Sunday, March 02, 2014

Da promessa à consagração

Pedro J. Bondaczuk

O décimo oitavo integrante (por ordem de publicação) da antologia de contos “Histórias da Bahia” (Edições GDR, Rio de Janeiro, 1963), que tomei como referência para a presente série de estudos sobre 23 dos principais ficcionistas baianos, é Noênio Spinola. A exemplo de vários outros personagens, destacou-se em várias atividades, além da Literatura e, claro, também no jornalismo. Não há, por exemplo, leitor de jornal, principalmente do Rio de Janeiro e de São Paulo, que nunca tenha lido pelo menos seu nome. Leu-o, com certeza, e milhares de vezes. Seu currículo é tão extenso, e em tantas atividades, que por mais que se tente fazer um resumo, ainda assim, ocupará, sem exagero, todo o espaço que destino, diariamente, a este contato com meus leitores.

Tentarei esta façanha, mas, por mais atento e meticuloso que eventualmente eu venha a me mostrar, certamente omitirei algum detalhe do que é e do que faz, tantas são as informações de que disponho e, principalmente, tantos são os seus feitos, jurídicos, jornalísticos, econômicos, literários e vai por aí afora. Noênio Dantas Le Spínola é natural da cidade de Itabuna. Na época da publicação de “Histórias da Bahia”, em 1963, era um quase adolescente, promissor e talentoso, mas ainda desconhecido fora dos limites do seu Estado (e a rigor, mesmo dentro dele). Quem poderia prever que chegaria onde chegou? E não me refiro, especificamente, às letras, mas em tantos outros setores profissionais e culturais do País em que atuou.

É certo que nessa ocasião, em 1963, já não era propriamente inédito. Havia publicado contos no livro “Reunião”, junto com outros três jovens então também bastante promissores, que viriam a confirmar anos depois que eram não apenas “bons”, como pareciam, mas, na verdade, geniais: João Ubaldo Ribeiro, David Salles e Sônia Coutinho. Que quarteto! Lembro que “Reunião”, uma espécie de mini-antologia, foi publicada em 1961, pela Universidade da Bahia. Há promessas que vingam e há outras tantas que não. Estes quatro, então quase adolescentes, não somente vingaram: se consagraram.

Na ocasião, início da década de 60 do século XX, o crítico e acadêmico Eduardo Portella escreveu o seguinte sobre o então promissor jovem contista: “Os contos de Noênio Spinola traduzem perfeita e ostensivamente todos os esforços coletivos no sentido de desligar o conto de seus compromissos anteriores, visando a levantar uma entidade renovada, porque rebelde aos padrões e esquemas pretéritos”. E essa capacidade de inovação iria se acentuar, cada vez mais, com o passar do tempo, tornando-o um dos ficcionistas mais originais e únicos da Literatura brasileira.

É impossível destacar em qual atividade Noênio mais se destacou, se na carreira jurídica, se no exercício do jornalismo, se na de especialista em economia, notadamente em comércio exterior e mercado de capitais ou se na de escritor. Claro que para nosso estudo, o foco de maior interesse é a sua atividade literária. Mas seus feitos nos outros setores citados têm que ser destacados, até para se entender o quanto suas ações foram eficazes e porque é hoje esse intelectual tão reputado e tão reverenciado.

Noênio Spinola formou-se em Direito, pela Universidade Federal da Bahia. Mas, ao contrário de vários outros personagens, a respeito dos quais tratei nesta série de estudos, dedicou-se, sim, durante algum tempo, à carreira jurídica. É, por exemplo, membro atuante da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Atuou no Ministério Público, como Promotor concursado. Mas é no Jornalismo, aliás, no setor de Comunicação, que mais se destacou (e vem se destacando). Entre outras coisas, foi editor-chefe de um dos maiores jornais do País em fins do século passado, o “Jornal do Brasil” do Rio de Janeiro, hoje decadente e com versão apenas eletrônica, mas que na época rivalizava com os maiores órgãos de imprensa brasileiros, função que exerceu por dois anos: de 1998 a 2000.

Antes de chegar ao topo do jornalismo, que é a chefia de redação, Noênio havia feito invejável carreira como correspondente internacional. Trabalhou, por exemplo, nessa função, em Washington, de 1977 a 1979, como residente, com credenciais da Casa Branca, do Departamento de Estado e do Senado norte-americano. Foi deslocado depois para Moscou, nos tempos de União Soviética (e do auge da Guerra Fria), e em duas oportunidades diferentes: entre 1979 e 1981 e entre 1990 e 1991, já nos estertores da URSS. Ali, estava credenciado no Ministério de Relações Internacionais. Atuou, ainda, como correspondente, em Londres (de 1981 a 1983) e em Bruxelas, sede da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) e da União Européia, em 1992.

Fez algumas coberturas internacionais daquelas que todo o jornalista sonha em fazer e raros conseguem. Uma delas foi a invasão soviética ao Afeganistão, em 1979, que não somente reportou, mas que também fotografou. A outra foi a primeira guerra entre o Irã e o Iraque, no início dos anos 80. De retorno ao Brasil, foi editorialista internacional do jornal “O Estado de São Paulo”, oportunidade em que também atuou como radialista na capital paulista. Poucos jornalistas têm um currículo tão rico e variado a ostentar, não é mesmo? Mas seus êxitos não param por aí.

Ainda no setor de Comunicação, posto que não propriamente no jornalismo, Noênio Spinola ocupou funções de grande relevância e responsabilidade. Foi, por exemplo, diretor do Departamento de Relações Institucionais da Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa). Querem mais? Pois lá vai, foi superintendente de Mercados Agrícolas. Ainda na mesma área, foi o diretor responsável pelo conteúdo da BM&F na internet e de geração de imagens para a televisão e mídia em geral dessa entidade. Secretariou e redigiu as atas do Conselho de Administração da Bovespa por quase nove anos, de dezembro de 1999 a maio de 2008. Ufa!!!

Mas seu currículo (e bem resumido) não para por aí. Noênio Spinola atuou, também, na área de Educação, posto que específica. Estruturou, por exemplo, convênio com a Fundação Instituto de Administração da Universidade de São Paulo para o Mestrado em Administração Financeira, destinado, especificamente, a jornalistas. Há 50 anos, em 1963 (quando da publicação de “Histórias da Bahia”), já havia dirigido a Campanha de Alfabetização de Adultos pelo método de Paulo Freire. Chega? Por hoje sim. Mas há muito, ainda, a ser dito sobre o jurista, o jornalista, o comunicador e o eclético escritor Noênio Spinola.


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