Comunicação sem
ambiguidade
Pedro
J. Bondaczuk
A comunicação humana é
tarefa muito mais complicada do que se possa imaginar, embora seja, é evidente,
indispensável à totalidade das pessoas. Ela é feita, óbvio, pelo menos
basicamente, mediante a linguagem. Primeiro, o único animal racional da
natureza aprendeu a expressar pensamentos, sentimentos emoções etc.etc.etc.
oralmente. Na sequência, passado muito tempo (quanto ninguém jamais saberá),
criou sua obra-prima nesse aspecto, o suprassaumo da invenção, que foi a
escrita. Sem ela, nossa civilização jamais seria o que é. Provavelmente, sequer
existiria. Pense numa sociedade ágrafa, ou seja, que não tenha alfabeto e
nenhuma forma de escrita, e estará pensando em hordas primitivas, ignorantes e
selvagens. Não sei se existe alguma. Provavelmente, sim.
Agora, pergunto: Só o
homem se comunica com os semelhantes? Óbvio, não! Todos os animais (não importa
quais), têm lá suas formas específicas para se comunicar com os outros da sua
espécie. Não se trata de utilização de palavras, que não utilizam, nem de enunciá-las
vocalmente, que não enunciam. Nesta altura, porém, é mister que nos lembremos
de pelo menos uma exceção (talvez haja várias) no reino animal. Refiro-me aos
golfinhos, Pesquisadores constataram, por exemplo, que eles provavelmente se
valem desse recurso oral, e de forma aparentemente inteligente (supostamente
exclusividade humana), para expressar o que querem, o que temem e do que
precisam, entre outras coisas.
Há biólogos que foram
mais longe e que identificaram (ou pelo menos dizem que o fizeram) um
“vocabulário” até que relativamente extenso e variado (se levarmos em conta sua
alegada irracionalidade) dessas peculiares criaturas. Seriam irracionais de
fato? Já há quem duvide que sejam. Bem, para ser sincero, também tenho lá
minhas dúvidas a propósito. Vá se saber com certeza, não é mesmo?! Li, não
lembro em que lugar, que pesquisadores identificaram em torno de uma centena de
“palavras” utilizadas pelos golfinhos para se comunicar. Elaboraram, inclusive,
um minidicionário de sua linguagem.
As baleias, sobretudo
as orcas, também teriam sua linguagem oral para comunicação. Mas... esta não é
a regra na natureza, senão exceção (caso os seres marinhos citados realmente se
comuniquem por uma espécie de “palavra”). A maioria dos animais se comunica,
preferencialmente, por gestos, pela expressão corporal, pelo olfato – marcando
territórios com urina e outros fluidos, que são identificados por outros
espécimes da mesma espécie pelo cheiro – e vai por aí afora. Enfim, de uma
forma ou de outra, posto que por instinto (seria só por ele?), todos os seres
vivos se comunicam.
A palavra humana, não
importa de qual idioma, é a melhor forma de comunicação? Bem, se comparada com
a adotada pelos outros animais, sim. Todavia, é cem por cento eficaz? Funciona
a contento em toda qualquer circunstância e com qualquer pessoa sem exceção?
Infelizmente, não! O ideal seria que funcionasse sempre e com todos. Mas nem
tudo é como desejaríamos que fosse. Esse tipo de comunicação, não raro,
apresenta ambigüidades e diversos problemas. E aqui refiro-me, basicamente, à
fala, que por várias razões, tem maior eficácia imediata do que a escrita, que
requer, antes de tudo, alfabetização, a que cerca de um bilhão de pessoas, em
pleno século XXI, ainda não tem acesso.
Por que a comunicação oral
é ambigua? Porque, por exemplo, entre outras coisas, exige que quem fala e quem
ouve conheçam o mesmíssimo idioma, pelo menos o suficiente para que os
interlocutores se entendam . Se eu for tentar comunicar o que quer que seja,
digamos, para um chinês, e não conhecer nada da língua dele (e ele desconhecer
por completo a minha), a comunicação pode até ocorrer, todavia, não será
completa e muito menos eficaz. Como? Por gestos, por mímica. Todavia, não terá
nenhuma eficácia. Mesmo que os interlocutores se expressem no mesmo idioma, no
entanto, nem sempre o que queremos expressar é perfeitamente entendido pelo
interlocutor. Pode haver diferenças de dialetos, de cultura e outros tantos
fatores a mutilar, se não vier a anular, a comunicação.
Quantas vezes eu disse alguma coisa a alguém e
esse alguém entendeu absolutamente o contrário do que tentei expressar! Isso
nunca ocorreu com você, caríssimo leitor? Provavelmente sim, embora talvez você
não se lembre ou por algum motivo não admita. A propósito desse “desentendimento”,
mais comum do que se pensa, pincei, no romance “Madame Bovary”, de Gustave
Flaubert, esta pitoresca constatação, que ilustra bem a ambigüidade que
destaquei: “É que a palavra humana é como um caldeirão rachado em que se batem
melodias para fazer dançar os ursos, quando se pretendia era enternecer as
estrelas”. Pois é, entre a intenção (ou pretensão) e o que de fato acontece,
vai uma diferença abissal.
Por isso, recomendo,
sempre, aos que lidam com textos, notadamente aos escritores, que sejam os mais
diretos e simples possíveis no que escrevem, se quiserem (e creio que todos
querem) ser perfeitamente entendidos, sem as desagradáveis (e às vezes
perigosas) ambigüidades. Que aquilo que você quer expressar seja literalmente
entendido pelo menos por quem suas mensagens e informações sejam destinadas. O
ideal é que seja por todos, desde o mais erudito dos gramáticos, ao porteiro,
faxineiro ou engraxate.
Claro que simplicidade
não é sinônimo de infantilidade, ou de boçalidade ou de qualquer outra coisa
negativa do gênero. Também não significa que, para se fazer entendido, você tem
licença para violar todas as normas da língua, notadamente sua gramática e sua
grafia. É um desafio? É! Mas compensa. Escrever bem não é florear o texto de
tal sorte que, após certo tempo de escrito, nem você entenda o que pretendeu de
fato expressar. É ser compreendido pelo máximo de pessoas, se possível, por
todas. Pense nisso.
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