Concorrer nos limites da lei
Pedro J. Bondaczuk
O
governo, como parte da estratégia de combate à inflação que vem adotando,
reduziu as alíquotas de importação para mais de 164 produtos e para outros 55,
inclusive, zerou as taxas. Há os que se oponham a essa ação, argumentando que
nossas autoridades econômicas são incoerentes quando agem assim. Que pregam a
liberdade de mercado, mas interferem seguidamente nele.
Seriam
procedentes essas acusações? Ou os que as levantam estão, na verdade, com medo
da concorrência, acostumados com o paternalismo que sempre disseram combater,
mas sem o qual mostram não poder viver? A concorrência comercial, todavia, só
funciona quando são formuladas regras corretas, válidas para todos, e que não
mudem ao sabor dos interesses que não sejam os do consumidor.
A
esse propósito, Robert B. Reich, professor de Política Pública e de
Administração da Escola de Governo John F. Kennedy, da Universidade de Harvard,
escreveu um lúcido artigo na revista "Diálogo" do segundo trimestre
de 1988 (a publicação norte-americana é trimestral). Num determinado trecho, o
articulista levanta uma questão que merece nossa reflexão, neste momento em que
o governo fala tanto em "desrregulamentação".
Ele
escreve: "A idéia de um mercado de certo modo distanciado da lei é uma
fantasia. O mercado não foi criado pelo desígnio divino. É um artefato humano,
a soma dinâmica de um conjunto de julgamentos sobre os direitos e
responsabilidades individuais. O que é meu? O que é seu? O que é nosso? E como
podemos definir e fazer face a ações que ameaçam estas fronteiras --- roubo,
força, fraude, extorsão ou negligência? O que se deve e o que não se deve
comercializar? (Drogas? Sexo? Votos? Crianças?). Como devemos cumprir estas
decisões e que penalidades devemos impor às transgressões? À medida que se
acumulam as respostas a estas questões, cria-se sua versão de mercado".
Este
é o caminho, ao que tudo indica, que o governo está procurando enveredar, com
as medidas tendentes, não somente a estimular a concorrência, mas a sancionar
os que tentarem subverter o seu livre exercício. Liberdade em termos, é claro,
dentro dos limites do legal.
O
que é estranho é que a "desrregulamentação", que foi um termo tão
empregado, e sobretudo debatido, nos Estados Unidos, nos fins da década dos 70s
e início da dos 80s, somente agora esteja sendo ventilada entre nós. Isto
mostra o atraso em que se encontra o capitalismo tupiniquim.
(Artigo
publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 19 de outubro de 1990).
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