Thursday, March 27, 2014

Deslumbrante


Pedro J. Bondaczuk


A poesia é, sobretudo, o absoluto conhecimento do manejo das palavras. Elas são a matéria-prima do poeta, com as quais pinta quadros líricos ou trágicos, heróicos ou tétricos, humanos ou divinos. São suas “tintas”, para tornar concretos sonhos, fantasias e elucubrações.

Raros escritores aproximaram-se tanto do perfeito manejo vocabular como o chileno Pablo Neruda. Seu domínio do idioma – no caso, o espanhol – fez com que extraísse de cada termo, até o aparentemente mais banal, força magnética e contundência, até. É um dos raros poetas cujos poemas não perdem força e expressividade mesmo quando traduzidos.

Seu ato de fé na poesia se expressa no poema "A Palavra", que começa assim:

"Sim, senhor,
tudo o que queira,
mas são as palavras
as que cantam,
as que sobem
e baixam.

Prosterno-me
diante delas,
persigo-as,
mordo-as,
derreto-as.
Amo tanto as palavras!".

Mais adiante, acrescenta:

"Brilham como
pedras coloridas,
saltam como
peixes de prata,
são espuma,
fio, metal,
orvalho".

A simples menção dessas palavras no poema formam, na mente do leitor, imagens encantadas. Visualizamos cada objeto que elas simbolizam. Embalamo-nos em sua musicalidade. Sonhamos o sonho do poeta.

Neruda foi mestre neste exercício de esgrimir com palavras. Todavia sua poesia não se limita, como muitos poetas fazem, em simplesmente lançar a esmo expressões bem escolhidas e sonoras. Confere unidade ao texto. Dá-lhe substância, significado e calor humano.

Embora politicamente um guerreiro, defensor das grandes causas sociais e contagiado pelo "vírus" da utopia socialista, usava sua arte não como lança,  adaga, pistola ou bomba, mas como bálsamo, perfume, melodia.

É dele esta comparação:

"A poesia é um ato de paz.
O poeta nasce da paz,
como o pão nasce da farinha.
Os incendiários, os guerreiros,
os lobos buscam o poeta
para queimá-lo, para matá-lo,
para mordê-lo.
Um espadachim
deixou Pushkin ferido
de morte entre
as árvores de um
parque sombrio.
Os cavalos de pólvora
galoparam enlouquecidos
sobre o corpo sem vida
de Pettofi.
Lutando contra a guerra
morreu Byron na Grécia.
Os fascistas espanhóis
iniciaram a guerra
na Espanha
assassinando seu melhor poeta".

Se tivésse que definir a poesia de Neruda numa só palavra, a chamaría de "deslumbrante"! E não é?!!!


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