Valorização
do diálogo
Pedro J. Bondaczuk
O encontro realizado, ontem, na cidadezinha
montanhosa de La Palma, em El Salvador, entre o presidente daquele país, José
Napoleón Duarte, e os guerrilheiros, pode, eventualmente, não conduzir os
salvadorenhos à sonhada pacificação nacional. Mas deixa algumas importantes
lições para todos.
Nos últimos anos da História moderna, o gesto
conciliatório do mandatário centro-americano soa como algo quase inédito,
principalmente em se tratando de América Latina, onde, infelizmente, ainda se
dá mais valor à força das armas do que ao poder do diálogo.
A atitude do presidente salvadorenho é, guardadas as
devidas proporções, semelhante à do presidente colombiano, Belisário Betancurt,
que decidiu reincorporar diversos guerrilheiros, na clandestinidade há mais de
vinte anos, na vida política nacional, com o pacto que firmou com os principais
grupos rebeldes existentes no país, no mês de agosto.
Entretanto, na Colômbia, a situação era muito mais
calma do que em El Salvador e os esquerdistas, em momento algum, chegaram a
colocar, realmente, em risco a paz e a economia nacionais. Suas ações isoladas
eram mais “espetaculosas” do que perigosas, em termos de sobrevivência do
regime. Eram, tão somente, incômodas.
Esse já não é o caso salvadorenho, onde milhares de
vidas se perdem diariamente na luta feroz e fratricida, fadada a não ter
vencedores. Ninguém, em sã consciência, com um mínimo de conhecimento político,
pode admitir, sequer, a remota possibilidade dos guerrilheiros salvadorenhos
ascenderem ao poder. Os EUA jamais deixariam surgir em suas fronteiras uma
outra Cuba, ou uma nova Nicarágua. Admite-se que alguma pessoa (ou governo)
possa errar duas vezes. Mas na terceira...
Para o presidente Napoleón Duarte essa situação de
beligerância, também, só traz prejuízos de toda ordem. A sua autoridade entra
em colapso. Ele detém controle de fato sobre áreas cada vez menores do
território nacional. E, economicamente, o país entra em parafuso. Ou seja,
estabelece-se o caos, sem nenhuma perspectiva de que qualquer espécie de
programa possa, sequer, ser cogitada, quanto mais implantada.
O país, sobretudo, corre sério risco de uma ocupação
estrangeira e até de desaparecer. A vitória pelas armas seria apenas uma
ficção. Não faltariam interessados na continuidade dos combates, que
forneceriam armas, e até combatentes, para que as lutas prosseguissem. Afinal,
o nefasto comércio da morte alimenta-se de desacordos. E, como as aves de
rapina, os chacais e as hienas, eles não sobrevivem sem cadáveres.
Pela segunda vez consecutiva, portanto, no espaço de
apenas um ano, a América Latina dá uma lição ao mundo. A de que o continente
está maduro para ensejar o nascimento de uma nova geração de líderes políticos,
que realmente se preocupem com seus países, e não apenas com a transitória
posse do poder.
A América Latina está em vias de assistir a grandes
transformações de mentalidade, o que devolve, a todos nós (pelo menos um
pouquinho) a perdida esperança, que tantos e seguidos revezes subtraíram.
(Artigo publicado na página 11, Internacional, do
Correio Popular, em 16 de outubro de 1984)
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