Visões da primavera
Pedro J. Bondaczuk
A primavera, como tema literário, é assunto recorrente. Embora se preste a todos os gêneros – a escritores imaginosos e criativos, óbvio –, é explorado, mais, pelos poetas. Era de se esperar, não é mesmo? Ainda assim, não deixa de ser permanente desafio a quem se aventure a tratá-lo. Como ser criativo e original na abordagem de um tema tão explorado? Com talento, evidentemente. E haja talento!
Há uma semana venho me dedicando a uma deliciosa pesquisa, dessas que dão vontade de tornar permanentes, pela satisfação estética que proporcionam. Explico. Tenho lido, madrugadas adentro, um punhado de antologias poéticas, nacionais e estrangeiras, blogs e sites literários, além de minha vasta hemeroteca, garimpando textos, de poesia ou não, que tenham por tema a primavera.
Encontrei uma quantidade impressionante! Daria para preencher, sem nenhum exagero, uma coleção inteira, de grossos e alentados volumes, só com o que já foi escrito a respeito e que tenho em meu poder. E meu acervo pessoal, embora vasto, é apenas minúscula gota de água em vastíssimo oceano de criação artística. É fascinante ler em conjunto tamanha variação sobre o mesmo tema.
É certo que o conteúdo desses textos se repete, de um escritor para outro, se cuidadosamente filtrado. A forma de ser explanado, todavia, é variadíssima, de acordo com a formação, o talento, a visão de mundo e até as circunstâncias de cada um. Aliás, essa repetição temática pode ser observada não somente na produção de um autor para outro, mas na obra de um mesmo escritor. Pudera! Afinal, não se trata de nenhum tema inesgotável. Por mais criativo que o sujeito seja na invenção de metáforas, o assunto abordado é limitado. E aqui cabe um superlativo (tão ao meu gosto, como vocês certamente já notaram): é limitadíssimo!
Resolvi estender ainda mais a pesquisa e fui ao meu arquivo pessoal para verificar o que já escrevi sobre a primavera. Fiquei, simultaneamente, surpreso e decepcionado com o que encontrei. A surpresa deveu-se à quantidade de textos a respeito, entre crônicas (em menor quantidade) e poesias (uma profusão delas). A decepção ficou por conta da qualidade dessa produção, não a em prosa, porém a em verso. Achei meus poemas (na maioria sonetos), um tanto piegas. Lembrei-me de imediato de uma observação que li, há algum tempo, de Fernando Pessoa, que afirmou que amores bem sucedidos inspiram, via de regra, má poesia.
Deve ser isso! Pode ser também decorrência da forma com que trato minha produção poética, ou seja, da mesma maneira que ajo em relação aos meus diários: como textos rigorosamente íntimos e pessoais, não destinados a consumo externo e, por conseqüência, à divulgação. Nunca me passou pela cabeça, por exemplo, a mais remota intenção de publicar um livro de poesias. Ademais, mesmo que tivesse essa pretensão, seria memorável façanha encontrar editora disposta a publicá-lo, a menos que eu fosse um Victor Hugo, ou Carlos Drummond de Andrade, ou Manuel Bandeira, ou Jorge Luís Borges, entre dezenas de milhares de outros. Como não sou... a probabilidade desse tipo de publicação ser viabilizado beira a zero.
Outra possibilidade é a de eu ser extremamente rigoroso em relação à minha produção poética. Muito poema – que me vi tentado até a destruir – quando avaliado por terceiros, recebeu plena aprovação. Pode ser, claro, que tenha sido aprovado apenas para me agradar. Nunca saberei qual a real intenção alheia. Ninguém sabe.
Constatei que nas últimas duas décadas, não falhei um único ano na composição de poemas sobre a primavera. Minto, não compus, ainda, o de 2012. Todavia, tenho certeza de que o comporei, na esperança de, desta vez, acertar a mão e produzir minha obra-prima, mesmo que seja somente para meu deleite pessoal.
Para não dizerem que morro de medo de me expor ao ridículo, partilho, com vocês, os cinco poemas (no caso, sonetos) sobre a primavera, compostos nos últimos cinco anos, em ordem decrescente, cônscio de suas múltiplas deficiências formais e temáticas, posto que rigorosamente espontâneos e sinceros. Ou seja, eu estava “sentindo” o que escrevi. São, portanto, instantâneos de sentimentos, no momento exato de sua ocorrência, sem tirar e nem pôr. Só peço-lhes complacência (quem sabe, piedade) em seu julgamento.
Promessas e lembranças
Doce amada, há tanta promessa em seu olhar!
Há magia, há ternura, há tanto encantamento,
que jamais poderei esquecer o momento
em que nos amamos sob a luz do luar.
Nossos corpos febris, em perfeita harmonia,
nossas almas fundidas, num só ideal,
nos seus olhos profundos, atônito, eu via
a ciência vedada do bem e do mal.
Como esquecer aquele instante de beleza,
de místico êxtase que nos dominava,
que era incomparável em toda a natureza?!
Repetir aquele instante, ó Deus, quem me dera!
Era noite clara...ao longe, um mocho piava.
O mundo despertava...era primavera!
Dá-me flores
Dá-me flores, minha doce amada,
as flores do seu sorriso lindo,
do seu amor fértil e infindo,
dá-me uma rosa fresca, orvalhada.
Dá-me um cravo, de intenso rubor,
magnólias, hortênsias, margaridas...
Ornemos de flores nossas vidas,
de todos matizes, toda cor.
A natureza, sábia, revela
que viver, afinal, vale a pena.
Dá-me flores, doce amada, bela,
tê-las todas tanto eu quisera:
minha alma, afinal, não é pequena!
Desponta, radiosa, a primavera...
Por bosques floridos
Caminhemos, de mãos dadas, embevecidos,
embriagados, pelos bosques da poesia,
a haurir o perfume deste novo dia,
de intensa luz, por estes caminhos floridos.
Vivamos, sem pudor, o nosso sentimento,
esta nossa absoluta e total comunhão,
congelemos no tempo o peculiar momento
do da alma e do corpo perfeita fusão.
Sejamos um só...assim...indissociáveis,
anjos etéreos, paradigmas da inocência
a viver fantasias inimagináveis.
Doce amada, o momento não comporta espera,
nosso amor urge, deixe de lado a prudência,
amemo-nos com fervor, pois é primavera...
Estação do amor
Veja, amada, de novo renascem as flores.
Quanto encanto! Quanta beleza e poesia!
Que espetáculo ímpar de luzes e de cores!
Você ilumina minha vida... meu dia...
Dos seus olhos emanam mensagens sutis.
Emana toda a inspiração de que preciso.
Nas árvores cantam, em festa, os bem-te-vis,
e eu me embeveço no frescor do seu sorriso.
Esqueço as mágoas, os desencantos, saudades,
e renovo, com fervor, minha tíbia crença,
meus sonhos loucos e todas minhas verdades,
na contemplação do seu juvenil frescor
e no sutil encanto da sua presença.
Afinal, é primavera...estação do amor!
Eterna primavera
Veja, amada, de novo é primavera.
E veio com mais charme desta vez.
Pudera, querida – ah, meu Deus, pudera! –
vê-la vestida de ouro dos ipês!.
Pudera, meu anjo – que veleidade! –
ó doce amada, alma gêmea minha,
dar-lhe o mundo – quanta felicidade! –,
do meu destino fazê-la rainha!
Seria feliz e realizado.
Só busco seu bem e a sua alegria,
apesar de ferido e de cansado
e do desgaste da angustiante espera.
Quero viver com paz, com harmonia,
fazer da vida eterna primavera.
Voltarei, certamente, ao tema, enfocando o tratamento dado por outros poetas (apenas uma meia dúzia deles) a esse recorrente assunto.
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