Genialidade e
criatividade
Pedro
J. Bondaczuk
A inteligência
excepcional com que muitas pessoas são naturalmente dotadas, essa que
classificamos, genericamente, de “genialidade”, de nada vale caso quem a tenha
não a aplique para o próprio bem e muito menos para o bem comum. Nessas
circunstâncias, ela acaba por ser pior do que a condição inversa, a conhecida
popularmente como “burrice”. De que adianta você ter asas, se não souber voar.
Ou seja, se não tiver a mais remota idéia do que fazer com elas? Em tais
circunstâncias, esse aparato típico das aves seria mais um empecilho do que
propriamente facilidade especial, não é mesmo? Há muitas pessoas assim. Ou
seja, com Quocientes de Inteligência muito superiores à média, mas que, por
algum motivo (inércia, preguiça, desconhecimento das próprias aptidões e vai
por aí afora) agem, no dia a dia, como os mais broncos dos broncos, useiros e
vezeiros em trapalhadas de toda a sorte.
Para a renomada
psicóloga norte-americana de Harvard, Shelley Carson – autora do best-seller
internacional “O cérebro criativo” – o que falta a essas pessoas é a cognição.
Ou seja, é o conhecimento que lhes possibilite fazer bom uso dessa aptidão com
que a natureza as dotou, sem a qual, conforme a especialista, elas “não
conseguem ser originais e surpreendentes”. Ou seja, podem ser tudo, menos
criativas. E sem a criatividade, não marcarão sua passagem pelo mundo. O mais
provável é que sejam ignoradas e que seu elevado QI sequer seja conhecido ou
reconhecido por quem quer que seja.
Para ser criativo é
indispensável que a pessoa seja “genial”? Para Shelley Carson, não! Qualquer
indivíduo “normal”, ou mesmo com alguma psicopatologia que não seja severa
demais a ponto de inutilizá-lo, pode ser. Foi o que a psicóloga disse na
excelente entrevista que concedeu ao jornalista Remato Grandelle, publicada
pelo jornal “O Globo” em 7 de abril de 2012, tratando do seu livro. “Não
importa o que lhe dizem, você é criativo”, assegurou a especialista. Somos todos, basta, somente, que “criemos” de
fato, ou seja, que exercitemos esse nosso não raro adormecido potencial de
criatividade, o que o escritor em especial (embora também quem exerça outras tantas atividades) exercita com
constância para desenvolver seu “métier”.Um romancista, contista, poeta etc.etc.etc.
que não for criativo tende, apenas, a tratar de lugares-comuns. Nesse caso, não
raro, cairá em ridículo.
Além de conhecimento (e
quanto mais e mais variado, melhor) a intuição tem algo a ver com criatividade?
Quanto, caso seja possível mensurá-la? Essa foi uma das perguntas feitas por
Renato Grandelle (não necessariamente com essas palavras) na mencionada
entrevista. “Pessoas intuitivas são mais criativas? Elas levam um projeto
adiante com a mesma facilidade dos racionais?”. Essa última questão foi formulada
exatamente assim pelo jornalista. Antes de transcrever a resposta da
entrevistada, pergunto-lhe, atento leitor: o que você acha a propósito? Veja o
que Shelley Carson pensa a respeito: “As
pessoas que se consideram intuitivas são mais propensas a mudar seu estado de
ativação de cérebro. Elas estão mais dispostas a ‘baixar o volume’ daquelas
partes do cérebro que nos ajudam a focar a atenção. Uma das funções principais
do córtex pré-frontal é inibir informações irrelevantes de entrar em nossa consciência.
Esta é a essência da concentração. No entanto, esta habilidade para focar
também limita nosso acesso à informação tangencial, que pode nos ajudar a
resolver criativamente os problemas. Ser capaz de desfocar a atenção é útil
para a criatividade”.
Uma questão que
geralmente vem à baila quando converso com amigos sobre criatividade é se a
rotina interfere de alguma forma, para o bem ou para o mal, nela. As opiniões
que colhi são as mais diversas possíveis. Da minha parte, não vejo
interferência alguma, nem positiva e nem negativa. Minha preferência pessoal,
até por temperamento, é fazer as coisas, sempre que possível, da mesma forma,
no mesmo horário e no mesmo lugar. Nem por isso minha criatividade aumentou ou
diminuiu. Já escrevi textos que me surpreenderam pela inegável alta qualidade
nos horários mais malucos e nos lugares mais inusitados. Meu melhor poema, por
exemplo, foi escrito no Estádio Moisés Lucarelli, durante um emocionante jogo
de futebol entre a Ponte Preta e o Flamengo, pelo Campeonato Brasileiro da
Série A. Entendo, pois, que a interferência da rotina depende do temperamento
de cada um.
No meu caso, por
exemplo, fui “adestrado” por décadas a pensar (e criar) em locais menos
rotineiros possíveis: redações de jornais. O jornalismo pode ser muita coisa,
quase tudo o que você imaginar, menos atividade rotineira. Se você não tiver
capacidade de improvisação, o que chamamos eufemisticamente de “jogo de
cintura”, não durará dias na empresa, quanto mais meses ou anos. Como se vê,
genialidade e criatividade têm pouco a ver uma com a outra (talvez nada).
Claro, se você tiver ambas, tanto melhor. Contudo, se não for gênio, mas for
culto, bem informado, atento, interessado etc.etc.etc. e, sobretudo,
persistente, não se amofine. Faço minhas as palavras de Shelley Carson: “VOCÊ É
CRIATIVO”!!! Ao menos potencialmente, cujo exercício depende exclusivamente de
você.
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
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