Raízes
da violência
Pedro J. Bondaczuk
O ministro da Justiça, Maurício Corrêa, afirmou, no
início da semana, que o governo está preparando um verdadeiro pacote de medidas
para tentar reduzir a violência no País. Os índices, de fato, estão alarmantes,
em especial nas maiores metrópoles brasileiras, como Rio de Janeiro – onde os
traficantes detêm o domínio de diversas favelas – São Paulo e Porto Alegre,
apenas para citar três casos.
Campinas também teve expressivo crescimento da
criminalidade em setembro passado, conforme atestou matéria publicada pelo
“Correio Popular” no último fim de semana. As propostas do governo, se de fato
forem implementadas e não se restringirem ao terreno das boas-intenções, serão,
portanto, bem-vindas. Mas, certamente, não resolverão o problema.
É preciso, antes de tudo, que sejam atacadas as
raízes da violência. Torna-se indispensável, em princípio, reduzir as
proporções das grandes cidades, com a adoção de uma política agrária
consistente, séria, não-demagógica, que reverta o êxodo das zonas rurais para
as urbanas.
É necessário que o Brasil seja “repensado”. Hoje, o
País constitui a mais injusta das sociedades nacionais em termos de
concentração de renda. Não nos atrevemos a afirmar que a miséria seja a única
causa (ou até mesmo a principal) da criminalidade. Concordamos com o
historiador inglês, Paul Johnson, quando diz que, afirmar isso, seria uma
“tremenda injustiça com os pobres”.
Mas a extrema pobreza da maioria dos brasileiros –
de acordo com o relatório do Banco Mundial divulgado em 30 de setembro passado
– é uma dessas raízes da violência. É responsável, por exemplo, pelos 7,2
milhões de meninos e meninas de rua, expostos a toda a sorte de vícios e
perigos e que se iniciam precocemente nessa “escola do crime”. Induz, por outro
lado, pessoas carentes, sem capacitação profissional, desempregadas ou
mal-remuneradas em empregos instáveis, a se verem tentadas a obter seu sustento
à margem da lei, traficando drogas, praticando furtos e cometendo toda a sorte
de delitos.
As grandes concentrações urbanas, características
deste século, são insalubres, sob todos os aspectos, e impróprias para uma vida
civilizada. O historiador inglês Arnold Toynbee chegou a essa conclusão. O
pensador japonês Daisaku Ikeda também condenou essa forma de vida, em que as
pessoas permanecem “encaixotadas”, sem aquele espaço vital mínimo imposto pela
própria natureza.
Eça de Queiroz, no livro “A Cidade e a Serra”, diz
que em tais aglomerações o homem perde “a força e a beleza”. E acrescenta: “Na
cidade, findou sua liberdade moral; cada manhã ela lhe impõe uma necessidade, e
cada necessidade arremessa para uma dependência: pobre e subalterno, a sua vida
é um constante solicitar, adular, vergar, rastejar, aturar; rico e superior...A
sociedade logo o enreda em tradições, preceitos, etiquetas, cerimônias, praxes,
ritos, serviços mais disciplinares que os dum cárcere ou dum quartel...A sua
tranqüilidade, onde está?”
O pacote antiviolência, anunciado por Corrêa, que
prevê a reforma do sistema penitenciário, a inclusão dos grupos de extermínio
no rol dos crimes hediondos e um maior controle da venda e da manipulação de
armas de fogo pela sociedade, propõe medidas que já deveriam estar há muito em
vigor.
Mas, certamente, não resolverá o problema se não
houver esse “repensamento” do Brasil. Até porque, como diz o presidente da
República Checa, Vaclav Havel: “A salvação deste mundo humano está no coração
humano e em nenhum outro lugar”.
(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio
Popular, em 8 de outubro de 1993)
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