“Nos
Bálcãs, tudo se resolve à bala”
Pedro J. Bondaczuk
A forte oposição do representante da Sérvia, na
presidência colegiada, à eleição do croata Stipe Mesic para ser o presidente da
Iugoslávia nos próximos 365 dias, de acordo com o sistema criado pelo marechal
Jozip Broz Tito em 1980, pode ser a gota que faltava para causar a irreversível
separação dessa federação européia.
Em 12 de junho próximo haverá um plebiscito
nacional, a exemplo do realizado em 17 de março passado na União Soviética,
para decidir o futuro desse Estado artificial, criado em 1918. E as previsões
não são nada otimistas.
A Eslovênia, que realizou uma votação desse tipo em
dezembro de 1990, está batendo pé firme na decisão de, qualquer que venha a ser
o resultado das urnas, proclamar sua independência no final do mês que vem.
Caso cumpra o prometido, será, fatalmente, a guerra civil. O Exército promete
impedir a secessão.
Os sérvios constituem-se na porção majoritária da
população iugoslava, com 9,8 milhões de habitantes do país. São, portanto, de
longe, a etnia mais numerosa da Iugoslávia e sua capital, Belgrado, é, também,
a sede do poder federal.
Trata-se de um Estado que já existia como nação
independente quatro anos antes da federação ser criada. Surgiu em conseqüência
da divisão do Império Turco-Otomano, ao fim da guerra dos Bálcãs, de 1912. A
maioria de sua população é de religião ortodoxa, mas a República conta com
muitos fiéis muçulmanos.
Embora o idioma oficial iugoslavo seja o
servo-croata, para escrever, isso já não ocorre assim. Enquanto na Sérvia o
alfabeto utilizado é o cirílico, o mesmo usado na Rússia, na Croácia vigora o
latino. É uma situação semelhante à que ocorre entre o russo e o polonês.
Conversando, um entende, razoavelmente, o outro. Escrevendo, as coisas mudam de
figura.
A rigor, as placas das estradas ou de
estabelecimentos comerciais, na Iugoslávia, são escritas em quatro idiomas. E,
para complicar, em dois alfabetos, tão diferentes um do outro. A Croácia tem
menos da metade da população da Sérvia, com seus 4,5 milhões de habitantes.
Sua origem é essencialmente européia. A República
foi, até 1918, parte integrante do Império Austro-Húngaro. A religião
predominante é a católica. As rivalidades entre as duas etnias são muito
antigas, antecedendo, até mesmo, à formação da própria Iugoslávia. Os motivos
variaram ao longo do tempo, mas a intolerância de um povo em relação ao outro
sempre permaneceu igual.
Os confrontos entre sérvios e croatas atingiram o
seu auge durante a Segunda Guerra Mundial. Historiadores locais garantem que as
lutas entre eles provocaram uma quantidade de mortes muito maior do que a
resultante da ocupação nazista desse território, que começou em 1941.
Enquanto os partizans, guerrilheiros de Tito,
lutavam para expulsar os invasores alemães e tinham como objetivo criar um
Estado federativo como a União Soviética, englobando as várias Repúblicas sob o
regime comunista, os “Ustashis”, da Croácia, atuava em sentido inverso.
Tratava-se de um grupo fascista, portanto, solidário
com as potências do Eixo. Teme-se que, agora, tudo isso venha à tona, para se
somar à aguda crise econômica e ao impasse institucional criado pelo veto a
Mesic e desemboque numa incontrolável onda de violência. Afinal, como observou
Janathan Eyal, do Instituto Real de Serviços Unidos da Grã-Bretanha, a Patrick
Worsnip, da Agência Reuter: “Nos Bálcãs, tudo é resolvido à bala”.
(Artigo publicado na página 26, Internacional, do
Correio Popular, em 19 de maio de 1991)
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