Monday, July 29, 2013

Rádio e Literatura

Pedro J. Bondaczuk

O rádio foi, na primeira metade do século XX, o grande veículo de comunicação voltado às massas e não somente no Brasil, mas, sobretudo, nos Estados Unidos. Na terra de Tio Sam, por exemplo, as décadas de 20 e de 30 do século passado ficaram conhecidas como “Old-time Radio” ou “Golden Age of the Radio”. 

No Brasil, o auge desse veículo de comunicação se deu nas décadas de 40 e de 50. A despeito dos prognósticos feitos por muitos de que, com o advento da televisão (e mais tarde da internet) o rádio não teria futuro e seria logo abandonado, isso não aconteceu. Apenas mudou as características da programação e... sobrevive, mais forte do que nunca, atualmente, aproveitando-se, inclusive, dos próprios avanços tecnológicos que, supostamente, iriam “matá-lo”. Principalmente do computador pessoal, o tal do PC.

Hoje o rádio é ouvido por milhões de pessoas mundo afora, no carro (na ida para o trabalho), nos estádios de futebol (para esclarecer o torcedor sobre os lances que ele vê, mas fica em dúvida) e em todo e qualquer lugar que se possa imaginar. No meu caso, é companhia permanente, constante e insubstituível. Tenho vários receptores – um elétrico, dois portáteis sendo um deles menor do que um maço de cigarros e outro no carro – além de sintonizar as emissoras da minha preferência via computador. E quando, eventualmente, esqueço de levar comigo meu radinho de pilha, ouço meus programas prediletos pelo celular.

Sou suspeito para falar sobre rádio. Sua importância em minha vida é inigualável. Afinal, a primeira profissão que exerci e que consta da minha carteira profissional foi exatamente a de radialista. E isso, com meus verdes e promissores 18 anos de idade. Fiz um pouco de tudo nesse veículo de comunicação de massas. Fui locutor, produtor, “disk-jóckei” (função que não existe mais, que consistia em comandar programas musicais de lançamentos de novos discos), repórter, apresentador de jornal falado, comentarista (tanto político, quanto de futebol), plantão esportivo e vai por aí afora.

Amo o rádio e não apenas por haver trabalhado nele, mas por ser meu companheirão constante por anos e anos a fio. Agora o é até mais do que antes. Sobre as funções que exerci, creio que apenas não trabalhei na mesa de som e não fiz transmissões esportivas, como narrador de jogos de futebol. No mais, fiz um pouco de tudo, e sempre com entusiasmo e ludicamente. Esteja onde estiver, sempre tenho comigo um receptor bem à mão. Agora, por exemplo, neste exato momento em que redijo estas reflexões (no caso, memórias), estou sintonizado nas ondas da Rádio Bandeirantes de São Paulo. E isso não atrapalha a coordenação de idéias? No meu caso, não. Estou acostumado a escrever ouvindo rádio. E quando não ele, ouvindo alguma música suave, de preferência clássica. O silêncio absoluto é que me atrapalha.

E o que o rádio tem a ver com literatura? Na prática, nada! Mas, potencialmente, tem muito a ver. Estou convicto que nós, escritores, ignoramos esse veículo que, se fosse inteligentemente utilizado, poderia nos ser de imensa valia. Baseio-me em uma experiência pessoal de 1961, quando trabalhava na Rádio Emissora ABC, de Santo André, município da Grande São Paulo. Na ocasião, cismei de apresentar um programa só de Literatura, com informações sobre lançamentos de livros, entrevistas com escritores, apresentação de textos literários etc. etc.etc. Levei a idéia à direção da emissora, que tentou me demover dessa “infeliz” (no entender do diretor de programação) iniciativa.

Não me dei por vencido. Comprei um horário, que repassei para patrocinadores, no caso, algumas livrarias da cidade. Houve momento em que quase desisti e por pouco não me convenci de que estava fazendo bobagem. Será que eu não falaria sozinho, espantando ouvintes, como os colegas me advertiam que iria ocorrer? Haveria quem pudesse se interessar pelo assunto em um país que supostamente detesta leitura (e naquele tempo a coisa era infinitamente pior do que hoje, pois os índices de analfabetismo ultrapassavam os 60%)?

Qual não foi a surpresa geral, no entanto (inclusive minha), quando boletins de audiência mostraram que o programa era o terceiro mais ouvido da emissora. O segredo estava na produção. Tive muita sorte, é verdade, principalmente nas entrevistas com escritores. Coincidentemente, todos os que entrevistei tinham imensa capacidade de comunicação (convenhamos, são raros os que são assim). Além disso, eu tive o capricho de mesclar o blá-blá-blá característico do rádio com canções expressivas (nem todas sucessos populares, mas todas belíssimas) cujas letras eram cuidadosamente analisadas antes por um poeta. E o leitor há de convir que inúmeras composições do nosso cancioneiro popular são poemas musicados de extrema beleza, dignos de figurar em qualquer boa antologia. Basta analisar, entre outras, por exemplo, as letras compostas pelo “poetinha”, Vinícius de Moraes, cujo centenário de nascimento será comemorado em outubro deste ano.

Em resumo, o programa permaneceu no ar, sempre com excelentes índices de audiência, por dois anos, tive relativo lucro com ele e só saiu da programação quando fui contratado por outra emissora, para exercer função específica em que não cabia esse tipo de apresentação.

E hoje, haveria espaço para Literatura no rádio? Entendo que sim! Provavelmente, não teria a mesma audiência de então, dada a maior variedade de opções, tanto para o ouvinte fiel e constante, quanto para o apenas potencial. Todavia, desde que bem produzido, com inteligência, bom gosto e imaginação, creio que faria sucesso sim. Por que não?!!! Ademais, se ninguém tentar, jamais haveremos de saber.


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