Wednesday, April 19, 2017

Crise anunciada



Pedro J. Bondaczuk


"O Estado ou é racional ou não é verdadeiro Estado, mas um aglomerado social, onde o contraste das forças o torna ineficaz, viola a liberdade, perturba a ordem, corrompe a Justiça e a administração. Para ser racional, urge que o Estado se estribe na lei; que a lei seja igual para todos; que a autoridade se submeta à lei, e assim cada ordem cívica e cada organismo administrativo".

Essas palavras, contidas num artigo publicado há 33 anos no jornal "A Gazeta", de São Paulo, de autoria de Dom Luigi Sturzo, ilustra bem a presente crise institucional que o País atravessa, envolvendo os três poderes da República.

A controvérsia, infelizmente, não tem por motivo alguma eventual divergência entre Legislativo, Executivo e Judiciário quanto a métodos de melhor prestar serviços à sociedade. Não se prende a relevantes problemas nacionais, como o combate à fome, a geração de empregos ou melhoria da qualidade da educação. Nem se refere à busca de soluções para a violência, a falta de moradia ou à falência do sistema de saúde.

Nada disso parece relevante na presente crise e nem serviu como seu estopim. Os que os representantes dos três poderes discutem é a legalidade ou não de benefícios a seus integrantes. E isso é o que é preocupante. É um exemplo de Estado tornado irracional, que perdeu sua característica ideal e se transformou em mero "aglomerado social". Perdeu a noção da realidade.

Os sintomas de irracionalidade não são apenas esses. São inúmeros e vêm de muito longe. O cientista político Jorge Zaverucha, no artigo "Risco de Golpe", publicado no jornal "O Globo", observou: "Num país onde: inexiste moeda; o orçamento da União é uma ficção; há incapacidade de recolhimento de impostos; os órgãos de segurança estão em crise; grupos políticos subvertem uns aos outros por falta de confiança e, conseqüentemente, compromissos não são respeitados, e, ainda por cima, o presidente se encarrega de demonstrar sua preferência por militares para sanear situações de crise, temos todos os ingredientes para um curto-circuito político a qualquer instante".

Hoje ele já nem é mais iminente. É concreto. Como se observa, o Estado brasileiro é absolutamente irracional neste momento, a requerer profunda restruturação. É necessária uma mudança de comportamento. É indispensável uma postura diferente da assumida hoje. É urgente o renascimento do sentido do serviço público.

O País precisa ser desintoxicado das crises, nas quais está viciado. A propósito, o artigo acima data de 20 de julho do ano passado, o que comprova que o alarme vem soando há tempos, sem que ninguém lhe dê ouvidos. E os eventuais bombeiros tentam apagar o incêndio lançando mais combustível sobre as chamas.

(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 23 de março de 1994).



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