Competência não é questão de sexo
Pedro J. Bondaczuk
A mulher, a despeito dos seus
avanços em praticamente todos os campos de atividade, ainda continua
sendo discriminada, sutil ou ostensivamente, dependendo da
circunstância ou de lugar principalmente no campo político. Este é
o caso, por exemplo, da União Soviética.
O regime marxista, que procura
glorificar os feitos da operária local, na construção do
socialismo, sempre destinou às pessoas do sexo feminino papéis
meramente secundários. Elas não ascendem ao Politburo, não ocupam
ministérios importantes e nem postos de projeção.
Se tudo se limitasse apenas a
isso, até que não seria tão ruim. Mas o preconceito sobre a sua
capacidade intelectual e administrativa é tão grande, a ponto das
esposas dos grandes líderes locais permanecerem totalmente
ofuscadas.
Até nisso, no entanto, o
atual dirigente soviético, Mikhail Gorbachev, difere de seus
antecessores. Neste aspecto, a rigor, aproxima-se bastante do seu
colega norte-americano, Ronald Reagan. Tanto um como o outro são
acusados, em seus respectivos países, de dividirem o poder com suas
esposas.
O mandatário do Cremlin, na
inusitada entrevista que deu para a televisão norte-americana, não
escondeu isso. Confessou, abertamente, que conversa sobre todos os
assuntos com Raisa. Até aqueles considerados altos segredos de
Estado. E por que não? Afinal, se ele divide com ela uma parcela de
sua vida, qual a razão de não dividir a totalidade?
Quanto a Reagan, há quem
diga, nos Estados Unidos, que o seu novo estilo diplomático, de
diálogo e não mais de confronto com Moscou, seria inspiração de
Nancy, que desejaria fazer com que o marido entrasse para a história
como pacificador. Qual o mal disto, se a afirmação for verdadeira?
Há, no entanto, quem veja
perigo no mais íntimo relacionamento que dois seres humanos podem
manter como é o de um casal bem ajustado. Na União Soviética, por
exemplo, a TV local não reproduziu a parte da entrevista de
Gorbachev em que este admitiu discutir todas as questões políticas
com a esposa.
A imprensa russa tem ido mais
longe em seu preconceito. Ninguém sabe quantos anos Raisa tem e nem
possui qualquer dado a seu respeito, a não ser que ela é casada com
o mentor da Perestroika. Ninguém sabia que Andropov tinha mulher até
ela aparecer em seu enterro.
Essas pessoas devem ter um
relacionamento conjugal caricato. Além de fanáticas, são, na
verdade, infelizes, por padecerem de estreiteza de espírito.
Competência nunca foi, não é e jamais será questão de sexo.
Tanto há homens, quanto há mulheres brilhantes. O mesmo vale para a
obtusidade.
Pelo que se depreende,
portanto, boa parte desta desejável distensão entre as
superpotências, que pode trazer benefícios inimagináveis para a
humanidade, deve ser creditada a duas pessoas do sexo feminino: Nancy
Reagan e Raisa Gorbachev, que vão também manter a sua reunião de
cúpula, na próxima semana, certamente muito mais amena e humana do
que a fria e protocar conversação de seus maridos. Afinal, todo
grande homem tem por trás de si uma grande mulher. Alguém ainda
duvida disso?
(Artigo publicado na página
11, Internacional,
do Correio Popular, em 3 de dezembro de 1987).
do Correio Popular, em 3 de dezembro de 1987).
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
No comments:
Post a Comment