Wednesday, December 11, 2013

Pantomima golpista nas Filipinas


Pedro J. Bondaczuk


Os partidários do ex-presidente filipino, Ferdinand Marcos, um grupo relativamente inexpressivo de radicais, tentou, anteontem, uma desesperada manobra para fazer retornar ao país o caos, a desordem e sobretudo o medo, armas com as quais comandaram os 54 milhões de habitantes das Filipinas por longos e intermináveis 22 anos. Como que ensandecidos, ocuparam o Hotel Manila e o ancião Arturo Tolentino prestou juramento como "presidente interino", com o objetivo evidente de preparar terreno para um eventual golpe militar.

Ocorre, todavia, que o ministro de Defesa, Juan Ponce Enrile, a quem se destinava toda essa pantomima, manteve a cabeça no lugar. E com apenas duas palavras, esvaziou a estranha manobra golpista, acabando com a festa. Disse somente: "Não estou procurando novo emprego".

O governo da presidente Corazón Aquino, apesar de uma certa tibieza, de uma indisfarçável indecisão, conta com o firme respaldo de praticamente toda a comunidade mundial. E o que é mais importante, tem a confiança da Casa Branca, o que por si só é uma garantia para a sua sobrevivência. Recentemente, o próprio secretário de Estado dos Estados Unidos, George Shultz, esteve em Manila, onde assinou um empréstimo de US$ 200 milhões para salvar a arrebentada economia filipina do caos total.

Entretanto, a simples presença do ex-ditador nas proximidades de seu país, contando com o asilo norte-americano em Honolulu, no Estado do Hawaí, é um fator altamente desestabilizador. Aliás, de um mês a esta parte, todos os domingos os mesmos dez mil partidários de Ferdinand Marcos (que certamente devem ter enormes culpas em cartório para estarem arriscando tudo, de uma maneira tão tresloucada), já vinham promovendo distúrbios em Manila. Há três semanas, protagonizaram autêntica batalha campal na cidade, desafiando as autoridades com a arrogância típica dos que estão habituados à impunidade.

Não fosse a atitude firme e desinteressada de Juan Ponce Enrile, que acima de nomes, demonstrou sua lealdade a um governo legalmente constituído, e o povo das Filipinas, a esta altura, estaria amargando um duro golpe em suas esperanças redemocratizantes. Quem sabe o ex-ditador e sua camarilha estariam se reinstalando no palácio presidencial, com toda a pompa que o caracterizou, local de onde foi escorraçado pela maioria da nação, para preparar a sua revanche.

Cabe ao governo, para não perder o pulso, punir a todos os fracassados golpistas, com dureza, mas unicamente com o concurso das leis existentes no país. Lugar de baderneiro, interessado em agir a valentona, é na prisão. E a presidente deve solicitar aos Estados Unidos uma providência enérgica contra o seu indesejado e problemático hóspede, que parece não ter perdido nada da antiga arrogância.

É certo que a presidente Corazón Aquino vem falhando na determinação da escala de prioridades, daquilo que deve fazer, passando "o carro na frente dos bois". Esse processo de negociação com a guerrilha esquerdista, por exemplo, por ser um argumento óbvio de seus adversários para arrebanharem adeptos para a volta de Marcos, poderia esperar mais um pouco.

O problema prioritário a ser atacado é o econômico, que já está sendo, timidamente, abordado. A seguir deveria vir a convocação de eleições gerais, livres e sem fraudes, para todos os cargos eletivos nas Filipinas e principalmente para a composição de uma Assembléia Nacional Constituinte.

Certamente Cory está pagando pela sua inexperiência, pelo seu noviciado. Mas é indispensável que seus assessores mais diretos, como o vice-presidente e ex-senador Salvador Laurel, a orientem. Caso contrário, uma ação aventuresca e sem sentido, como a verificada anteontem, poderá acabar saindo do mero campo da pantomima e pôr a perder, em questão de horas, todo um processo que custou anos e tantos sacrifícios para ser deflagrado.

(Artigo publicado na página 10, Internacional, do Correio Popular, em 8 de julho de 1986)


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