Tuesday, April 18, 2017

Muita conversa, pouco conteúdo


Pedro J. Bondaczuk


O plano de estabilização econômica do presidente Fernando Collor de Mello, cujo objetivo declarado é derrotar a inflação por "nocaute", logo no primeiro assalto, deixou confusos e estarrecidos muitos dos brasileiros, principalmente os que se sentiram atingidos pelas medidas. Falar a seu respeito agora, quando há muito emocionalismo em torno da questão, não é uma tarefa das mais fáceis. Até porque, poucas pessoas estão absolutamente seguras quanto ao seu conteúdo --- se é que há alguém que o tenha entendido por completo. O que o crítico estranha, porém, embora reconheça a necessidade de uma providência dura e ampla para conter o perverso processo hiperinflacionário, é que o projeto contrarie muitas das pregações de campanha do novo presidente.

Por exemplo, o compromisso que ele assumiu de não mexer na poupança, embora até se entenda a razão estratégica que o levou a restringir os saques nas contas superiores a Cr$ 30 mil. O que se pretendeu, certamente, foi evitar uma explosão de consumo, por conta da retirada dos depósitos, como se verificou durante o Plano Cruzado, que conduziu o País ao desabastecimento e conseqüentemente ajudou a bombardear aquela tentativa de se fazer do Brasil uma sociedade nacional "com o crescimento do Japão e a inflação da Suíça", conforme se apregoou na oportunidade. As medidas, conforme muitos assinalaram, podem ser até corretas, do ponto de vista econômico, mas talvez sejam, no mínimo, inoportunas, politicamente. Todavia, manda a prudência, deve-se dar um crédito de confiança ao novo presidente e à sua equipe.

Nas últimas horas, a população foi, virtualmente, "bombardeada" por uma série de declarações conflitantes de economistas de diversas tendências. Uns, previram que as providências adotadas, embora duras, serão eficazes. Disseram que embora venham de fato a nocautear a inflação, deverão, fatalmente, gerar uma certa recessão, com um conseqüente custo social, representado por um porcentual ainda não estimado de desemprego. Outros, abominaram o plano por completo. Classificaram-no como o maior ato de intervencionismo do Estado na economia, contrariando totalmente aquilo que Collor havia prometido. Uma terceira corrente, aquela que entende que prudência e caldo de galinha não fazem mal a ninguém, preferiu ficar "em cima do muro".

Como neste País, tudo mundo é técnico de futebol e economista... O melhor que se faz, diante do fato consumado, é não somente confiar nas medidas e torcer pelo seu sucesso, mas principalmente colaborar para o seu êxito. Até porque, a opção que nos resta é das mais sombrias. Quem conhece o que de fato é uma hiperinflação, aceita não somente o sacrifício que o novo governo está dividindo entre a parcela mais aquinhoada da sociedade brasileira, mas está disposto a sacrificar, até mesmo, um pouco mais. O Brasil tem diante de si uma oportunidade histórica, talvez única, de modificar seu rumo. De alterar a atual trajetória, que se encaminhava rumo ao abismo do caos social, para perseguir uma outra, que conduza a um objetivo maior. À meta apregoada por Collor de ser, não mais um líder do Terceiro Mundo, mas entrar no seletíssimo "clube" dos primeiromundistas.

O ideal seria que os que nada fizeram para impedir que o País chegasse à situação de agora, com uma intolerável taxa inflacionária beirando o patamar dos 80% mensais, ficassem calados. Não tumultuassem nem a cabeça dos cidadãos e nem a ação dos que tentam fazer alguma coisa que nos retire do "fundo do poço". Nos próximos dias, as coisas certamente ficarão mais claras para todos.; Só então se poderá dizer se o plano da professora Zélia é mais um dos pacotes pirotécnicos com os quais tivemos que conviver nos últimos tempos, ou a chave do Brasil novo, que Collor prometeu.


(Artigo publicado na página 2, Opinião, do

Correio Popular, em 18 de março de 1990)


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