Saturday, February 28, 2015

Caminho da moderação

  
Pedro J. Bondaczuk


A União Soviética contemporânea, da época que poderíamos denominar como sendo a do pós-comunismo, tem tantas correntes de pensamento quantas são as nacionalidades que compõem a Federação. Ou seja, virtualmente, mais de uma centena. Todas elas constituem potenciais embriões de partidos, à espera, apenas, da legalização do multipartidarismo no país.

Essas facções vão desde os monarquistas, que pregam a volta dos czares, a fanáticos religiosos, de todos os matizes e graus de fanatismo. Parece, portanto, que depois de uma letargia de sete décadas, o urso está despertando de sua hibernação e voltando a pensar, embora de maneira inquestionavelmente caótica.

Das múltiplas vertentes ideológicas que se apresentam, quatro merecem destaque. A primeira é a dos conservadores comunistas de linha-dura, que têm em Joseph Stalin ainda o seu paradigma. Embora essa corrente tenha inegável força, está, evidentemente, na contramão da história.

A segunda e a terceira correntes são constituídas por reformistas, mas em graus variáveis no que se refere à abrangência e profundidade das reformas. O grupo liderado pelo presidente russo, Boris Yeltsin, quer mudanças radicais, profundas, imediatas, sem se importar com as conseqüências. Isto, porém, se nos afigura impossível, pelo menos nas atuais circunstâncias e conduziria a União Soviética à desagregação, senão ao caos de uma guerra civil indescritível.

Já a corrente encabeçada por Mikhail Gorbachev (que, aliás, foi o grande detonador das mudanças na URSS e que, por isso mesmo, arca com os ônus de um Estado ineficiente e de dimensões inéditas em todos os tempos), evidentemente, sabe que é preciso mudar. Tanto é que os dois grandes projetos reformistas, quer econômicos, quer políticos e sociais, são de sua autoria: a perestroika e a glasnost.

Mas o presidente soviético defende que tudo se faça gradualmente, passo a passo, já que pessoas, evidentemente, não são números estatísticos e serão elas que irão arcar com as conseqüências das reformas. Os soviéticos que ainda o combatem não se deram conta do humanismo com que seu líder máximo vem agindo.

Finalmente, no extremo oposto dos conservadores estão os radicais. Estes defendem o fim, puro e simples, do comunismo. Querem que o gigante euro-asiático volte a ter a mesma conformação geográfica e política de antes de 1917. Só que se esquecem de dizer à população como as coisas eram, de fato, então.

Omitem a informação de que, enquanto uma reduzidíssima elite esbanjava comida, em festas intermináveis, reunindo todo o jet-set internacional, milhões e milhões de cidadãos vegetavam na mais abjeta miséria. Milhares morriam de fome e, quando sequer pensavam em protestar, eram reprimidos e massacrados pela truculenta polícia czarista.

A história registra isso. Basta consultar esses registros. Nenhum soviético de bom-senso aceita isso de novo. De todos os caminhos propostos para a União Soviética, o Ocidente apóia o escolhido por Gorbachev. Nem é preciso ser nenhum perito em política para se enxergar que a alternativa apontada por ele é a única prudente, senão possível. O resto? Bem, o resto não passa de mero aventureirismo de quem apenas busca projeção pessoal e notoriedade.    

(Artigo publicado na página 12, Internacional, do Correio Popular, em 20 de junho de 1990).


Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk         

No comments: