Monday, September 10, 2012

Ciência a serviço da morte

Pedro J. Bondaczuk

O escritor norte-americano David Halloway, na introdução do seu livro “Stalin e a bomba”, sobre o programa nuclear da URSS, escreveu: “Já se disse que a história das armas nucleares é, ao mesmo tempo, fascinante e repulsiva. É uma história excitante de descoberta e invenção, mas que fala de armas que poderiam destruir toda a vida na terra. A história das armas nucleares na União Soviética é duplamente fascinante e duplamente repugnante. A fascinação é acentuada pelo mistério que a ocultou por tanto tempo. A repulsa é ampliada pela brutalidade do regime de Stalin, para o qual as armas nucleares soviéticas foram criadas”.

Concordo com essa colocação, mas com uma ressalva: não há nenhum anjinho em toda essa história, quer por parte da URSS, quer dos Estados Unidos, quer dos outros países do chamado “Clube Atômico”. Os que pesquisaram, construíram e testaram esses horrendos artefatos não prestaram nenhum serviço relevante à humanidade.

Não inventaram algo que erradicasse doenças, multiplicasse a produção de alimentos ou prolongasse a vida das pessoas, com saúde e alegria. Pelo contrário. Puseram o conhecimento científico que acumularam a serviço da morte e da destruição. Desenvolveram algo capaz de extinguir essa coisa rara no universo (ao menos ao que se saiba), que é a vida. Criaram instrumentos terríveis para arrasar com tudo e todos, o que leva os que têm bom senso e tirocínio para distinguir o bem do mal a classificar seus criadores não de “gênios” da Ciência, como são considerados, mas de loucos homicidas. O mais, de potenciais e irresponsáveis genocidas.

Ninguém, em circunstância alguma, em tempo nenhum conseguirá me convencer da utilidade, e mais, da necessidade das armas nucleares. É algo que jamais deveria ter sido pesquisado e, muito menos, construído. E, menos ainda, testado. E muitíssimo menos ainda, utilizado contra seres humanos, como foram os casos das bombas atômicas que arrasaram as cidades japonesas de Hiroshima e Nagasaki durante a Segunda Guerra Mundial. Por mais que queiram justificar essa hedionda decisão, ela jamais se justificará. Considero-a o clímax da crueldade humana.

É verdade que a história das armas nucleares não deixa de ter seu fascínio, posto que mórbido. Afinal, muito do que nos aterroriza não deixa de ser fascinante. Ficasse somente no plano da teoria, eu ficaria maravilhado com a capacidade dos cientistas de desvendarem os segredos da matéria e da energia que regem o universo. Mas, usar esse conhecimento para criar instrumentos de morte e destruição... Isso não cabe em minha limitada mente. É-me absolutamente incompreensível!!! Daí seu aspecto repugnante, também enfatizado por Halloway.

O físico teórico e professor do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP), Alberto Luiz da Rocha Barros, num informativo e esclarecedor texto, intitulado “A bomba do juízo final”, publicado na Folha de S. Paulo em 28 de abril de 2009, relata as reações ao teste da primeira bomba de hidrogênio da história – prevista para absurdos 100 megatons de potência, mas testada com “apenas” (não menos absdurdos) 50 megatons, por receio do que poderia causar ao Planeta – efetuado pela União Soviética em agosto de 1953, em Semipalatinsk, seis meses antes dos Estados Unidos também testarem a sua.

Na oportunidade, o próprio diretor do projeto atômico soviético, o físico Igor Kurchatov, assim se expressou, horrorizado: “Foi uma visão terrível e monstruosa. Essa arma não deve ser usada jamais”. E não deve mesmo. Só falta algum maluco, com instintos suicidas e simultaneamente genocidas, cismar de usá-las. E isso sequer é tão improvável quanto se supõe. Convenhamos, não dá para duvidar de nada em se tratando de seres humanos.

Já Nikita Kruschev, o controvertido ex-primeiro-ministro da União Soviética, descreveu assim sua reação sobre a bomba H: “Quando fui nomeado secretário-geral do Partido Comunista da URSS, tomei conhecimento de todos os fatos sobre o poder nuclear e não consegui dormir por vários dias”. Eu, caso soubesse o que ele sabia (e em detalhes, como era seu caso) não conseguiria dormir nunca mais.

Na sequência de seu depoimento Kruschev acrescentou: “Então fiquei convencido de que jamais poderíamos usar estas armas e quando compreendi isso, consegui dormir de novo”. Eu não conseguiria, a menos que “todos” os que dominassem esses segredos, os de fabricação de tão terrível arma, tivessem súbito ataque de amnésia e esquecessem tudo o que dissesse respeito à energia nuclear. E que tudo o que tivesse sido feito de prático para a sua construção fosse destruído.

Nada disso aconteceu. Tanto a Rússia – presumível herdeira da extinta União Soviética – quanto Estados Unidos, França e Grã-Bretanha – têm bombas de hidrogênio em seus arsenais. E para quê, se Nikita Kruschev, nos anos 50, a batizou de a “arma do juízo final”?!!

O projeto da bomba A soviética – que precedeu ao da H, que veio na sequência – teve início em 1946, por decisão de Josep Stalin. O local escolhido para a construção do laboratório foi a cidade de Sarov – que hoje tem cerca de 88 mil habitantes, localizada no Oblast de de Nijni Novgorod – que ficou conhecida pelo código Arzamas-16, logo apelidada, como destaca o físico Alberto Luiz Rocha Barros, de “Los Arzamas”, para lembrar seu equivalente norte-americano “Los Alamos” no Estado do Novo México.

É sobre esse complexo, ainda ativo, posto que não mais tão secreto quanto já foi (embora ainda de acesso restritíssimo) que me proponho a tratar, oportunamente, posto que com as escassas informações de que disponho. Para isso, valho-me de alguns livros, da vasta bibliografia a propósito que já se produziu e publicou. E isto tem algo a ver com Literatura? Sem dúvida, já que o assunto gerou tantas obras literárias, posto que mais de cunho político e científico, e não de ficção.



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