Monday, February 06, 2017

Eleitor é sobretudo cidadão


Pedro J. Bondaczuk


A menos de 90 dias do primeiro turno das próximas eleições para governos e assembléias estaduais e para a renovação total da Câmara de Deputados e de um terço do Senado, prevalece um clima de apatia geral entre os eleitores, certamente desencantados com os políticos.

É certo que as generalizações são sempre injustas. Mas nossos homens públicos, em especial nossos pretensos “representantes”  no Congresso, nos decepcionaram solenemente. Elaboraram, por exemplo, num prazo anormalmente longo (o mais prolongado de nossa história), uma Constituição repleta de ambigüidades e de incoerências que, em menos de dois anos de vigência, já está requerendo urgentes reformas.

Abusaram do direito de faltar ao trabalho, sob o pretexto de estarem atuando junto às suas bases. Eu não mantive contato com o deputado que elegi. A mesma coisa ocorreu com a grande maioria (senão a totalidade) das pessoas que conheço. Para complicar tudo, quando os parlamentares trabalharam, gastaram um tempo imenso (regiamente remunerado) discutindo o “sexo dos anjos”.

Por isso, não será surpresa nenhuma se a taxa de renovação da Câmara passar dos 70% e das vagas em disputa no Senado chegar aos 100%. O que se percebe é um desencanto absoluto em relação aos políticos, que não se reciclaram, não se atualizaram, não modernizaram sequer o discurso, quanto mais a ação, conservando os mesmos vícios e atitudes características dos mais de 100 anos de República.

Além disso, o País permanece virtualmente sem partidos que mereçam essa designação. Há uma profusão de siglas, sob as quais os candidatos se abrigam, com programas tão vagos e redundantes, a maioria deles diferentes somente em detalhes, jamais nas substâncias, que o eleitor fica confuso na hora de escolher.

Boa parte opta por votar em branco. Continuamos, portanto, votando em homens por sua simpatia (ou demagogia) ou antipatia, jamais em idéias, programas, princípios. Já que no mundo todo a palavra da moda tem sido mudança, que tal a gente começar a mudar nossa mentalidade de como fazer política?

Este é o momento de se assumir plenamente a cidadania e não se deixar conduzir, como massa despersonalizada sem forma, por cidadãos bem falantes, pródigos em tapinhas nas costas e beijinhos nas crianças, mas que fazem da vida pública somente um trampolim para o sucesso pessoal.

Não é a democracia que se contesta, mas são os equívocos e distorções cometidos em seu nome oos contestáveis. Hoje em dia, no Brasil, é mais constatável do que nunca a observação do filósofo norte-americano Will Durant sobre as cidades: “Novamente apareceram, na moderna metrópole, aquelas condições do Oriente que haviam desfeito a personalidade e a significação do indivíduo – e a filosofia do desespero e do fatalismo ressurgiu”.

(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 12 de julho de 1990).


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