Mola
propulsora do progresso
Pedro J. Bondaczuk
A
insatisfação é a mola propulsora de todas as realizações humanas, seja em que
campo for. O sujeito satisfeito com tudo não tem motivo para se empenhar no
sentido de melhorar o que considera excelente. Aliás, não tem motivação sequer
para viver. Será que existem pessoas assim? Infelizmente... existem. E mais,
elas são maioria. Acomodam-se, não buscam melhorar a si mesmas e muito menos o
que as rodeia. Nulificam-se. Tornam-se pesos mortos para suas famílias e para a
sociedade. Não justificam, reitero, sequer, a existência.
Os
que se destacam no mundo são os insatisfeitos. Não, óbvio, os que se limitam a
reclamar do que é ruim, sem nada fazer para melhorar. Esses, também, são
omissos. Esperam que outros façam o que poderiam e deveriam realizar. Os
insatisfeitos que movem o mundo são os que se aplicam em melhorar tudo o que
possam, nos limites de suas capacidades. E mesmo estes limites eles procuram
ampliar ao máximo, estudando, pesquisando, experimentando e persistindo, mesmo
quando suas experiências não dêem certo. Na economia, a insatisfação é
essencial, embora muitos exagerem na dose e, por isso, descambem para o
extremo, para a estupidez da avareza. Desde que moderada, porém, ou melhor,
desde que corretamente dosada, ela é poderosa (diria imprescindível) mola
propulsora da prosperidade.
A
insatisfação é um dos raros comportamentos do homem que atravessou todos os
ciclos de civilização e está mais vivo do que nunca neste século XXI do
terceiro milênio da Era Cristã. Muitos, óbvio, exageraram nela e recorreram a
guerras, para se apropriar do que precisavam, mas não tinham capacidade (ou
vontade) de produzir, avançando nos bens alheios, naquilo que outros produziam.
Mas não me refiro, apenas, à insatisfação material. Penso, principalmente, na
espiritual, nessa busca incansável que caracteriza o Homo Sapiens pelo
conhecimento das origens e destino e da fonte perpétua de beleza. Nesse
sentido, a insatisfação mostrou-ser eficaz como motivadora de ação.
Os
gregos, por exemplo, nunca se contentaram com suas extraordinárias conquistas
intelectuais, miraculosas na época em que viveram e admiráveis ainda hoje. Com
isso, criaram o teatro, a filosofia e a poesia. Desenvolveram a escultura e a
arquitetura. E produziram outros tantos frutos do intelecto. Não fossem conquistados
pelas armas, por outros povos, poderiam ter criado coisas ainda muito mais
admiráveis.
Já
a insatisfação romana era basicamente sensorial. Referia-se ao gozo da carne.
Era um povo eminentemente epicurista. Ainda assim.., os romanos produziram
poetas notáveis, filósofos de mão cheia, além de escultores e outros tantos
artistas admiráveis, posto que em número muito menor do que os gregos. Mesmo
admirando Virgílio, Horácio, Ovídio etc. etc. etc, sou induzido a admitir que o
período em que Roma foi a senhora do mundo foi, em termos artísticos, de
retrocesso em relação à era de predomínio da Grécia. Os romanos foram, sim,
insatisfeitos, mas a riqueza que acumularam, submetendo (pelas armas) outros
povos, atenuou sua insatisfação, sobretudo a estética.
Já
os homens da chamada Idade Média eram insatisfeitos, sim, mas no aspecto
espiritual, no da prevalência do espírito (no sentido transcendental) sobre os
sentidos. Exageraram nisso. Ou melhor, distorceram esse conceito. Abominaram
tudo o que fosse humano e incorreram no extremo de demonizar a beleza.
Equivocaram-se quanto ao sentido do transcendental, criando, em suas mentes
acanhadas e dogmáticas, um “deus repressivo e implacável”, ao contrário da
verdadeira natureza divina, caracterizada pela complacência, pela compaixão,
pela compreensão e pelo amor. Fizeram de suas vidas, e das de todas as pessoas
do seu tempo, um “inferno na terra”. Não por acaso, esse período é considerado
como o de maior atraso no que se refere não apenas às artes, mas, sobretudo, à
civilização.
Todavia,
tais exageros acentuaram, em espíritos rebeldes e lúcidos, profunda
insatisfação com aquela realidade. E esta evoluiu, prosperou e resultou em
extraordinária “explosão” de criatividade artística, e em todas as artes, da
poesia à música; da pintura à arquitetura; da ourivesaria à escultura, e vai
por aí afora. Não por acaso, esse movimento libertador do espírito passou para
a história com a alcunha de “Renascimento”. O homem, praticamente morto para a
beleza, “renasceu”, e mais vigoroso do que nunca.
E
o Homo Sapiens Sapiens contemporâneo, é insatisfeito? Mais do que nunca! A
este, no entanto, materialista por excelência, nenhum bem satisfaz de maneira
suficiente. É verdade que essa insatisfação é o que move a economia, gerando
necessidades (reais ou imaginárias), que as pessoas empreendedoras e dinâmicas
buscam, em vão, satisfazer. Com isso, criam-se indústrias, produzem-se objetos,
geram-se empregos e faz-se circular a riqueza, em um "moto perpétuo".
É certo que a fúria consumista do homem contemporâneo traz, como subproduto, a
depredação acelerada do meio ambiente e o esgotamento dos recursos do Planeta,
que são finitos.
O
"ex-manager" da General Motors, dos Estados Unidos, Charles
Kettering, definiu com precisão as vantagens desse comportamento compulsivo,
mas impôs-lhe uma regra. Afirmou: "A chave para a prosperidade econômica é
a criação organizada da insatisfação". E como se organiza isso? Mediante a
publicidade, a comunicação e a informação! Daí esse ramo, hoje, ser mais do que
mera disciplina. Transformou-se em arte por excelência, englobando ciências tão
variadas quanto a psicologia, a antropologia, a etologia (ciência do
comportamento) e até a filosofia.
O
homem contemporâneo carece, no entanto, de prudência. Precisa aprender a
direcionar sua insatisfação (sem eliminá-la, óbvio), sobretudo evitando o que
mais tem feito nos últimos três séculos, a partir da Revolução Industrial: o
desperdício. Os recursos essenciais para satisfazer todas as necessidades da
atual civilização são finitos e tudo indica que estejam em vias de se esgotar.
E, a menos que o homem conquiste e povoe outros mundos – o que na atualidade
não passa de delirante fantasia – pagará caro, muito caro, um preço
absurdamente proibitivo, pelo que já desperdiçou e continua desperdiçando. O satisfeito, todavia, que chamo de
“acomodado” é, antes e acima de tudo, um perdedor. E os gregos do passado já
sabiam disso...
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