Decepção
dos anos 80
Pedro J. Bondaczuk
O líder chinês, Deng Xiaoping, será catalogado pelos
historiadores deste quarto final do século XX, entre outras coisas, como a
maior decepção política, para o seu povo e para a comunidade internacional,
deste dramático período. Assim que ascendeu ao poder, em meados dos anos 60, na
esteira do desaparecimento do mentor da Grande Marcha, Mao Tsé-Tung, ele chegou
a dar a impressão de ser o enviado do destino, o homem que tenderia a fazer da
mais populosa nação do Planeta, que abriga um quinto de toda a comunidade
humana em seu território, uma parceira na construção de um mundo melhor, ao
invés de antagonista dos povos que amam a liberdade. Neste mês de abril
completa-se somente um ano que a sua máscara de democrata, de reformador, de um
liberal começou a cair. Durante anos a fio a mídia internacional passou por
cima de uma série de irregularidades cometidas por Deng Xiaoping, especialmente
no que se refere a direitos humanos.
Não foi o primeiro, mas talvez seja o último, erro
de avaliação da imprensa ocidental acerca de um político. Podemos citar, por
exemplo, o ex-ditador romeno Nicolae Ceausescu, tido e havido por vários
comentaristas de renome, respeitados por suas opiniões, como um "quase
democrata", na então "Galáxia Vermelha" que orbitava ao redor da
União Soviética de Leonid Brezhnev. Após a revolução de dezembro de 1989,
todavia, a comunidade mundial pôde constatar, estarrecida, o quanto esteve mal
informada, por tanto tempo, acerca desse truculento homem público.
Com Deng, a coisa foi até pior. Em primeiro lugar,
pelas próprias dimensões e importância do seu país. Em segundo, pelas
expectativas que ele gerou, induzindo muita gente ao erro. O Ocidente investiu
maciçamente em território chinês, confiante de que seu capital estaria seguro,
já que no entender da maioria, as tímidas reformas liberalizantes, no plano da
economia, seriam irreversíveis e acompanhadas das correspondentes mudanças
políticas. Os acontecimentos de abril, maio e início de junho de 1989, principalmente,
mostraram como todos estavam tragicamente enganados.
No campo econômico, bastou o mercado começar a
funcionar, fazendo surgir um surto inflacionário, um tanto tímido, para que os
economistas do governo tremessem nas bases. No aspecto político, a primeira
manifestação de grandes proporções, que poderia ter sido facilmente esvaziada
com algumas concessões, mesmo que diminutas, produziu aquele espetáculo
dantesco do massacre da Praça da Paz Celestial. Agora Deng sai definitivamente
do palco, para dar lugar a outros protagonistas, na tragédia representada no
país mais populoso do mundo. E já vai tarde, levando consigo uma enorme
decepção de parte considerável de toda a humanidade.
(Artigo
publicado na página 11, Internacional, do Correio Popular, em 4 de abril de
1990)
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