Brisa de mudança no Cremlin
Pedro J. Bondaczuk
Os observadores
internacionais estão todos de acordo de que a subida de Mikhail Gorbachev à
liderança máxima na União Soviética irá trazer mudanças profundas, nos âmbitos
interno e externo, naquele país. Mas a unanimidade das opiniões estende-se
também ao prazo que essas alterações tem para começarem a acontecer, que não
deverá ser tão curto quanto se espera ou se necessita.
O
novo secretário-geral do PC da URSS terá, primeiro, que colocar gente sua em
postos estratégicos, o que demanda muito tempo, principalmente num país como a
União Soviética, viciado por décadas de imobilismo político e até de uma
relativa preguiça de buscar inovações.
Um
dos pontos em que ficou claro que haverá alterações, em relação à estratégia de
Brezhnev e de seu fiel seguidor, o recém falecido Chernenko, é quanto ao
relacionamento com a China. Não é sem razão que ultimamente o Cremlin (já há
meses virtualmente comandado por Gorbachev), vem buscando uma reaproximação com
Pequim.
Desde
o primeiro afastamento do presidente russo, por motivo de doença, as críticas
aos atuais dirigentes chineses foram minguando na imprensa soviética. Até se
transformarem, nos últimos dias, em cautelosos elogios. Isso vem se verificando
desde as vésperas da recente visita do vice-primeiro-ministro russo Arkipov à
China, em fins do ano passado.
O
rompimento com Pequim, aliás, foi um dos tantos desastres da política de força
de Brezhnev, que tinha uma visão muito estreita da importância dos chineses
como aliados da União Soviética. Como fruto da era Stalin (de triste lembrança
para o sofrido povo russo), ele era avesso a qualquer idéia nova que pudesse
surgir na órbita marxista, guiando os seus passos apenas, e tão somente, pela
“cartilha” do velho ditador, responsável por tantas mortes e prisões na década
de 1930 dos que não concordavam com seus métodos brutais e personalistas de
dirigir o país.
Foi
Leonid Brezhnev que pôs fim ao sonho liberalizante dos checos., em 1968, num
movimento que ficou conhecido como a “Primavera de Praga”. Foi ele que se
indispôs contra todos os Partidos Comunistas da Europa Ocidental, que queriam
seguir caminhos próprios, compatíveis com as realidades de cada um de seus
países, ensejando, assim, o “cisma” no “mundo vermelho” e propiciando o
surgimento do eurocomunismo.
Foi,
ainda, esse líder, duro e de pouco diálogo, que ordenou a desastrosa invasão do
Afeganistão, colocando a União Soviética num atoleiro idêntico (ou até mesmo
pior) do que aquele de onde os norte-americanos haviam há pouco saído, após a
retirada das suas tropas do Vietnã.
Segundo
os políticos ocidentais que tiveram a oportunidade de privar da presença de
Gorbachev, este homem é muito diferente de Brezhnev e de Chernenko, de mente
aberta, permeável às novas idéias e concepções. Nota-se que, desde a era de
Lenin, o novo secretário-geral do PC da URSS é o único líder soviético com
formação universitária.
Dessa
forma, os russos não precisarão mais recalcar um complexo indisfarçável de
inferioridade quando seu dirigente máximo, daqui por diante, tiver que se
reunir com políticos do Ocidente, como faziam até aqui. Talvez isso explique,
em parte, a relativamente pequena quantidade de encontros que os homens fortes
do Cremlin mantiveram, desde o final da Segunda Guerra Mundial, com lideranças
ocidentais. E justifique a parada no tempo dessa superpotência, em termos
administrativos, perdendo terreno em tudo o que não signifique a indústria de
armamentos para os países do Ocidente.
(Artigo
publicado na página 15, Internacional, do Correio Popular, em 13 de março de
1985).
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