Tuesday, July 02, 2013

Rota do impossível

Rota do impossível

Pedro J. Bondaczuk

Impossível é que me esqueça
--- enquanto me restar um só sopro de vida –
as emoções incontidas, eternizadas
em versos sofridos, trôpegos,
cambaleantes, como um ébrio,
balbuciantes, senão gagos,
porta-vozes de momentos
singulares e muito especiais.

Impossível é esquecer, doce amada,
o primeiro beijo que trocamos,
trêmulos, ávidos e ansiosos,
sob uma frondosa figueira
numa noite escura, sem luar,
num turbilhão de temores e desejos

É apagar de vez da memória
--- da instintiva recordação dos sentidos –
a sua carne quente e macia,
o seu perfume de mulher,
os seus lábios úmidos e rubros,
e sua língua, adocicada,
que se emaranhava na minha
tendo, apenas,  por testemunhas
o nosso morno céu da boca
e os dentes, levemente apartados.

Impossível é não lembrar
do nosso  orgasmo, simultâneo,
copioso e arrebatador
que lançou místicas sementes
de nova vida em potencial
em seu ventre fértil e receptivo.

Impossível é sobreviver ao tempo,
à sua sanha destruidora
e jamais temer a morte,
com seu mistério de aniquilação
fartamente falado, explicado,
mas incompreendido pela razão,
pelas células do organismo,
pelos múltiplos neurônios e
por nossa insuperável vaidade.

Impossível é deter a marcha
célere e irreversível das horas,
a viagem sem termo das galáxias
com seu cortejo de estrelas
girando sobre si mesmas
em monumental e cósmico balé
na vastidão universal
no vácuo, vazio de matéria,
rumo a insuspeitado destino.

É deter o abstrato tempo,
paralisá-lo num momento marcante,
imobilizá-lo em uma fração
infinitesimal de segundo
em que sejamos eternos,
tenhamos a grata sensação
de sermos fortes, deuses,
imperecíveis e ubíquos
aptos a empreender a façanha
de aniquilar a nossa angústia!   

(Poema composto em Campinas, em 4 de março de 1981).


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