Revanche entre irmãos
Pedro J. Bondaczuk
A
Índia e o Paquistão, que até 1947 formaram uma unidade territorial sob o
domínio colonial britânico, estão em vias de travar a sua terceira guerra desde
que os dois países se tornaram independentes. As duas anteriores foram vencidas
pelos indianos. Na última, os paquistaneses acabaram sendo territorialmente
mutilados, com a perda de sua parte Oriental que hoje é o Bangladesh. O
"pomo da discórdia", como há 43 anos, continua sendo centralizado no
Estado de Cachemira e Jammu, a única unidade federacionista de predominância
muçulmana. Nova Delhi, evidentemente, pretende conservar essa área. Islamabad,
por seu turno, deseja anexá-la ou, quando não, fazer com que ela obtenha a sua
autonomia, como uma espécie de "troco" pelo que ocorreu em 1971,
quando sofreu uma mutilação territorial.
Qualquer
guerra, por mais limitada que seja, é um fator de desestabilização
internacional, é óbvio. Mas o risco da eclosão de um conflito entre a Índia e o
Paquistão se torna muito maior se levarmos em conta que ambos os países, na
atualidade, ou possuem, ou estão prestes a desenvolver armas nucleares. Quem
pode garantir que num momento de desespero, quando a sorte das batalhas estiver
desfavorável e uma derrota for iminente, alguma das partes não recorrerá a esse
recurso? Por isso, este é o momento para que as grandes potências, em especial
as duas "super", Estados Unidos e União Soviética, intervenham na
questão, jogando "água fria na fervura".
A
questão de Cachemira é muito complicada, exige grande dose de paciência e muita
negociação. Através das armas, todavia, jamais o problema irá encontrar alguma
solução. Um conflito armado tenderá, somente, a produzir mais dor e sofrimento
a duas comunidades nacionais fortes militarmente, mas economicamente frágeis.
Jogará pelo "esgoto" os parcos recursos que ambos possuem para
resolver as suas imensas carências, destruindo o pouco que já existe e que irá
exigir, mais adiante, verbas para a reconstrução.
Acresça-se
a isso o perigo do uso irresponsável por alguma das partes (ou por ambas) de
uma única arma atômica que seja. As conseqüências, não somente para indianos e
paquistaneses, mas para todo o mundo, de algo assim, podem ser simplesmente
trágicas. Estranha-se que, mesmo com toda a movimentação militar da Índia e do
Paquistão, registrada nos últimos dias, a comunidade internacional esteja
passiva, somente à espreita, diante dessa ameaça, num período em que as
dramáticas mudanças ocorridas no Leste europeu fazem vislumbrar uma era de paz,
num século que já teve tanto sangue e violência.
(Artigo
publicado na página 11, Internacional, do Correio Popular, em 19 de abril de
1990)
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
No comments:
Post a Comment