Monday, April 24, 2017

Oposição sistemática


Pedro J. Bondaczuk


O plano de ação do governo, anunciado com pompa e circunstância em 24 de abril passado, pelo presidente Itamar Franco, embora ainda não passe de mera carta de intenções, já que depende das aprovação do Congresso para os vários projetos de lei e medidas provisórias que o concretizem, à primeira vista parece lógico, consistente e viável.

Esbarra, todavia, num obstáculo enorme: a credibilidade. Há setores que – ou não confiam, de fato, ou usam a pretensa desconfiança sobre uma possibilidade futura de novos choques, congelamentos e confiscos como meros pretextos – continuam remarcando, preventivamente, seus preços. Por conseqüência, a inflação está em plena espiral ascendente e pode comprometer todo o projeto de retomada do crescimento. E o início da solução da crise voltará à estaca zero.

Aliás, este problema, o da falta de confiança, não é somente de Itamar. Praticamente todos os presidentes brasileiros, por este ou aquele motivo, em maior ou menor grau, enfrentaram resistências semelhantes aos seus programas e atos.

Getúlio Vargas enfrentou, no seu primeiro governo, férrea oposição, por ser ditador. No outro mandato, o conquistado nas urnas, foi acusado de corrupção, que seria de tal sorte, a ponto do Palácio do Catete (a sede governamental de então, no Rio de Janeiro) estar assentado sobre “um mar de lama”. De Juscelino, foi dito que auferia lucros pessoais fantásticos com a construção de Brasília.

Jânio Quadros, eleito por consagradora maioria, como a grande esperança de moralização do País, enfrentou, logo no início do mandato, tenaz oposição, por seu pretenso “autoritarismo”. Seu temperamento levou-o à renúncia, que não é tão inexplicável quanto sempre se procurou dar a entender.

João Goulart pagou pelo populismo, principalmente quando se propôs a empreender reformas que há muito se faziam necessárias e que acabaram por se transformar na pedra que o fez tropeçar e ser deposto.

Dos vários governos militares, é escusado relatar as razões da oposição que sofreram de parcelas significativas da população. José Sarney perdeu a credibilidade quando passou a barganhar o quinto ano de mandato, com a política do “é dando que se recebe”.

De Fernando Collor nem é bom falar sobre o que o levou a cair no descrédito. Sua gestão foi tão desastrosa, que foi como se o País houvesse sido atingido por algum cataclismo catastrófico, algum terremoto devastador, no máximo grau da Escala Richter.

O governo Itamar Franco assumiu em circunstâncias especialíssimas, sob promessas de cooperação por parte da classe política e dos setores mais representativos da sociedade. Enfrentou dificuldades terríveis para a composição do ministério, uma costura complicada de retalhos de peças as mais heterogêneas da esquerda à direita.

Nem bem chegou a tomar ciência sobre a quantas andavam as contas públicas, trocou o ministro da Fazenda, Gustavo Krause. Meses depois, o substituto deste, Paulo Haddad, também caiu em desgraça. O Orçamento da União, que deveria estar em vigor em 1º de janeiro, só foi sancionado na semana passada.

Apesar de tudo isso, Itamar cumpriu as promessas que fez de não recorrer a choques ou congelamentos. Não confiscou poupança de ninguém. Mesmo assim, não dispõe de nenhuma credibilidade. De duas, uma: ou não sabemos e nunca soubemos escolher presidentes, ou agimos como aquele nihilista espanhol da anedota, que perguntava: “Hay gobierno?”. E arrematava, a seguir: “Entonces, yo soy contra!”.

(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 7 de maio de 1993).



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