Sunday, February 19, 2017

Reformas não têm receitas prontas


Pedro J. Bondaczuk


A despeito dos esforços empreendidos pelo presidente soviético, Mikhail Gorbachev, no sentido de modernizar e, sobretudo, humanizar o sistema social do seu país, que assumiu um rumo diametralmente oposto ao sonhado pelos mentores da Revolução Bolchevique de 1917, --- o stalinismo foi um autêntico e clássico golpe de Estado --- todo o arcabouço comunista montado ao longo de mais de sete décadas está desmoronando. Não somente na URSS, num processo aceleradíssimo de empobrecimento --- a queda do Produto Interno Bruto prevista para este ano é de 11,5% --- mas em todo o Leste europeu.

Vários países, como Hungria, Polônia e Checoslováquia, já se livraram do marxismo, mas não sabem o que fazer com suas respectivas reformas. Tropeçam na ausência de lideranças democráticas e na ignorância do próprio povo acerca das leis que regem o mercado livre.

Verdadeiras romarias de estadistas e ex-dirigentes políticos do Ocidente, além de banqueiros e de empresários, têm se formado, rumo a Moscou, para ver de perto a pretensa desagregação do urso soviético. Todos vão munidos de críticas sobre o procedimento de Gorbachev, principalmente em relação às aspirações nacionalistas dos povos bálticos e caucasianos, ou levando palpites na algibeira sobre a melhor maneira de fazer a reversão do sistema centralizado de gestão da economia para algo parecido com o que existe no lado ocidental.

Mas existiriam fórmulas prontas que, mesmo tendo funcionado em algum país, possam ser transplantadas em outros? Evidentemente, não!

Cada povo tem sua própria psicologia, seu modo de ser, sua formação. As realidades de uma nação para outra são completamente diferentes. Variam tanto as condições, quanto as aspirações de um Estado para outro, para não falar de sua estrutura.

Mikhail Gorbachev, num discurso que pronunciou na cidade de Oriol, para as lideranças regionais do Partido Comunista, em 15 de novembro de 1988, destacou: "As principais diferenças entre o socialismo e o capitalismo não consistem na negação do planejamento ou das leis de mercado, mas nos interesses de quem estes são utilizados. O que importa é saber se o homem é meio ou objetivo".

Estaria o presidente soviético querendo conduzir as reformas, através do conjunto de idéias denominado "perestroika" --- que sequer é um programa acabado, mas uma série de diretrizes gerais para a elaboração de um plano reformista em profundidade --- sozinho, ditando normas de alto para baixo?

Se estivesse --- ou se está --- certamente ao invés de implantar algo de construtivo na sua sociedade, rejuvenescendo ideais, há muito esquecidos mediante uma retomada de rumos, na verdade conseguirá promover tão somente o caos nessa colcha de retalhos étnica que é a União Soviética.

O escritor inglês, H. G. Wells, em seu livro "Antecipações", advertiu, antes da Segunda Guerra Mundial: "O mundo já não pode ser refeito por indivíduos ocasionais, da mesma forma pela qual nenhuma cidade virá a ser iluminada por meio de rojões. O propósito das coisas surge de amplas questões, e o dia dos líderes individuais já passou". Se isto valia para aquela época, imagine-se hoje, no limiar do terceiro milênio da era cristã!

(Artigo publicado na página 16, Internacional, do Correio Popular, em 26 de março de 1991).

    

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