Ato de coragem
Pedro J. Bondaczuk
O acordo de eliminação de mísseis de média e curta
distância, que as superpotências vão firmar na terça-feira, não deixa de ser um
ato de arrojo do presidente norte-americano, Ronald Reagan, e do líder
soviético, Mikhail Gorbachev.
O leitor nem imagina quantas e terríveis forças, em
Washington e em Moscou, estão empenhadas (e estiveram desde o início das
negociações) para que o pacto não fosse assinado. Como isso, agora, parece ser
impossível, todas as baterias desses lobbies vão se voltar, doravante, para o
Congresso dos Estados Unidos. Especialmente na direção do Senado, ao qual
caberá ratificar (ou não) o tratado, para que ele entre em vigor.
Como se vê, os dois líderes venceram uma batalha,
mas estão longe, ainda, de ganhar a guerra. Em Moscou, embora isso não tenha
vindo à luz da opinião pública, a oposição à medida, certamente não foi menor
do que em Washington.
Tudo isso se deve ao fato da indústria armamentista
nuclear empenhar verbas monumentais, que são desviadas de outros itens
importantes, de caráter social, para essa imensa fornalha de desperdício. O
setor formou uma espécie de elite de técnicos e de operários, altamente
especializados, regiamente remunerados que, certamente, não vai querer perder
privilégios. Mesmo que essas regalias se originem de uma atividade tão
perniciosa quanto essa, pelo produto que fabrica.
Os políticos que defendem a corrida armamentista (e
nem seria preciso dizer, de tão óbvio que isto é), tiveram as campanhas
eleitorais financiadas, e portanto foram eleitos, pelos grandes fabricantes
destes terribilíssimos artefatos de morte.
Para esse pessoal, pouco importa que essas
engenhocas possam destruir o Planeta e varrer dele todo e qualquer vestígio de
vida. Em geral, são indivíduos céticos, cínicos, sem nenhuma crença religiosa e
sem apego a qualquer outra coisa que não seja o dinheiro. Voltam-se para um
hedonismo inconseqüente e enjoativo, como se o homem fosse criado sem nenhuma
outra finalidade se não gozar os efêmeros prazeres da carne, mesmo que isso
implique em sofrimento e morte para milhões de semelhantes.
No caso de Reagan, a hostilidade maior está em seu
próprio partido, o Republicano. No de Gorbachev, a oposição é menos ostensiva,
mais sutil e, por isso mesmo, muito mais perigosa. Para ambos, porém, políticos
experientes que são, o que conta é o povo.
Tanto um, quanto o outro, são excelentes
comunicadores. Conseguem despertar empatia na população tão logo começam a
falar. Têm um extraordinário poder de convencimento. E nesta oportunidade,
principalmente, vão estar no elemento que lhes é mais familiar: o foco das
câmeras de televisão, das objetivas dos fotógrafos e da observação de
jornalistas do mundo todo.
Por isso, ousaram passar por cima dos políticos
comprometidos com a morte e com a desolação do Planeta, gente que faz o jogo
das baratas e dos escorpiões, que seriam os únicos seres viventes que
conseguiriam sobreviver a uma catástrofe nuclear.
(Artigo publicado na página 20, Internacional, do
Correio Popular, em 6 de dezembro de 1987).
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