Tuesday, March 08, 2016

Início de nova era: das trevas à luz


Pedro J. Bondaczuk

O mais famoso e acatado ensaísta norte-americano, Henry David Thoreau – tido e havido como o inspirador do pai da independência indiana, Mohandas Karamanchand Gandhi, na tática de resistência pacífica a desmandos de governos, que redundou no surgimento da Índia atual, soberana e independente – escreveu, em um de seus tantos e memoráveis ensaios: “Muitos homens iniciaram uma nova era na sua vida a partir da leitura de um livro”. Muitas pessoas, as que não têm o hábito de ler e que tiram conclusões apressadas, afoitas, sem maiores reflexões (ou mesmo sem nenhuma), certamente acharão essa declaração exagerada. Dirão, no mínimo, que ela é meramente retórica.

A citação acima pode até parecer, á primeira vista, fruto de exagero do ilustre ensaísta. Mas... não é. A leitura de livros mudou, e para infinitamente melhor, não somente a vida de milhões, quiçá bilhões de pessoas, mundo e tempo afora, como acelerou de forma espantosa o progresso dos povos. Pode-se demonstrar que é uma das principais responsáveis pelo avançado estágio da atual civilização. Convenhamos, se ela não é um primor (e não é mesmo) e se está muito distante do minimamente desejável, é muitos, muitíssimos furos melhor do a de apenas parcos pares de anos, um ou dois séculos atrás se tanto. Basta raciocinar só um pouquinho para se chegar a esta óbvia conclusão.

A humanidade permaneceu ágrafa por milênios e milênios sem conta. Quantos? É impossível sequer de se estimar, quanto mais quantificar, por total e absoluta ausência de registros, que nem poderiam existir, pelo simples e lógico fato da inexistência de algum sistema de escrita, mesmo que rudimentar. Por um tempo imenso, predominou, pois, única e tão somente, a tradição oral, para a transmissão de descobertas, histórias, pensamentos, sentimentos etc.etc.etc. Ou seja, as várias comunidades (que nem mesmo eram tantas) dependiam exclusivamente da memória das pessoas – cuja fragilidade sequer é preciso destacar – para preservar o pouco que era possível. E, assim mesmo, o que teria  sobrevivido (se é que algo deixou de se perder), seria truncado, corrompido, alterado, muito diferente do original.

É pura questão de lógica. Nossos remotos ancestrais não eram gênios (pois se o fossem, teriam inventado, antes, algum tipo de escrita, que não inventaram, não é mesmo?). O primeiro conjunto de símbolos que se pode chamar de “alfabeto” que se conhece com alguma certeza são as “Tábuas Tártaras”, descobertas na Romênia. Elas datam de em torno de 5.500 a.C., de acordo com o método de datação do Carbono 14. Não houve nenhum outro anterior? Como saber?! Suponho que tenha existido. E talvez muitos. Mas... se existiram, perderam-se, por completo, nas brumas do tempo. Hoje, a maioria dos historiadores “aceita” que uma escrita verdadeira, que não se limitasse a somente números, teria sido “inventada”, de forma independente, em duas regiões do mundo separadas uma da outra por todo um continente. Ou seja, na Mesopotâmia (atual Iraque), mais especificamente na Suméria, em torno de 3.200 a.C. e na América Central, mas dois milênios e meio depois, em 700 a.C.

Essa, porém, é uma discussão que não tem fim. E refere-se, apenas, à escrita no Ocidente. É mais do que provável, no entanto, que haja algum método bastante anterior, de um par de milênios, no Oriente, sobretudo na China e na Índia, que dispunham, como a arqueologia comprova fartamente, civilizações relativamente muito avançadas, antes que os ocidentais deixassem as cavernas primitivas. Há historiadores, por exemplo, que afirmam terem argumentos para comprovar que no Egito foi criado um sistema inteligente e coerente de escrita, e de forma independente das demais regiões, por volta de 3.200 a.C. Todavia, da mesma forma que os arqueólogos descobriram as Tábuas Tártaras na Romênia, datadas por volta de 5.500 a.C., não ficarei nada surpreso se amanhã for anunciada a descoberta de uma forma de escrita muitíssimo mais antiga que não proceda da Suméria, da China, da América Central ou do Egito.

Dos bilhões de seres humanos que já existiram no Planeta desde o surgimento da nossa espécie (quantos? Vinte? Cinquenta? Cem? Mais? Menos? Como saber?), a lógica me induz à conclusão que pelo menos 90% foram rigorosamente analfabetos. Jamais conseguiram assimilar os símbolos que constituíam os alfabetos criados, muito menos as palavras, frases, orações etc. que sua combinação formava para compor raciocínios lógicos. Exagero? Nem tanto! Basta atentar que, há só menos de três séculos, a hoje cultíssima Europa dispunha de uma população de analfabetos que girava em torno de 80%. Tudo isso, apenas enfatiza a importância do livro, que há apenas duzentos anos, era produto bastante raro, e caro, por razões que me proponho a apresentar oportunamente. E não pensem que ele surgiu simultaneamente à invenção da escrita. Longe disso. Está claro que não. Como está claríssimo que seu surgimento deu início a nova era, que ainda está em andamento e que não sabemos onde vai dar. Mas este é um assunto que fica para outra vez.


Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk 

No comments: