Tuesday, June 27, 2017

Estamos ou não em recessão?


Pedro J. Bondaczuk



A polêmica travada entre empresários de várias categorias e autoridades ligadas ao Palácio do Planalto, sobre se o País está, ou não, em um período recessivo, é irrelevante. Equivale em discutir o sexo dos anjos. Os sinais claros, de um agudo desaquecimento econômico, estão aí, desafiando qualquer ministro a tentar desmentir as evidências.

E, o pior de tudo, o quadro que se apresenta é o da estagflação. Ou seja, estagnação econômica acompanhada de uma perversa hiperinflação, que está levando todo o mundo ao desespero, quando não às concordatas e falências.

Enquanto isso, a sociedade continua aguardando, já na metade do ano, um plano (prometido em princípios de janeiro e que até agora ainda não veio) que determine, com clareza, as regras do jogo. Espera um projeto que tenha princípio, meio e fim e que seja posto, incontinenti, em prática.

Isto, aliás, não é reclamado somente pelas empresas e pelo público em geral, mas também pelo Fundo Monetário Internacional, que embora não seja mais avalista do Brasil, precisa dar o sinal verde para que o País possa renegociar os débitos que estão vencendo com o chamado Clube de Paris.

O ministro da Fazenda, Bresser Pereira, promete, até meados de junho, ou princípio de julho, esse tão aguardado programa que, ao que se comenta, não terá nada de dramático. E é até bom que não tenha mesmo, pois de dramas, já bastam os nossos, do cotidiano, às voltas com uma inflação que promete, segundo sinalização do próprio Banco Central através das taxas do overnight, emplacar 23,6%, ou te mais, e juros inéditos e totalmente irreais, que ameaçam deflagrar uma quebradeira em cadeia, agravando, em muito, as nossas atuais aflições.

Mas é necessário que o diagnóstico dos nossos males econômicos seja correto. É indispensável que não se façam mais experiências, às custas do nosso sofrido (e furado) bolso, que já não está mais suportando os empirismos dos tecnocratas.

Nesse período todo, três planos já foram anunciados, com grande estardalhaço, e nenhum deles foi aplicado. Por isso, estamos chegando à situação absurda do nosso ano fiscal, na prática, iniciar-se em julho, por absoluta falta de uma diretriz.

Como fazer investimentos numa hora dessas, de tamanha indefinição, e, principalmente, diante das dificuldades de saldar seus compromissos, daqueles milhares de brasileiros que, confiando no sucesso do Cruzado, resolveram apostar no crescimento?

Que há recessão (pelo menos um enérgico início dela) é evidente. Com isso, as dispensas de pessoal já começaram a ser ensaiadas, aqui e ali, que redundam no agravamento do quadro social, que já não é dos melhores.

No entender do crítico, e de muita gente experiente neste País, uma das causas básicas do atual desequilíbrio econômico, com o conseqüente surto hiperinflacionário que se verifica, são os gastos excessivos do Poder Público, que anuncia, como solução, uma tributação ainda maior, penalizando mais e mais a sociedade, que já vive uma intolerável situação de sufoco.

Fontes de Brasília disseram, recentemente, que a missão do FMI que esteve em nosso país dia desses (todos pensavam que esse monitoramento já havia acabado) ficou abismada com o rombo de caixa do governo. O déficit público, de acordo com esse informante, estaria girando em torno de 7% do Produto Interno Bruto (o oitavo do mundo), quando a promessa era de zerar essa dívida. Ou, na pior das hipóteses, reduzir dos 5% do início do ano para a metade, ou seja, para 2,5%. Ao invés disso, acabou aumentando praticamente nesse mesmo montante.

Para que o leitor tenha uma idéia do que isso significa, basta dizer que esse dinheiro que o Planalto gastou a mais do que arrecadou, daria para construir uma outra hidrelétrica de Itaipu, que é a maior do mundo no seu gênero. Que economia resiste a tamanho desregramento? Onde esses recursos foram aplicados, se não vemos novos investimentos e se é exatamente pela ausência deles que a recessão – que as autoridades tanto procuram negar – se instala perversamente no País?

A questão que deve ser colocada, portanto, não é se temos ou não temos à nossa frente um quadro recessivo, mas como acabar com ele, se já estiver instalado. Ou, se todo o mundo estiver enganado, entregue a um estéril pessimismo, o que se questiona é como evitar que a recessão se instale.

Não cabe aqui, sequer, uma discussão sobre se a polêmica Ferrovia Norte-Sul deve, ou não, ser construída neste momento. Ora, se o governo, sem a obra, já está gastando essa enormidade a mais do que arrecada, onde está a fonte de financiamento desse empreendimento?

Nunca nos opusemos ao transporte ferroviário. Pelo contrário, sempre afirmamos que, no início da acelerada industrialização brasileira, na metade da década de 50, o País cometeu lamentável equívoco ao optar pelas rodovias, quando sabidamente o Brasil não é autossuficiente na produção de petróleo.

As estradas-de-ferro são necessárias e indispensáveis, mas não agora, que a casa está tão desarrumada. Tomara, no entanto, que essa obra faraônica consiga pelo menos reativar os investimentos públicos e privados e assim nos livrar da temível recessão. Quem sabe? Afinal, somos o país dos milagres!

(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 7 de junho de 1987).



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