Saturday, February 21, 2015

Reféns do narcotráfico



Pedro J. Bondaczuk


A violência no Rio de Janeiro, em virtude da atuação do crime organizado nos principais morros da cidade, atinge proporções absolutamente intoleráveis. A situação carioca já se caracteriza como estado de guerra civil. Exagero? Claro que não!

Qualquer pessoa que se dispuser a pôr sua vida em risco pode ir lá e conferir. O narcotráfico fez ali o que o Cartel de Medellin havia feito na Colômbia, em fins da década passada e início desta. Não há um único dia em que os meios de comunicação, em especial a televisão – que conta com o recurso irresistivelmente convincente da imagem – não mostrem confrontos armados entre bandidos e a polícia.

A população, especialmente as pessoas que vivem em prédios vizinhos dos morros, se sente abandonada. Está exposta, a cada momento, dia e noite, dentro do próprio lar, às balas perdidas dos tiroteios constantes, que têm feito um número de vítimas comparável ao produzido por franco-atiradores em Sarajevo.

Os cidadãos estão servindo de alvo, como aqueles patos existentes em parques infantis para treinar pontaria. Só que se trata de seres humanos. De pessoas honestas, que pagam seus impostos e portanto têm direito à segurança. Imagens de cadáveres expostos na rua, ou retirados de porta-malas de automóveis, tornaram-se rotineiras nos canais de televisão. Repórteres escalados para cobrir batidas policiais, nos redutos dos traficantes, correm riscos maiores do que correspondentes de guerra. Faz sentido?

Atribuir a violência, desatada pelos narcotraficantes, só à situação social do País é simplista demais. Raia à burrice! Quem faz isso não está na linha de fogo e portanto, pode se dar o luxo de ser pedante ou irresponsável. Afinal, “pimenta nos olhos dos outros...”

E os políticos, o que fazem? Tentam negar as evidências. Atribuem o noticiário sobre a criminalidade na segunda maior cidade brasileira a “campanhas” contra eles, se auto atribuindo importância maior do que na verdade têm. Com isso, propositalmente ou não, só fazem o jogo do crime organizado.

No Rio de Janeiro, o Estado perdeu as condições de impor as leis. Delegacias são freqüentemente atacadas. Algumas chegaram a montar barricadas, ou a se transformar em bunkers, para se livrar de ataques. Os criminosos provam que o poder de fato está em suas mãos.

Daí ser preciso deixar de lado essas baboseiras típicas de políticos sem iniciativa, ou seja, da formação das tais “comissões” para “estudar” problemas, e agir com energia, bom senso e decisão. E fazer isso já!

Cerca de 1,5 milhão de cariocas – o equivalente à população total de metrópoles de porte médio européias, ou à metade dos habitantes da região de Campinas – são reféns das organizações criminosas. São obrigados, até, a enfrentar a própria polícia, pois se não o fizerem, acabam mortos.

Os maus exemplos costumam frutificar. Caso o crime organizado seja o vencedor dessa guerra no Rio, sabe-se lá qual será o seu próximo passo. Uma lei natural – como a da oferta e da procura – é a que diz que “o poder não admite vácuos”. Na ex-capital federal, na outrora Cidade Maravilhosa, os narcotraficantes estão ocupando o vazio deixado pela perda de autoridade dos seus administradores.

(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 26 de outubro de 1994).


Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk         

No comments: