Saturday, February 11, 2017

Perestroika não é New Deal


Pedro J. Bondaczuk


O projeto reformista do presidente Mikhail Gorbachev, que objetiva recuperar principalmente a economia da União Soviética e implantar a autêntica justiça social, tem sido comparado por alguns analistas, guardadas as devidas proporções, ao "New Deal" de Franklin Delano Roosevel nos Estados Unidos.

As situações dos dois países, todavia, são tão diversas que não cabem comparações. Os problemas da URSS contemporânea são tão complexos que a solução para eles ainda não foi sequer vislumbrada.

A perestroika pode vir a se tornar o início dessa tentativa de restruturação, que irá demandar muito tempo, algumas gerações, e grandes investimentos, principalmente em termos de sacrifícios, que os soviéticos não estão dispostos a fazer.

O programa norte-americano foi emergencial, para uma determinada ocasião e tinha latentes as condições ideais para dar certo. O sociólogo Daniel Bell observou o seguinte a esse propósito: "Um retrospecto histórico: o que foi o New Deal de Franklin D. Roosevelt? Para uns, foi um 'socialismo sorrateiro', para outros foi um 'socialismo salvador'. Talvez o ponto central seja o fato de que foi uma resposta a uma mudança em escala. De 1910 a 1930, houve um crescimento dos mercados nacionais e das empresas nacionais. Todavia, o verdadeiro poder econômico e estabilizador permaneceu nas mãos dos Estados. A ação exercida pelo 'New Deal' foi a criação de mecanismos nacionais eficazes para solucionar os problemas econômicos nacionais: uma Comissão de Valores Mobiliários para regular os mercados financeiros e um sistema de Previdência Social para proporcionar uma rede de segurança na velhice".

Os Estados Unidos passavam, na época, por mero desajuste conjuntural em sua economia. Tinham recursos próprios e potencial inexplorado a explorar para fazer a correção de rumos. Já a União Soviética tem um problema estrutural básico: nada funciona a contento ali.

A produção despenca, de ano para ano, por falta de incentivo a quem produz. A distribuição dos produtos é catastrófica. Os investimentos são equivocados. As novas tecnologias desenvolvidas levam muito tempo para chegar à indústria e quando chegam estão defasadas.

Além disso, o país precisa desesperadamente de capitais. Dessa forma, não dispõe nem de recursos econômicos e nem de potencial humano motivado para reformar suas estruturas.

Não se trata de uma questão meramente de nomes, como alguns ingênuos pensam. Derrubar Gorbachev e substituí-lo por Bóris Yeltsin no governo central não vai resolver nada. Implantar o mercado a toque de caixa, como checos, húngaros e até búlgaros vêm fazendo, somente redundará nas distorções que se fazem presentes na atualidade, nas economias desses países.

O presidente soviético sabe que está lidando com um fator imponderável essencial, onde sua atuação pouco vale: a vontade do povo. Ele próprio admitiu em seu livro: "Uma das tarefas primordiais, senão a principal de esforço da restruturação, é reviver e consolidar no povo soviético um senso de responsabilidade pelo destino do país".

(Artigo publicado na página 22, Internacional, do Correio Popular, em 7 de abril de 1991).

Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk 

    

No comments: