Lições
que o homem nunca aprendeu
Pedro J. Bondaczuk
A
história jamais se repete e, por essa razão, os erros cometidos no passado, que
levaram civilizações à decadência e à posterior extinção, acabam
invariavelmente esquecidos. Caso não o fossem, sofrimentos inúteis, destruições
insensatas e massacres criminosos seriam certamente evitados. Se porventura a
humanidade soubesse não reincidir em equívocos praticados em outros tempos, os
povos teriam queimado etapas na busca de uma sociedade ideal, em que houvesse
fartura, equilíbrio e solidariedade e em que todos pudessem se sentir
realizados e conseqüentemente felizes. Mas... uma coisa tão simples não passa
de utopia, tida e havida como impossível de se concretizar.
Poucos
escritores têm coragem de pôr o dedo nessa dolorosa ferida: a do preconceito,
sobretudo o racial. Aliás nem tenho certeza se são eles que não escrevem a
propósito ou se os editores é que se recusam a publicar seus textos, por razões
que só eles poderiam explicar (ou não). O fato é que por causa, exclusivamente,
da nossa estupidez, o simples desejo de coisas tão corriqueiras e fáceis de
conseguir hoje, com as facilidades existentes de informação e de comunicação –
como o irrestrito respeito pela individualidade, por exemplo – soa como utopia,
como enorme fantasia, como algo que extrapola, em muito, o plano da realidade.
O
preconceito, seja de que espécie for – de raça, de religião, de sexo, de
condição econômica ou social – é uma doença do espírito, que muitas vezes
atinge surtos epidêmicos e causa grandes tragédias. O racismo, mais
especificamente (nas mais variadas formas em que se manifesta), já redundou,
entre outras coisas, em duas guerras mundiais no século passado que, somadas,
foram responsáveis por pelo menos setenta milhões de mortes. A primeira foi
causada pela revolta dos bósnios e sérvios, que se recusavam a ver parte dos
seus territórios anexada à Áustria. E por razões puramente étnicas. Por isso,
Gavrilo Princip, integrante de um grupo nacionalista chamado "Mão
Negra", que costumava manter reuniões na taverna "Grinalda
Verde", em Belgrado, foi incumbido de uma missão que ele julgava sagrada e
que, no entanto, se revelou desastrosa. Ou seja, deveria assassinar o
arquiduque Francisco Ferdinando, que estava com viagem marcada para a Bósnia,
mais especificamente para Sarajevo, para comandar exercícios militares.
E
ele cometeu, de fato, esse ato de violência, que encarava como fundamental para
sua causa, em 28 de junho de 1914. Com isso, conseguiu deflagrar a Primeira
Guerra Mundial, que já vinha "fermentando" há tempos e que carecia
somente de um pretexto, de um “estopim” para começar. Passados 21 anos dessa
conflagração, e eis que outra, muito mais escabrosa e cruel, surgiu, por
idênticos motivos: por pretensa superioridade de uma etnia sobre outra (ou
sobre outras, para ser mais exato). Foi deflagrada por uma questão indefinida,
vaga, tola ao extremo, chamada "racismo".
O
que, em termos de seres humanos, se entende por "raça"? A separação
de pessoas por tal parâmetro é indigna. Animaliza os homens. Estes têm
identidade, têm o poder de raciocínio e do livre-arbítrio. Raça é algo que se
aplica a seres inferiores, aos animais, não a pessoas. Mas é este conceito
estúpido e ilógico que ainda prevalece, posto que dissimulado. Na África do
Sul, a maioria do povo que habita esse país foi privado por anos de todos os
direitos em sua própria pátria somente por uma questão de cor da pele. Nos
Estados Unidos, os conflitos raciais permanecem sempre latentes e volta e meia
emergem à tona. Na extinta União Soviética, distúrbios étnicos entravaram a evolução
da "glasnost" e da "perestroika" e contribuíram para a
dissolução dessa superpotência. E o racismo se multiplica pela Grã-Bretanha,
Itália, França, Espanha, Rússia etc, posto que enfaticamente negado.
Manifestações
racistas são para lá de comuns nos esportes, por exemplo, a despeito de
campanhas para conscientizar as pessoas que se trata de comportamento a ser
erradicado. No futebol, tanto a Fifa, quanto a Uefa e várias federações
nacionais procuram convencer atletas e torcedores a se livrarem de seus
preconceitos, em nome da nobreza do esporte. Em vão! São comuns manifestações
racistas nos estádios, contra atletas negros, quer provenientes da África, quer
de outros países, como o Brasil, por exemplo. Roberto Carlos passou por essa
amarga experiência na Rússia. Dia desses, o zagueiro Paulão, do Betis, time da
cidade de Sevilha, na Espanha, saiu chorando de campo, após torcedores do seu
próprio time hostilizarem-no com palavras ofensivas, de conotação racista. Que
pena que a história não tenha nos ensinado nada e que repitamos erros e comportamentos nitidamente nocivos e
desastrosos, como este!
E
o preconceito não é somente, ou especificamente, o de cor. Vejam o que ocorre
na África. Rivalidades étnicas, ou seja, racismo, causaram (e ainda causam)
inúmeros massacres, selvagens e dantescos. Um deles, o mais conhecido, foi o
que envolveu os hutus que dizimaram milhões (isso mesmo, milhões!) de tutsis, e
vice-versa, nos anos 90, em Ruanda e em Burundi. Essas carnificinas são
seqüelas ainda do período colonial, quando as grandes potências européias
reuniram, num mesmo território, por elas administrado, povos que mantinham
rivalidades milenares e ódios há muito represados.
No
período em que ingleses, franceses, portugueses, espanhóis, alemães, belgas e
italianos mantiveram seu domínio no continente africano, a pretexto de
"civilizarem" esses povos, apenas exploraram seus recursos naturais,
não muito abundantes por sinal, carrearam as parcas riquezas existentes na
região para seus próprios cofres e deixaram, como maldita herança, populações
inteiras desnorteadas. Nem conseguiram fazer com que sua cultura fosse
assimilada e nem permitiram que as locais se conservassem. Deu no que deu.
Hoje
a África, salvo raras exceções, se transformou em sucursal do inferno na Terra.
Indigência, violência, prepotência e falta de perspectivas foram os legados que
os europeus deixaram a povos com extraordinária tradição de humanismo. O
preconceito, de qualquer espécie ou natureza, tem apenas isso a oferecer: o
caos! Mas... a humanidade não consegue (ou não quer) entender essa verdade, que
é tão obvia. Teima em nunca aprender as simplérrimas lições da História.
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