Quebra do pacto básico
Pedro J. Bondaczuk
A inflação de julho vai
cair, garantem os especialistas no assunto, destacando que isto já
poderia ocorrer neste mês, caso o presidente Itamar Franco, num de
seus arroubos populistas, não tivesse provocado a defasagem das
tarifas públicas, que agora têm que ser recompostas mediante
tarifaços.
Aliás, e supondo que sejam
verdadeiras as previsões, nem é correto afirmar que as taxas
inflacionárias irão baixar. Afinal, com certeza não haverá uma
desejável deflação. O que pode acontecer é o custo de vida "subir
menos", o que é muito diferente de cair.
O ministro da Fazenda,
Fernando Henrique Cardoso, até aqui vem mantendo uma postura
irrepreensível à frente dessa pasta que é fundamental num país em
crise como o nosso. Vem adotando posições realistas, não
escondendo de ninguém o óbvio, ou seja, que a situação é muito
difícil e que a sociedade terá de fazer grandes sacrifícios, caso
se pretenda, de fato, derrubar a inflação.
Tem dito e reiterado que não
haverá nenhum plano heterodoxo, nem dolarização e nem qualquer
outro truque, dos tantos usados nos últimos anos pelos pretensos
"magos" da economia.
A nota dissonante, contudo,
vem de alguns dos auxiliares de segundo escalão do ministério. No
afã de ganharem espaço, esses funcionários plantam novas sementes
de tensão na sociedade, acenando com choques e outras tolices mais,
que não contam com o mínimo respaldo de ninguém.
Tais in confidências, a
maioria fruto da imaginação delirante de burocratas que se mostram
infiéis ao governo que servem, são um campo fértil para os
boateiros de plantão, aqueles mesmos identificados pelo ex-ministro
Delfim Netto como os "caçadores", ou seja, os que levantam
alarido às quintas-feiras, tomam o dinheiro dos incautos --- que na
verdade não faltam, convenhamos --- e gastam os lucros nos finais de
semana no Guarujá.
Todavia, a despeito da postura
realista de Fernando Henrique Cardoso, alguma coisa precisa ser feita
para, na pior das hipóteses, fazer as taxas inflacionárias descerem
pelo menos para o patamar anterior, de 25%. A inflação tem um papel
altamente corruptor.
Hoje em dia, os preços são
ditados aleatoriamente, virtualmente em função da aparência do
comprador, e não mais baseados em fatores lógicos, principalmente
as planilhas de custos. Há casos, por exemplo, de vestimentas de
segunda categoria custando mais do que eletrodomésticos, como os
mais sofisticados televisores em cores.
No setor de serviços, a
confusão é total. O consumidor, que no comércio passou a ser pelo
menos um pouco respeitado, com a implantação do código que o
protege, quando precisa consertar seu carro, sua geladeira ou sua
casa, é espoliado, sem ter a quem recorrer.
Nunca é demais repetir a
advertência do economista Eduardo Gianetti da Fonseca, feita em
recente e brilhante ensaio: "O problema básico de uma inflação
alta e crônica como a brasileira --- da falta de um padrão
monetário estável para a realização de transações econômicas
--- é que ela gradativamente destrói o acordo moral básico do qual
dependem a manutenção da ordem democrática e o funcionamento
adequado do mercado. Imagine-se, por exemplo, o que aconteceria com
uma sociedade moderna e complexa na qual unidades básicas de medida
como a duração da hora, ou a extensão do metro, ou o volume do
litro estivessem sujeitas a manipulação estatal e passassem a
variar aleatoriamente de mês para mês".
(Artigo publicado na página
2, Opinião, do Correio Popular, em 12 de junho de 1993).
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
No comments:
Post a Comment