O
gostinho do mistério
Pedro J. Bondaczuk
O conto policial sempre foi, e continua sendo,
considerado como gênero menor, até mesmo marginal, da literatura. Isto, em
termos mundiais. No Brasil, virtualmente inexiste, embora os poucos que se
aventuraram nesse campo o fizeram bem, com talento e competência. Diríamos até
com maestria. Livros e revistas, abordando esse tipo de história, batem
recordes de vendas em âmbito internacional. Constituem-se em verdadeiras minas
de ouro para os editores, que lançam edições e mais edições, em diversos
idiomas e formatos. A inglesa Agatha Christie, por exemplo, sempre esteve na
relação dos "best-sellers" mundiais, com uma produção praticamente em
série, e de ótima qualidade. Mesmo depois de morta, sua obra continua sendo reeditada,
inclusive no Brasil.
Livros de bolso, vendidos em estações de metrô dos
Estados Unidos e Europa, esgotam-se mal são lançados. São edições e mais
edições, com milhões de exemplares somados. Os autores de contos policiais
(além de novelas e romances), no entanto, apesar desse sucesso comercial, nunca
constaram de qualquer antologia, embora alguns tenham feito fortuna escrevendo
roteiros de cinema e televisão. Nenhum deles foi, jamais, candidato a qualquer
prêmio literário, mesmo aqueles de menor importância ou menos projeção. Essa
atitude não passa de preconceito. O gênero é dos mais difíceis e interessantes.
Exige do autor extrema clareza, talento descritivo, perícia na elaboração de
diálogos e uma verdadeira "engenharia" na montagem dos enredos que
prendam o leitor da primeira à última página. Minha iniciação na ficção foi
feita com esse tipo de história. Mais como leitor, é preciso confessar, do que
como autor.
O conto policial é um dos meus gêneros preferidos.
Tive a oportunidade de ler milhares deles, a maioria com qualidade bastante
superior à média. O único escritor reputado nessa vertente, objeto de estudo
dos críticos literários e considerado um verdadeiro clássico da literatura
norte-americana e mundial, é Edgar Allan Poe. E assim mesmo, não por causa do
seu texto ou estilo, mas em decorrência da sua estranha, posto que fascinante,
personalidade. Ou, mais especificamente, da sua atribulada vida, repleta de
desgraças, ele que morreu por causa do álcool, literalmente em uma
sarjeta. No entanto é tido e havido como o "pai" não apenas do conto
policial, mas também do de terror.
Durante anos, colecionei quatro revistas do gênero
que circulavam no Brasil: "X-9, Meia-Noite, Suspense e Mistério Magazine
de Ellery Queen". Familiarizei-me com personagens imortais, como o
detetive Nero Wolff --- descrito como um homem gordo, prático, sempre trajando
um capote cinza e apreciador de amendoins, que consumia às toneladas. Outro que
sempre me fascinou foi Simon Templar, "O Santo", uma espécie de Robin
Hood contemporâneo e tipicamente urbano, que combatia os fora-da-lei com as
armas destes, ou seja, com ilegalidades. É o típico "ladrão que rouba
ladrão".
Em livros, obviamente, li todos os de Arthur Connan
Doyle traduzidos para o português, deliciando-me com as peripécias de Sherlock
Holmes e de seu fiel escudeiro, o doutor Watson. E, claro, os da
"primeira-dama" do gênero policial, Agatha Christie. Além do prazer
que esse tipo de leitura sempre me deu, aprendi em suas páginas a descrever,
com clareza e precisão, cenários das ruas de uma cidade, vestuários, interiores
de residências de diversos estilos, mobiliários e tipos humanos de todas as
camadas sociais. Exercitei diálogos verossímeis, na linguagem falada pelo povo.
Pratiquei o raciocínio dedutivo e armadilhas para induzir leitores a fazê-lo
sem que se apercebessem, de modo a que nunca perdessem o interesse por uma
história antes de chegar ao final dela.
Tudo isso, é certo, encontra-se nos clássicos do
romance e do conto mundiais. Ou em livros de ficção científica --- que para o meu gosto racional, prático,
extremamente pé-no-chão, é fantasioso demais --- ou de época. Ninguém está
propondo aqui uma opção entre um gênero e outro. Um intelectual e,
especialmente, um escritor, precisa ler de tudo, sem qualquer preconceito. Mas
só os contos policiais transmitem aquele toque de suspense e de mistério que
todos apreciamos, embora alguns esnobes procurem negar. Daí minha preferência
por esse tipo de literatura tão marginalizado.
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
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