Crise seletiva
Pedro J. Bondaczuk
O presidente Fernando Henrique
Cardoso negou, em Davos, na Suíça, que a crise que abalou as
economias dos chamados "tigres asiáticos" possa ter
maiores desdobramentos no País. Afirmou e reiterou que as medidas
que deveriam ser tomadas, para impedir um ataque especulativo ao
real, o foram.
O Fundo Monetário
Internacional concordou com ele e até elogiou a presteza com que
providências preventivas foram adotadas. A concordância, contudo,
não é consensual. O governo brasileiro recebeu também muitas
críticas. Mas o presidente deu a entender que os economistas, muitos
dos quais de renome e prestígio mundiais, que fizeram previsões
sombrias sobre a economia do Brasil, estão "desinformados".
Estariam de fato?
Oxalá FHC tenha razão. Pois
as empresas de pequeno e médio portes --- empregadoras por
excelência ---, amargam os efeitos do pacote de 51 medidas, editado
em fins do ano passado, com créditos escassos e juros nas nuvens. Os
trabalhadores, igualmente, --- aqueles que tiveram a felicidade de
conservar seus empregos --- vão sentir no bolso a elevação do
imposto de renda na fonte, de 25% para 27,5%, já no próximo
hollerith. Seria perverso demais para eles que tanto sacrifício
estivesse sendo feito por nada.
A atual crise, por ser
"seletiva", é mais perversa do que as tantas enfrentadas
pelo empresariado em passado recente. As empresas de grande porte,
aquelas capitalizadas, modernas e bem administradas, pouco ou nada
estão sentindo. Muitas, até, surpreendentemente, aumentaram as suas
vendas, tradicionalmente fracas neste período do ano.
A macroeconomia, porém,
contrariando o presidente, não vai bem das pernas. A balança
comercial, por exemplo, voltou a registrar déficit considerável no
mês de janeiro, superior a US$ 700 milhões. O balanço de
pagamentos, igualmente, foi deficitário, em decorrência dos altos
juros pagos pelo governo em sua monumental dívida interna. E a taxa
de inflação beirou a 1%, muito alta neste período do real.
Enquanto isso, o Congresso,
convocado extraordinariamente (a um custo exorbitante de R$ 1 milhão
por dia), para votar as reformas --- notadamente a administrativa, no
Senado, e a previdenciária, na Câmara --- mais uma vez fica
devendo. Nessas circunstâncias, é difícil não dar razão aos
economistas que prevêem um próximo ataque especulativo à moeda
brasileira e, em contrapartida, concordar com o presidente Fernando
Henrique de que essa possibilidade deva ser descartada.
Mas já está se aproximando o
Carnaval e apenas depois dele é que o ano começa, de fato, no País.
Como se trata de um período pré-eleitoral, a expectativa é de que
ocorra uma providencial reativação econômica, posto que modesta, a
partir do segundo trimestre. É com esta esperança que as empresas
de pequeno e médio portes, atualmente em grandes dificuldades, e os
trabalhadores, em especial o grande contingente de desempregados,
contam. Isto, se FHC de fato estiver certo e o real permanecer a
salvo de investidas dos grandes especuladores mundiais. Mas a palavra
de ordem continua sendo "cautela".
(Artigo de 2 de fevereiro de
1997)
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