Pedro J. Bondaczuk
A nova década iniciou-se num clima de euforia no mundo todo, em virtude das dramáticas mudanças que vêm se verificando em todo o Leste europeu, em decorrência, principalmente, da política de abertura encabeçada pelo presidente soviético, Mikhail Gorbachev.
Essa região passou a ocupar o espaço nobre nos noticiários em todos os tipos de mídias, com revelações de reformas cada vez mais surpreendentes, principalmente a partir do segundo semestre de 1989. Em julho desse ano, por exemplo, o proscrito sindicato Solidariedade, após ter conquistado status de legalidade, assumiu o poder na Polônia.
Em setembro, caiu o governo de linha-dura do comunista Erich Honecker na Alemanha Oriental. Em novembro, o malfadado Muro de Berlim veio abaixo, transformando-se numa fonte de renda e não mais na divisória de um mesmo povo, ao virar souvenir de colecionadores. O mundo festejou, evidentemente, tais fatos auspiciosos.
Mas tamanha euforia estaria correspondendo à realidade mundial? Haveria tanto motivo para festa neste Planeta, superpovoado por cerca de 5,3 bilhões de pessoas, dois terços dos quais vivendo na miséria e empobrecendo crescentemente?
Para complicar as coisas no Terceiro Mundo, a Organização Mundial de Saúde constatou que a epidemia de Síndrome de Imunodeficiência Adquirida, a mortal Aids, que vem diminuindo nos países desenvolvidos, está tendo explosiva disseminação na parte carente do Planeta.
Aliás, era de se esperar que algo assim acontecesse. A lógica diz que organismos depauperados, debilitados pela fome ou subnutrição, são muito mais propensos a moléstias infecciosas, seja de que natureza forem, do que os de indivíduos bem-alimentados (às vezes até demais).
A revelação da contaminação pelo vírus fatal em Uganda, é estarrecedora. Para os que acham que a cifra de 1,6 milhão de portadores do HIV, informada, ontem, pelo primeiro-ministro desse país, Samson Kisekka, é exagerada, é mister que se frise que se há algum exagero, este, provavelmente, é para menos.
A Organização Mundial de Saúde estima que no ano 2000, haverá em torno de 20 milhões de contaminados. Destes, 80%, certamente, serão do Terceiro Mundo, onde os sistemas de assistência médica quase não passam de ficção, a educação é inadequada e virtualmente empírica, quando não destinada a conservar uma reduzidíssima e insensível eli8te no poder e os meios de comunicação se voltam à lucrativa atividade de divertir, ou desinformar, em detrimento do exercício do seu importantíssimo papel de esclarecimento.
(Artigo publicado na página 14, Internacional, do Correio Popular, em 14 de junho de 1990)
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