Thursday, March 13, 2014

Terceiro colocado poder ser o presidente


Pedro J. Bondaczuk


A proclamação de vitória, feita, desde a segunda-feira, pelo candidato direitista boliviano, Hugo Banzer Suarez, é prematura e pode tumultuar um pouco mais um processo eleitoral todo ele marcado por irregularidades. A primeira delas foi a exclusão de uma terça parte do eleitorado (os camponeses), que não conseguiram registro para votar, por falta de material de inscrição.

As outras ações irregulares envolvem mazelas muito mais conhecidas em eleições na América Latina, como urnas lacradas já contendo dezenas de votos para determinado candidato, antes do início da votação (quando deveriam estar vazias); pessoas que sequer estavam vivas no dia de votar, “votando” e sufrágios de menores de idade, impedidos, legalmente, desse exercício democrático.

Por mais certeza de vitória que um candidato à presidência possa ter, com apenas alguns poucos resultados das apurações divulgados não pode afirmar, com relativa certeza, que suas previsões vão ser confirmadas. Ou que as pesquisas de opinião vão se mostrar incorretas.

Mesmo em eleições visivelmente fraudadas, ninguém pode se sentir garantido, na condição de vencedor, antes que pelo menos a metade dos votos seja apurada. E não é este o caso da Bolívia. Muito pelo contrário!

Com apenas 12 mil votos contados, num eleitorado de cerca de 2,5 milhões de pessoas, nem Hugo Banzer pode comemorar a vitória – que, se acontecer, tudo indica que será apenas parcial, com a decisão final ficando nas mãos do Congresso – e nem os partidários do ex-presidente Victor Paz Estenssoro devem considerar que tudo está perdido. Afinas, as urnas já computadas, são dos redutos do candidato da direita: La Paz e as cidades de Cochabamba e Santa Cruz de la Sierra.

À medida em que vão surgindo os resultados dos departamentos mais longínquos do país, a diferença vai se estreitando. E é mister que se lembre que, em 1979, o atual presidente, Hernán Siles Zuazo, mesmo tendo disparado na frente, acabou vencendo as eleições por uma diferença de apenas dois mil votos em relação ao segundo colocado.

Quanto ao aspecto fraudes, estou com o presidente do Tribunal Eleitoral da Bolívia que, ainda no domingo, advertiu à população e afirmou que é “muito melhor uma votação irregular, cheia de imperfeições, do que um golpe de Estado perfeito”. E esse alerta é mais do que oportuno, principalmente quando se sabe da longa tradição golpista dos militares bolivianos.

Os mais recentes resultados eleitorais mostram substancial recuperação do candidato Victor Paz Estenssoro. Contudo, mesmo que ele surpreenda os observadores e venha a ganhar dianteira nas apurações, uma coisa já é certa: ele não vai conseguir o percentual de votos exigido pela Constituição para ser declarado eleito. E nem Hugo Banzer tem essa possibilidade.

Como aconteceu em 1979, a decisão, mais uma vez, vai caber ao Congresso, que também foi escolhido neste domingo. E no âmbito do Legislativo, vai levar vantagem quem tiver mais “punch”, maior capacidade de negociação, mais jogo de cintura político.

Nesse aspecto, a meu ver, a vantagem não está nem com o candidato da direita e muito menos com o de centro. O esquerdista, e ex-vice-presidente, Jaime Paz Zamora, conta com mais cacife, principalmente entre os parlamentares dos pequenos partidos, que vão ser, sem dúvida, os fiéis da balança do processo eleitoral.

Resta, apenas, saber qual será a reação dos dois favoritos caso no final das contas dê essa zebra no turno indireto, congressual, das eleições bolivianas. Recorde-se que a crise institucional de 1979 começou dessa forma. E, infelizmente, na América Latina, a história costuma sempre se repetir...monotonamente...

(Artigo publicado na página 11, Internacional, do Correio Popular, em 18 de julho de 1985).


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