Razão versus mísseis
Pedro J. Bondaczuk
O ataque norte-americano à
sede do serviço de inteligência iraquiano em Bagdá, ocorrido no Sábado, embora
tenha servido para a recuperação da popularidade do presidente Bill Clinton,
conforme demonstra uma pesquisa de opinião realizada em conjunto pelo jornal
“The New York Times” e pela rede de televisão CBS, mereceu críticas, em graus
variados, de grande parte da imprensa mundial.
As
condenações variaram desde as ostensivas e contundentes, provenientes em especial
do mundo árabe, às mais sutis, que na superfície aparentavam ser elogios. A
postura dos grandes jornais, em especial europeus, contrastou, portanto, com a
posição pública dos respectivos políticos. O fato mostra, no mínimo, uma falta
de sintonia dos líderes com a opinião pública.
Não
é por acaso que John Major, François Mitterrand e Helmut Kohl, para citar
apenas alguns, estão com seus índices de popularidade tão baixos, com as
próprias carreiras políticas ameaçadas. O ataque norte-americano de Sábado diferiu
dos outros lançados contra Saddam Hussein em vários aspectos.
O
mais relevante deles é que se tratou de uma ação unilateral, sem o respaldo e a
autorização explícita do Conselho de Segurança das Nações Unidas que por razões
compreensíveis, não condenou o ato de agressão na reunião de emergência
realizada no Domingo. E nem seria possível essa condenação, já que os Estados
Unidos a vetariam, por gozarem da prerrogativa de veto na qualidade de membros
permanentes desse órgão.
A
tônica das condenações a Clinton centrou-se em comparações. O jovem presidente
democrata vem mantendo uma posição ambígua em relação às atrocidades cometidas
pelos sérvios na Bósnia-Herzegovina. No entanto, é rigoroso ao extremo para com
a Somália e mormente o Iraque, escolhido como o vilão predileto, na ausência de
uma União Soviética comunista, dos que têm uma visão perigosamente simplista de
política.
Até
mesmo nos Estados Unidos, onde 66% dos norte-americanos aprovaram o que
chamaram de “lição a Saddam Hussein”, houve vozes discordantes. Foi o caso do
principal editorial do “The New York Times”, que não se mostrou convencido com
as “provas” apresentadas acerca da suposta participação iraquiana num complô
para assassinar George Bush em abril passado, quando de sua visita ao Kuwait.
Caso
as autoridades de Bagdá tenham de fato algo a ver com o caso, seus líderes são
muito mais ingênuos e menos inteligentes do que possam parecer. Ou será que a
opinião pública mundial é encarada como tal por Clinton?
Qualquer
tentativa de matar o ex-presidente norte-americano, fosse onde fosse o local da
operação, conduziria, fatalmente, a uma suspeita óbvia. Quem se julgaria com
mais motivos para isso do que Saddam Hussein? Será que as autoridades do Iraque
não sabiam disso? Seu serviço secreto, que colheu tantos êxitos na guerra
contra o Irã, seria ingênuo a esse ponto? Desconheceria essa suspeita
automática?
É
difícil de se acreditar. Como não é plausível, também, o motivo apresentado por
Clinton, para ordenar o ataque de Sábado. A propósito, a popularidade do
presidente norte-americano saltou dos pífios 38% do início da semana passada
para 50%.
Qual
país e a que pretexto será o próximo alvo, quando a taxa de apoio voltar a
baixar – o que parece muito provável – para que o jovem político recupere mis
um pouco de prestígio junto aos seus concidadãos? É esta a “nova ordem”
internacional que se pretende implantar? Os mísseis substituirão a razão?
(Artigo
publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 30 de junho de 1993).
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