Fenômenos da
modernidade
Pedro
J. Bondaczuk
A disseminação da
prática de esportes em suas dezenas de modalidades e, sobretudo, sua
popularização é, fundamentalmente, uma característica da chamada modernidade.
Isso não quer dizer que em tempos mais remotos eles não fossem praticados.
Foram. Todavia, nem de longe alcançaram a popularidade que gozam hoje e nem
despertaram as paixões que despertam em nossos dias. Eram coisa para poucos,
para atletas com físico privilegiado e, principalmente, como uma espécie de
adestramento militar. A origem dessas práticas, em termos competitivos, é
impossível de ser determinada com precisão. Mas há farta referência textual aos
esportes em relatos dos principais historiadores.
Basta remontar, por
exemplo, à Grécia Antiga, notadamente a Esparta, caracterizada pelo culto ao
físico, não raro, até, em detrimento da mente. Ademais, é até redundante e
desnecessário mencionar a origem e o desenvolvimento dos Jogos Olímpicos, por
se tratar de conhecimento praticamente generalizado. Os romanos, também, foram
exímios esportistas, embora as modalidades praticadas em seu tempo fossem de
tal sorte violentas, que hoje são consideradas bárbaras e ninguém se atreve a
promover competições do tipo.
Roma teve, inclusive,
um campeão olímpico, e dos mais célebres. Foi seu imperador Nero (chamado,
quando assumiu o comando do império da maior e mais poderosa superpotência do
passado, entre as maiores de todos os tempos, de Nero Claudius Caesar Augustus
Germanicus, mas cujo nome original, dado por seus pais, foi Lucius Domitius
Aenobarbus). Ele participou das Olimpíadas de 67 a.D. e os cronistas da época
afirmam que essa participação teve fins políticos, mais especificamente,
diplomáticos. Não vejo razão para não se dar crédito aos seus contemporâneos. A
intenção de Nero, conforme essas fontes, foi a de buscar uma aproximação com a
Grécia, submetida ao Império Romano, além, claro, de mostrar aos gregos e aos
demais povos o que entendia ser a “superioridade” do seu povo, inclusive em
termos de competitividade.
Várias testemunhas do
evento relataram que o imperador não era lá essas coisas, nem como atleta e nem
mesmo como artista (os jogos de então tinham, também, características
artísticas, com provas de canto e de declamação). Há quem diga que, por questão
de antipatia pessoal e oposição política, esses cronistas deturparam a imagem
de Nero, pintando-o como ridículo e caricato, quando não “louco”, já que ele
conquistou todas as coroas de louro em disputa (eram as “medalhas” de então),
que fez questão de exibir, com grande pompa, nas ruas e praças de Roma.
Todavia, essas testemunhas voltam à carga e garantem que ele só ganhou as
provas em que participou dada sua condição de imperador e alguns vão ao extremo
de garantir que ele subornou os juízes.
Para provar que Nero,
como atleta, era medíocre, citam seu desempenho em uma das principais
modalidades. Na corrida de carros com dez cavalos ele perdeu o controle do
veículo e sofreu espetacular queda, que quase causou sua morte. Mas pelo menos
em um quesito ele mereceu a máxima láurea: no de sorte. A despeito da queda,
potencialmente mortal, Nero sofreu, apenas, alguns arranhões (inclusive em sua
exacerbada vaidade), sem maiores conseqüências. Como se vê, em tempos tão
remotos, já havia esportes e, também, quem escrevesse a respeito, destacando
heróis e vilões, como acontece hoje (guardadas, claro, as devidas proporções).
Só não se sabe se ambos eram reais ou forjados. É questão de acreditar ou não
nos relatos, não há outro jeito.
Todavia, as modalidades
que hoje estão entre as mais populares do mundo foram criadas, apenas, no
século XVIII (algumas) e principalmente no século XIX. Um exemplo? O basquete,
no qual os Estados Unidos detém absoluta hegemonia. Pudera, foram seus
criadores! Seu “inventor” foi James Naismith, professor de Educação Física da
Associação Cristã de Moços de Springfield (não confundir com a cidade do mesmo
nome do seriado televisivo “Os Simpsons”), no Estado de Massachusetts. O ano de
criação foi 1891, embora a primeira competição tenha ocorrido em 20 de janeiro
(data do meu aniversário) de 1892. Pitoresco foi o placar registrado, quando se
sabe que os escores dessa modalidade se caracterizam por contagens centenárias:
foi de 5 a 1 para o quinteto vencedor.
Já o beisebol, o esporte disparadamente o mais
popular nos Estados Unidos, não teve origem nesse país, como muitos supõem, e é
um pouquinho mais antigo. A modalidade, do jeito que é praticada hoje, surgiu
no Reino Unido, mais especificamente na Inglaterra e na Irlanda, provavelmente
em 1744. Foi levada para a terra de Tio Sam por imigrantes. A primeira partida
“oficial” nos EUA – pelo menos a primeira menção escrita a essa disputa – teria
acontecido em 1791 (embora não haja referências ao mês e ao dia) em Pittsfield,
também no Estado de Massachusetts.
Já o futebol americano
– ou simplesmente futebol, já que o que conhecemos e praticamos no Brasil com
esse nome, lá é conhecido como “soccer” e é considerado jogo tipicamente
feminino – a segunda modalidade mais popular dos Estados Unidos (abaixo do
beisebol e acima do basquete), surgiu em 1867. Trata-se de uma derivação do
“rugby”, com regras próprias e características. Originou-se de uma série de
três jogos entre duas universidades esportivamente rivais, Harvard e Yale, que
foram disputados na localidade de Mackenzie.
Outras tantas modalidades
esportivas, entre as quais o futebol, que hoje é, disparadamente, a que mais
interesse desperta, que movimenta mais dinheiro e que provoca mais e extremadas
paixões mundo afora, foram criadas ou em final do século XVIII ou ao longo do
século XIX. Isso comprova minha afirmação inicial que os esportes, como
conhecemos hoje, e como são praticados neste início do terceiro milênio da era
cristã, são fenômenos da chamada “modernidade”. Tentarei, na sequência,
detectar ou apurar a razão (ou razões) dessa “explosão” de invenções.
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