Thursday, February 16, 2017

Concorrer para continuar vivo



Pedro J. Bondaczuk


O combate à inflação, por parte do governo do presidente Collor de Mello, deverá ficar mais acirrado neste mês, em virtude, principalmente, do fator psicológico já tornado comum entre nós chamado de “expectativa inflacionária”. Já nos últimos dias de agosto passado circularam previsões pessimistas no mercado, em decorrência de algumas ações internas e da influência externa, determinada, principalmente, pela crise do Golfo Pérsico.

Chegou-se a prever, até mesmo, um “setembro negro”, hipótese que não deve se configurar em virtude de instrumentos de que as autoridades dispõem para controlar a escalada dos preços. Fica a expectativa de como os empresários irão se comportar, agora que o mercado livre passará a ser o regulador das transações comerciais.

Desde anteontem, a famosa tabela da Sunab (tão mencionada, mas raramente obedecida) deixou de existir como instrumento de combate à inflação. Começa, portanto, o grande teste para os agentes econômicos nacionais, uma prova de fogo para saber se eles realmente estão preparados para as transformações que vêm caracterizando os dois últimos anos, em termos de economia.

Cada vez mais, a dobradinha qualidade/preço vai ser o fator determinante até da sobrevivência de vários empreendimentos existentes no País. Quem tiver cacife, for criativo, contar com visão de médio e longo prazo e tiver jogo de cintura, não somente conseguirá sobreviver, como, e principalmente, vai prosperar.

Com a abertura das importações, a preços competitivos, a corrida pelas vendas não terá mais somente gente despreparada, que prefere um mau acordo a uma boa demanda. Não se tenha dúvidas de que produtos estrangeiros entrarão com um grande apetite neste mercado potencialmente tentador – a despeito do achatamento salarial – e para vencer.

Aliás, o governo conta com essa concorrência para evitar alguma eventual explosão inflacionária. Além disso, está previsto um novo arrocho monetário, para diminuir a liquidez da economia. Não se trata de nenhuma ação que preocupe o público diretamente, já que esse “enxugamento” vai acontecer via bancos, que terão que fazer depósitos maiores no Banco Central.

O crédito, portanto, será mais escasso e, conseqüentemente, mais caro. Um eventual repasse desse aumento de juros que a medida irá acarretar, todavia, seria um suicídio administrativo cometido por quem fizer isso, se for levada em conta a concorrência dos produtos estrangeiros (mais baratos e de melhor qualidade), que deverá se acirrar em setembro. Por tudo isso, embora o mês certamente não venha a se constituir numa primavera de prosperidade, também não será a catástrofe prevista pelos mal-acostumados e pelos incompetentes.

(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 4 de setembro de 1990)


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