Friday, July 12, 2013

Mês paradigmático

Pedro J. Bondaczuk

O mês de julho é pródigo em acontecimentos relevantes para Campinas, cidade que amo de paixão, da qual sou, com muito orgulho, “filho adotivo”, há já 53 anos e da qual nunca, nem remotamente, sequer cogitei de me mudar. Para quê, se aqui encontro tudo o que preciso para viver bem, com respeito e dignidade, principalmente o que mais prezo na vida: reconhecimento? Sim, sou reconhecido por meus irmãos campineiros, aos quais me empenho em retribuir com o que de melhor possuo. Mas, voltando a julho, considero-o, por todos os motivos possíveis e imagináveis, como um “mês paradigmático” para esta metrópole interiorana, de um milhão e cem mil habitantes.

Estas reflexões, todavia, não se destinam a expressar meu amor por Campinas. Este expresso no dia a dia, como jornalista, escritor e, principalmente, como cidadão. Objetivo, sim, ressaltar a importância do mês de julho para a cidade. Por que? Porque, por exemplo, este período do ano é destinado a reverenciar a memória de um dos campineiros mais ilustres, Guilherme de Almeida, eleito, tempos atrás, em votação popular, como “Príncipe dos Poetas Brasileiros”, que ele sempre foi até sua morte. O talentoso filho de Campinas ganhou, anualmente, no mês em que nos deixou para “habitar as estrelas”, para         “ficar encantado”, toda uma semana de eventos rememorativos. Como se vê, nem todos os brasileiros sofrem de fatal “amnésia” em relação às suas personalidades de destaque. O campineiro, pelo menos, tem memória em relação aos que merecem ser lembrados (e reverenciados).

Mas julho é importante para Campinas não apenas por marcar uma perda irreparável, a de Guilherme de Almeida, pois este continua vivíssimo, posto que apenas em espírito, na sua vasta e magnífica obra poética. O mês marca, também (e principalmente), o próprio aniversário de fundação da cidade, cujo 239° ano de “nascimento” será comemorado neste domingo, dia 14. Somente estas duas datas já seriam mais do que suficientes para que o campineiro considerasse este período de cada ano muito especial. Todavia, ainda há um terceiro evento, tão importante quanto os dois citados, para ampliar ainda mais a importância de julho para Campinas.

Há 147 anos – completados ontem, numa ensolarada, mas gélida quinta-feira, dia 11 – nascia, em uma casa modesta desta cidade, situada na atual Rua Regente Feijó, o maior gênio musical das Américas e, sem nenhum exagero, do mundo. Refiro-me a Antonio Carlos Gomes, o “Nhô Tonico”, apelido com que assinava os muitos autógrafos que deu em vida. Não mencionarei seus dados biográficos, porquanto não é este o objetivo destas (emotivas) reflexões. Ademais, escritores muito mais famosos e gabaritados do que eu publicaram inúmeros livros a propósito. Desconfio, até, que Carlos Gomes seja uma das personalidades brasileiras mais biografadas de todas.

Aliás, a propósito, recomendo um livro em particular, que além de tratar da biografia do “gênio musical das Américas”, analisa, minuciosamente, suas principais composições. Refiro-me a “Carlos Gomes”, de autoria do crítico e professor de História da Música da ECA/USP, Lorenzo Mammi. A obra integra a coleção “Folha Explica”, do jornal “Folha de São Paulo”. É leitura que recomendo de olhos fechados, pela riqueza de conteúdo e pela perícia com que o assunto é tratado.

Não há quem não tenha jamais lido ou ouvido qualquer referência ao “Tonico de Campinas”, como também era chamado. Mesmo os que nunca ouviram nenhuma composição de música erudita e não conheçam rigorosamente nada a propósito (infelizmente, a maioria dos brasileiros), já ouviram, com certeza, alguma vez (inúmeras vezes) os acordes iniciais, que os técnicos chamam de “protofonia”, da principal obra do ilustre campineiro: “O Guarani”. Basta que tenham ouvido, uma vez que seja, o boletim noticioso oficial, em cadeia nacional de rádio, a tal da “Voz do Brasil”, que é introduzido, diariamente, com esses acordes, para que saibam, mesmo que infimamente, como era sua forma de compor.

Agora respondam: se Carlos Gomes não fosse o gênio que foi, seria esta a introdução desse programa diário? Claro que não! Considero essa escolha como homenagem nacional (mesmo que não fosse essa a intenção) de um brasileiro que brilhou nos grandes centros culturais da Europa quando tudo o que se referisse a Brasil era considerado bizarro e selvagem. Em alguns lugares do mundo ainda é, mas a globalização e a internet começam a mudar isso.

E “O Guarani” não é a única obra genial do compositor campineiro. Há muitos artistas (de todas as artes) que acertam a mão, de cara, logo na primeira de suas produções, com a qual se consagram e se perpetuam, sem fazer nada mais que mereça consideração pelo resto da vida. Não é o caso, todavia, de Carlos Gomes. Somente de óperas (sem contar composições de outros gêneros musicais), o “gênio das Américas” legou outras nove à posteridade, a saber: “A noite do castelo” (1861), “Joana de Flandres” (1863), “Fosca” (1873), “Salcador Rosa (1874), “Maria Tudor” (1879), “O escravo” (1889), “Condor” (1891) e “Colombo” (1892).

O leitor atento certamente notou que me referi a nove óperas, mas que nomeei apenas oito. Deixei, de propósito, a nona para o final, por se tratar da minha predileta, que ouço, todos os anos, por ocasião do aniversário da cidade. “Adotei-a”, como se fosse, legitimamente minha, para homenagear minha urbe de adoção e que se intitula, apropriadamente, “Minha Campinas”. Ouçam-na, se tiverem oportunidade, e entenderão o motivo da minha passional opção.


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