Saturday, April 08, 2017

Sucessão soviética


Pedro J. Bondaczuk


O homem apontado como o principal responsável pela valorização dos militares na URSS, marechal Dmitri Ustinov,  que morreu anteontem em Moscou, em conseqüência de seqüelas de uma pneumonia mal curada, deixou consolidada a sua doutrina. Ele sempre defendeu a tese de que seu país seria apenas respeitado (e temido) se fosse bem armado. Aliás, neste aspecto, Ustinov chegou a operar autênticos "milagres" durante a invasão nazista à União Soviética, na Segunda Guerra Mundial, tirando da "cartola" os aviões, tanques e canhões que Stalin exigia e que a então destroçada indústria russa não tinha condições de fabricar. Mas fabricou, não se sabe até hoje como, sob a batuta desse exímio administrador.

A morte de Ustinov, por outro lado, deverá influir na sucessão no Cremlin. Não é novidade para ninguém, embora as autoridades russas busquem mostrar imagens de um Cherneko vendendo vitalidade, que o atual líder soviético é um homem bastante doente. O falecido marechal, que inclusive não era sequer militar (mas ostentava esse título honorífico), foi o responsável direto pela escolha dos dois presidentes da era pós-Brezhnev. Em outras palavras, no caso da escolha de Chernenko, sabiamente adiou por algum tempo o duelo de bastidores entre os principais aspirantes ao comando do Partido Comunista e conseqüentemente do país: Grigori Romanov e Mikhail Gorbachev.

A impressão que se tem à distância é que o caminho do primeiro fica um pouco mais difícil, se bem que em termos de sucessão, na União Soviética, nunca é recomendável se dar palpites, pois o processo tem se caracterizado por surpresas. Geralmente, os preferidos acabam ficando para trás. Foi o caso de Mikhail Suslov, quando da substituição de Nikita Kruschev; de Chernenko, em relação a Andropov e do próprio Gorbachev, que acabaria perdendo a indicação para o atual presidente e secretário-geral do PC soviético.

Para aqueles que acham que com o desaparecimento de Ustinov, a doutrina armamentista de Moscou vai ser suavizada, pode estar reservada uma desagradável surpresa. Na lista dos sucessores do ministro falecido só aparecem nomes afinados com as idéias dele. Todos foram seus estreitos colaboradores, que cresceram na hierarquia do partido por influência direta do líder morto. Aliás, alguns, como Ogarkov, são até mesmo mais agressivos do que Ustinov. É o caso, por exemplo, de Kulikov, que tem a seu favor uma eficiente atuação à frente das forças do Pacto de Varsóvia, sabidamente as mais aptas e treinadas da atualidade em guerra convencional.

Se tivéssemos que arriscar algum palpite sobre quem será o novo ministro de Defesa soviético, apostaríamos neste último. Mas em se tratando desse país, onde tudo é feito sob uma cortina de mistério e de intrigas de bastidores, seria demasiadamente arriscado, senão ingênuo, apontar algum nome. Principalmente em se tratando de um cargo com tamanha carga de responsabilidade e poder.

(Artigo publicado na página 10, Internacional, do Correio Popular, em 22 de dezembro de 1984)


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