Meu
credo de vida
Pedro J. Bondaczuk
O
homem prático, o que tem consciência das suas potencialidades e noção do seu
papel no mundo, não vive com a mente presa em um passado, por melhor que ele
possa ter sido, e nem tenta se projetar no futuro, que nem sabe se vai ter. Seu
tempo é o "agora". Trabalha como se fosse viver eternamente e se
prepara para deixar o "palco" do mundo, como se fosse morrer no
próximo minuto. Tem consciência de que cada momento, por mais banal que pareça,
é precioso, por ser único e poder ser o último, e procura usufruir ao máximo a
vida.
Evita
alimentar a memória com lembranças (não confundir com informações), que embora
possam ser um consolo para os que já abriram mão da luta e apenas aguardam a
morte (são tantos!), não têm um sentido prático. Age de forma incansável –
embora buscando preservar a saúde que é o seu maior capital – consciente de que
terá "a eternidade para descansar". Seu lazer é o trabalho. Bem ou
mal, este é o meu caso. Todavia, não sou cem por cento racional (ninguém é).
Destino grande espaço à emoção, embora sem deixá-la correr à rédea solta,
incontrolável e caótica como um potro xucro ou mal domado.
Passo
por cima de pequenos aborrecimentos e limito meus projetos ao factível. Ou
seja, embora dê asas às fantasias, nunca permito que estas me levem longe
demais. O passado e o futuro servem-me somente de referenciais. O primeiro, no
sentido de correção dos rumos, para evitar cometer sempre os mesmos erros e
tropeçar nos mesmos obstáculos em que já tropecei e o segundo como meta que
pretendo alcançar, mas nunca posta distante demais ou demasiadamente alta, de
forma a se tornar inalcançável. Tempero sonhos com realidade, sem pender nem
para um lado e nem para o outro, optando por seguir o complicado “caminho do
meio”, tendo que conviver, portanto, com a oposição dos dois lados.
Por
isso, quando comento fatos passados, busco fazê-lo em sentido prático. Tento
extrair – e transmitir aos outros na qualidade de comunicador – experiências e
lições. Ou, quando eventualmente sofro algum incontrolável "ataque" de sentimentalismo (às
vezes, posto que raramente, isso acontece), procuro fazer dessas recordações um
poema ou o enredo de um conto e em seguida esquecê-las. Ou, vez por outra,
ilustração de algum conceito filosófico que tento realçar. Até aqui, essa
estratégia tem dado certo. Por que, pois, mudar o que vem dando resultados? Não
faz sentido, não é mesmo?
Tudo
o que faço é coerente com meu objetivo de vida maior, que é o de tentar evitar
a "segunda morte". Ou seja, impedir a extinção de toda e qualquer
lembrança, em um futuro remotíssimo, de que vivi, amei, odiei, pensei, sonhei,
sofri, tive alegrias, tristezas e saudades. De que fui homem, consciente e
racional, integrado ao meu tempo e, sobretudo, útil. Ajo assim – reitero pela
milésima vez – não por vaidade e nem por arrogância, mas por questão de
justiça. Sou prático e não admito desperdícios, principalmente de esforços e de
talento.
Não
creio na sobrevivência da alma. Prezo as amizades autênticas, que não se
prendam a circunstâncias e a interesses, embora tenha dificuldades em
conquistar novos amigos. Mas valorizo as que simplesmente existem, sem qualquer
motivo ou razão. Entendo que elas sobrevivem ao tempo, à distância, à memória e
à própria morte. Sinto-me responsável, por exemplo, pela descendência de um
amigo morto e procuro prestar-lhe socorro nas horas de necessidade, dentro das
minhas possibilidades.
Sou
apaixonadíssimo pela vida, a despeito das muitas armadilhas do acaso e de
várias coisas desagradáveis a que as circunstâncias fortuitamente me expõem,
como perdas de pessoas queridas, dores, injustiças, traições e vai por aí
afora, males contra os quais procuro me prevenir, mas que, ainda assim, vez por
outra me atingem.
Amo
as artes, todas elas, e minha ambição sempre foi a de contar com talento para o
exercício da totalidade delas, no que sempre me frustrei, porquanto minha única
aptidão é para as letras, embora tenha muito que melhorar para atingir o
patamar de qualidade que sempre aspirei. Mas continuo tentando, tentando e
tentando, com persistência, gana e autodisciplina, sem me deixar abater pelo
cansaço ou pelo desânimo.
Este é o meu credo
de vida, raras vezes interpretado e entendido em suas reais dimensões. Neste
mundo de aparências, em que a "casca" é mais valorizada do que a
essência, tenho experimentado mais críticas do que elogios, o que não me
surpreende (embora muitas vezes me aborreça) e não deixa de se constituir até
mesmo em bênção. Meus antagonistas, ao enfatizarem meus defeitos, estão me prestando
um favor inestimável. Dão-me condições de melhorar.
Creio
que sou parte da divindade e que Deus está presente em cada célula do meu
corpo. Ao morrer, vou me transformar e cada partícula do meu ser, por ser
indestrutível, estará em algum lugar do universo. Só o que fiz ou pensei tem
remotíssima chance de sobreviver. Entre todo o conhecimento que ambiciono
conseguir, o que mais espicaça a minha curiosidade é o mais difícil de todos de
se ter: o sobre mim mesmo, ou seja, o autoconhecimento. Tento descobrir minhas
motivações e entender o que impulsiona meus atos, embora raras vezes tenha
sucesso.
Procuro
a notoriedade, mas em sentido prático. Ou seja, como chave para abrir as portas
da oportunidade. E para que minhas idéias e conceitos fiquem na memória do
maior número possível de pessoas e evitem minha "segunda morte", como
ocorreu com Platão, Homero, Sócrates, Aristóteles, Virgílio, Ovídio,
etc.etc.etc., que vêm sobrevivendo, galhardamente, ao tempo e ao esquecimento.
Não
me julgo superior e nem melhor do que ninguém, embora também não me ache
inferior ou pior e detesto receber ou dar ordens, apesar de reconhecer a
importância e a necessidade da existência de hierarquias em qualquer sociedade
organizada. Esta é a visão que tenho de mim. Se o quadro não é fiel, paciência.
Pelo menos sou sincero. Faltam meus defeitos? Estes nem preciso enumerar e
muito menos enfatizar. São visíveis demais. As pessoas que me conhecem e
convivem comigo os vislumbram sem qualquer dificuldade.
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