Aventureiros desfazem
superpotência
Pedro J. Bondaczuk
A União Soviética, que há
muito já deixou de ser superpotência, embora detenha um enorme
potencial bélico capaz de destruir muitos planetas do porte da
Terra, está lutando agora pela própria sobrevivência enquanto
nação. As tensões étnicas, os ódios raciais seculares e os
antagonismos regionais, represados por sete décadas, estão
aflorando irresistivelmente, ameaçando levar de roldão o
federacionismo.
O nacionalismo, verdadeiro
anacronismo nos tempos atuais, ganha corpo e cresce de maneira
impressionante, não somente nas regiões do Báltico e do Cáucaso,
mas praticamente pela totalidade dos mais de 20 milhões de
quilômetros quadrados do país com a maior extensão territorial do
mundo.
O novo tratado de união,
elaborado por Mikhail Gorbachev e sua equipe, se contém falhas, é
infinitamente mais evoluído do que o atual, que data de 1922. Ainda
assim, líderes regionais populistas, de uma miopia política
contundente, opõem-se a ele, na base do "não li e não
gostei", indiferentes se suas Repúblicas têm ou não condições
de sobreviver com dignidade enquanto Estados independentes.
A onda contra Gorbachev cresce
a cada dia que passa, colocando a sobrevivência, não apenas da
"perestroika", mas até mesmo do cargo e da permanência na
vida pública desse fascinante estadista, em absoluto risco.
O populismo tem um retrospecto
trágico no correr da história, em especial neste século, quando
foi causa de pelo menos duas guerras mundiais. Mas os soviéticos, e
em especial os russos, estão se deixando levar pelo "canto da
sereia" das propostas de Bóris Yeltsin, vagas ao extremo, que
nem mesmo ele próprio é capaz de defini com clareza quais sejam.
É evidente para qualquer
analista à distância do palco da tragédia qual é o objetivo do
presidente da Rússia: o poder pelo poder. Seus seguidores, todavia,
agindo na base do puro desespero, sequer param para fazer a mínima
análise a respeito. Embarcam nas promessas mirabolantes desse líder
que não desperta a mínima confiabilidade nos círculos ocidentais
mais sérios, que entendem a necessidade de uma União Soviética
forte e democratizada, para a manutenção do equilíbrio mundial.
O país está à beira de uma
guerra civil que parece a cada dia mais próxima e inevitável. A
população vem tomando Gorbachev, responsável pela miraculosa
abertura democrática num Estado que já foi tido como a mais rígida
e perversa ditadura que o mundo conheceu, como bode expiatório para
vícios, desmandos e erros que se acumularam por sete décadas.
É um processo de catarse
coletiva, ao mesmo tempo em que o povo concentra todas suas
esperanças em quem lhe acena com prosperidade, caída do céu, com
riqueza fácil até, o que, convenhamos, realisticamente não passa
de um perigoso e irresponsável exercício de demagogia.
(Artigo publicado na página
15, Internacional, do Correio Popular, em 12 de março de 1991).
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