Sunday, December 22, 2013

A praxis política de Khadafy


Pedro J. Bondaczuk
  
O líder líbio, coronel Muammar Khadafy, sempre caracterizou sua atuação política por palavras e atos espetaculosos. O leitor certamente ainda está lembrado do incidente que ele protagonizou no ano passado com o Brasil, quando aviões do seu país, carregados de armamentos, foram obrigados a descer em Manaus e Recife, num incidente longo e desgastante para as duas partes em que seu governo teve que acabar cedendo às evidências. Na oportunidade, Khadafy foi “flagrado” mentindo. Afirmou que os aviões levavam remédios para a Nicarágua, quando a carga era de armas.

Neste ano, com ligeiros intervalos, o líder líbio se fez presente com constância no noticiário e sempre envolvido em atos caracterizados como de terror. Assim foi no incidente da embaixada do seu país em Londres, quando tiros foram disparados daquele prédio contra manifestantes contrários ao regime de Tripoli, vindo a atingir a policial britânica Yvonne Fletcher, causando a sua morte.

O caso redundou no rompimento das relações diplomáticas entre a Grã-Bretanha e a Líbia. Pouco depois, o irrequieto coronel era vítima de seus próprios métodos, ou seja, de um complô, do qual escapou ileso, executando, posteriormente, seus agressores.

No incidente de colocação de minas no Golfo Pérsico e Mar Vermelho, seu nome voltou à baila como sendo o mentor do estranho ato de sabotagem, até hoje não esclarecido devidamente. E agora Khadafy é acusado pelo presidente egípcio, Hosni Mubarak (aliás, seu inconciliável inimigo) de estar criando um inédito “esquadrão da morte”, vejam só, destinado a eliminar chefes de governo de diversos países, entre os quais o chanceler alemão, Helmut Kohl, o presidente francês, François Mitterrand e a primeira-ministra Margaret Thatcher.

É incrível que em pleno século XX ainda exista governante que veja no terrorismo o melhor caminho para resolver pendências. Entretanto, várias evidências indicam terem fundamento as acusações do presidente egípcio. Segundo Mubarak, essas informações foram fornecidas por elementos do próprio esquadrão da morte enviado ao Egito para executar o ex-primeiro-ministro líbio Abdel Hamid El-Bakoush, que reside no Cairo desde 1977.

Ele escapou da morte graças a um truque, armado por policiais egípcios. Esses fizeram Khadafy acreditar que o “serviço” havia sido executado, ao forjarem uma foto da pretensa vítima, toda coberta de sangue, evidentemente falsa. Bakoush conseguiu tapear seus agressores.

Difícil, em tudo isso, é entender os objetivos do coronel líbio com essas atitudes, que contrariam todas as normas de convivência internacional e até do simples bom senso. O falecido ex-presidente do Egito, Anwar Sadat, costumava dizer que Khadafy não deveria estar governando, mas internado num hospício, por ser uma pessoa totalmente desequilibrada.

Entretanto, embora se reprovem, obviamente, as suas ações espalhafatosas (e às vezes burlescas), na verdade elas não fogem do padrão de insanidade demonstrado por líderes políticos de maior peso (principalmente das superpotências), que embora de maneira mais “diplomática” (ou encoberta), tomam atitudes inconcebíveis para quem pretende o título de estadista. O manual de guerrilha da CIA é uma prova recente disso, ainda fresca na memória de todos. Portanto, Khadafy tem exemplos de sobra para imitar...

(Artigo publicado na página 10, Internacional, do Correio Popular, em 21 de novembro de 1984).


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