Salto de qualidade
Pedro
J. Bondaczuk
O advento da era da
comunicação em massa trouxe um incremento na qualidade de vida das
pessoas que a maioria sequer atina. A atual geração, destas
primeiras duas décadas do novo milênio, já nasceu com esse
fantástico aparato comunicativo consolidado, funcionando e em franca
evolução. Desconhece, portanto, o que é ficar sem eletricidade,
sem telefone, sem rádio, sem televisão, sem jornais, sem cinema,
sem veículos automotores, sem aviões etc. E tudo isso existe há
pouco mais de um século.
Alguns desses aparatos são
ainda mais recentes, como é o caso da TV, cujo primeiro canal
efetivo passou a operar apenas em 1937, na Grã-Bretanha. E sequer
menciono os computadores, que se tornaram em equipamento
imprescindível para qualquer pessoa
Esta facilidade de se
comunicar influenciou diretamente o comportamento das comunidades,
dos países, das cidades, das pessoas. Até meados do século
retrasado, por exemplo, não existia a indústria fonográfica, pois
nem mesmo o fonógrafo havia sido inventado. O mesmo acontecia em
relação ao telefone. O rádio não passava de uma idéia na cabeça
do seu inventor. As cidades eram iluminadas por lampiões a gás,
pois não havia eletricidade.
O transporte urbano era feito
por veículos a tração animal, como os tilburis e carruagens, além
de charretes e carroças e, nas grandes cidades, os bondes puxados
por burros. Para ir de São Paulo a Recife, por exemplo, quem se
dispusesse a essa temeridade teria que se utilizar de navios ou
enfrentar semanas, senão meses, por estradas de terra, que sequer
mereciam esse nome, por serem autênticas picadas, meras trilhas,
inseguras e instáveis, no lombo de cavalos. O avião ainda não
havia sido inventado, já que data de 1906.
O lazer oferecia pouquíssimas
opções. Não havia cinema, televisão, futebol etc. Nos finais de
semana e feriados inexistia a possibilidade de deslocamento de
multidões rumo ao litoral, como ocorre agora. Uma viagem de Campinas
para Santos, que hoje leva por volta de duas horas (quando não há
congestionamentos, claro), só podia ser feita em lombo de animais,
através de perigosíssimas trilhas na Serra do Mar. Durava, no
mínimo, um exaustivo dia inteiro ou bem mais. Era uma aventura que
poucos se arriscavam a empreender. E jamais a título de lazer.
Notícias só poderiam ser
conhecidas através de jornais e revistas e chegavam com atraso de
meses. Não havia, obviamente, a instantaneidade de hoje. Os
repórteres, mesmo os urbanos, não dispunham sequer da facilidade do
telefone. Precisavam contar com fartas e variadas fontes que lhes
notificassem os acontecimentos e que mesmo assim eram informados aos
leitores semanas depois da ocorrência. Hoje, este aparato
comunicativo é encarado como uma coisa tão normal que não se atina
sobre a sua inexistência.
O advento dos meios de
comunicação inaugurou a era das celebridades, como destaquei
inúmeras vezes. Cantores, jogadores de futebol, atletas de quaisquer
modalidades esportivas, artistas plásticos, escritores, atores,
políticos etc., dependem visceralmente dos jornais e emissoras de
rádio e televisão. Tais facilidades, no entanto, paradoxalmente,
distanciaram as pessoas.
Antes da existência desses
meios comunicativos, se alguém quisesse ouvir música, teria que ir
a algum teatro onde estivesse sendo apresentada alguma ópera, ou a
algum café, que dispusesse de cantores contratados, ou participar de
saraus em casa de amigos, para o que precisava ser convidado. As
relações eram exclusivamente interpessoais.
Hoje, posso ser um sujeito
fechado, não me relacionar com quase ninguém, e ainda assim ter
acesso a esse prazer. Basta ligar um rádio, que se tornou objeto
trivial e barato, para ouvir meus cantores favoritos em qualquer hora
ou lugar. Ou adquirir um CD, um "disk-laser" ou uma fita
cassete (coisas, aliás, ultrapassadas) em uma das tantas lojas do
gênero espalhadas por aí para ter em casa, o tempo todo, os
artistas da minha preferência. A maioria, porém, recorre a sites
especializados e baixa em segundos a música de sua preferência, ou
ouve, quando quiser, no Youtube. Se desejar ter acesso a histórias,
sejam românticas, de aventuras, de mistério, policiais ou até
mesmo pornográficas, não preciso sequer ler nenhum livro. É só
alugar uma fita de vídeo, em alguma operadora de TV a cabo e na sala
da minha casa, com todo o conforto e intimidade, usufruir dessa
vantagem. Ou assisti-la em seu computador, através de serviços como
o Netflix.
Se for assinante de um serviço
de TV fechada, basta sintonizar o canal adequado, especializado na
área da minha preferência. Se quiser conversar com alguém, esteja
onde estiver, não preciso sair procurando um telefone e torcer para
que esse indivíduo esteja também próximo de um aparelho. Basta
acionar meu celular, que hoje é um equipamento multimídia, ligar
para o número dessa pessoa e pronto. E mesmo assim, há quem diga
que a vida, hoje, se tornou mais difícil! Imaginem se este crítico
da atual e avançada tecnologia vivesse, digamos, em 1807! E nem
precisa tanto. Que estivesse, agora, em 1917...
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