Sunday, April 16, 2017

Curto-circuito do Estado



Pedro J. Bondaczuk


O Estado brasileiro, não é de agora, está em curto-circuito, agravado pela ausência de providências competentes e racionais que o tirem da falência. Está à beira do colapso absoluto. E não se trata, especificamente, do governo do presidente Itamar Franco, que apesar de alguns deslizes, dado o seu estilo pessoal muitas vezes criticável, vem fazendo aquilo que pode.

Não é uma questão de nomes, de partidos, de grupos, mas de acúmulo de problemas urgentíssimos, cuja solução foi protelada no passado e que agora não pode mais esperar. O País está, em termos administrativos, desorganizado e a análise das carências de cada um dos setores básicos, de responsabilidade estatal, daria, por si só, um tratado. Mas onde estão as soluções?

Este é um desafio que cabe a cada cidadão, a todo brasileiro que se recusa a dar a batalha por perdida e acredita na possibilidade de mudar o País para melhor, enfrentar. Que a situação é trágica, todos estão cansados de saber.

Não fossem as reportagens dos meios de comunicação, os editoriais e a enxurrada de artigos para lembrar à população sobre a dura realidade, todos sentem na própria carne os efeitos desse estado de terra arrasada que o Brasil atravessa.

Só para lembrar alguns pontos, citaríamos que a rede pública de saúde acaba de se esfacelar, o sistema educacional regride a olhos vistos em todos os sentidos, a insegurança campeia ameaçando nossos lares, nosso patrimônio e, principalmente, nossa vida e a de nossos filhos.

Mas as coisas ruins não param por aí. O Judiciário está abarrotado de processos, por não haver sido modernizado ao longo do tempo. Recente reportagem no “Fantástico” mostrou, numa das varas da Capital, o imenso acúmulo de trabalho dos juízes, fazendo com que questões relativamente simples se arrastem por cinco, dez, quinze ou mais anos.

O sistema carcerário, por sua vez, vive outra situação absurda. Os presídios estão para lá de superlotados, transformados que foram em meros depósitos de gente, muito longe do seu papel doutrinário de casas de recuperação do cidadão que delinqüe.

Dezenas de milhares de mandados de prisão deixam de ser cumpridos por absoluta ausência de vagas, multiplicando a insegurança da sociedade. E o que dizer da assistência social? O que falar da multiplicação das hordas de famintos (que hoje já passam dos 30 milhões)? E do déficit habitacional? E dos milhares e milhares de pessoas sem-teto, conhecidas, hoje, pela expressão inglesa “homeless”, numa sofisticação da miséria?

Da inflação e da corrosão do poder de compra dos salários é escusado falar. Como se vê, o Estado está longe, muito distante, de cumprir sequer suas atribuições básicas, aquelas que são a única justificativa da sua existência. E o que fazem os políticos diante de tudo isso? Mobilizam-se em busca de soluções emergenciais para salvar o País? Afinal, são pagos – e regiamente – exclusivamente para isso. Pelo contrário!

Sabotam, sempre que podem, os governos, de ideologias diferentes das suas, como se tudo não passasse de mero jogo, do eu contra você, do simples desfile de ambições pessoais onde exibem suas vaidades.

A crise brasileira, isto já foi dito inúmeras vezes, não é tanto de caráter econômico quanto se pensa. Vai além da existência ou não de recursos para a saúde, a educação, a segurança pública e a assistência social. Resvala para a inconsciência, a incompetência, a irresponsabilidade, a injustiça e o impatriotismo. Ou seja, trata-se, basicamente, de uma questão de mentalidade dos nossos homens públicos.



(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 16 de julho de 1993)


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