queira ler. Apesar dos pesares,
prefiro o método novo. Ou seja, leio-os na tela do computador (ou do
tablete) por achar que me concentro mais e sequer sobrecarrego a
memória da máquina.
Quando quiser reler qualquer
coisa, basta fazer o link da biblioteca virtual em que o tal livro
estiver disponível, de forma rápida e direta, mais cômoda, até,
do que ter que me levantar da minha cadeira e procurar determinado
volume nas minhas abarrotadas e bagunçadas estantes. Essa procura
seria demorada demais. Afinal, não tenho uma bibliotecária que
ponha ordem nessa imensa mixórdia.
Nas estantes da minha
biblioteca misturam-se, de forma aleatória e ilógica, tratados de
filosofia com romances; poesia com livros de antropologia; ensaios
com sociologia e o diabo a quatro. Não raro, em minhas pesquisas,
chego a gastar um dia inteiro à procura de um determinado volume
que, por obra e graça (mais graça, convenhamos) do tinhoso,
geralmente está no lugar mais inacessível possível de determinada
estante.
Já na biblioteca virtual isso
não acontece. Basta acessar o índice dos livros disponíveis, dar
um clique no mouse sobre o seu título e imediatamente o texto está
sob os meus olhos. Outro livro que li, e com o qual me deliciei, em
uma das férias foi “Brasil, país do futuro”, de Stefan Zweig.
Abrindo um parêntese, garanto que não conheço abordagem mais
lúcida, de nenhum escritor brasileiro, sobre o nosso povo, a nossa
história e nossas potencialidades, do que as desse austríaco que se
apaixonou perdidamente por nosso país. Pena que na atual geração
poucas pessoas tenham lido essa obra, que recomendo, com entusiasmo,
aos meus pacientes leitores.
Uma das maiores invenções de
todos os tempos, que nós, pessoas modernas, não valorizamos
devidamente, dada a facilidade de obtê-la (nem sempre foi assim,
pelo contrário) é o livro. Ele permite o acúmulo de sabedoria, de
experiências e de emoções de indivíduos especiais e possibilita o
acesso a elas de gerações e mais gerações, por séculos e mais
séculos (às vezes milênios) afora, após a morte destes. Agora,
nesta incrível era da informática e, sobretudo, da internet, seu
acesso tornou-se mais fácil ainda.
É verdade que o número de
livros disponíveis nas várias bibliotecas virtuais que se
multiplicam, internet afora, ainda é relativamente pequeno (creio
que menos de 1%) em relação à quantidade de títulos lançados
anualmente pelas editoras, em todo o Planeta, orçada, de forma
bastante conservadora, em torno de 60 milhões. Ainda assim, quem ler
“apenas” essas obras, e com a devida atenção e capacidade de
apreensão, terá, certamente, cultura acima, muitíssimo acima da
média. Que mundo fascinante a informática nos descortina!
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
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