Monday, February 02, 2015

Operação tipo Rambo


Pedro J. Bondaczuk

O presidente Ronald Reagan, quando da ocorrência do seqüestro do Boeing da TWA, em junho passado, e da detenção de 39 reféns norte-americanos em um bairro de Beirute, em mãos de muçulmanos xiitas, prometeu, meio em tom de pilhéria, agir, da próxima vez que algo semelhante acontecesse, como "Rambo", o personagem de Sylvester Stallone, no filme do mesmo nome. Ou seja, libertar, a poder da força, os que estivessem nas mãos dos inimigos. Ontem de madrugada cumpriu, pelo menos em parte, sua ameaça.

É verdade que não libertou reféns em qualquer temerária operação de assalto. Mas fez algo melhor. Deu uma lição, que deverá ficar inesquecível por algum tempo, aos extremistas, ao combater fogo com fogo. Aplicou "veneno" para combater o "envenenamento" e literalmente seqüestrou os seqüestradores do transatlântico italiano Achille Lauro, entregando-os ao governo da Itália, para que eles sejam julgados pelo seu delito. Conseguiu, dessa forma, a primeira vitória do "leão" contra a "vespa" incômoda, prendendo-a entre as suas "manoplas", ao invés de se limitar a dar urros, como até aqui vinha fazendo.

É claro que as circunstâncias favoráveis permitiram esse desfecho e que em seqüestros futuros (e não tenham dúvidas, eles irão ocorrer e em maior número do que até aqui) nem sempre essa mesma manobra poderá ser usada com sucesso. Afinal, os seqüestradores palestinos entregaram-se às autoridades de um país, no caso o Egito, que é leal aliado dos Estados Unidos no Oriente Médio (e que, em certa medida, substitui o Irã dos tempos do Xá como "xerife" da região).

Os egípcios são signatários de um tratado, que data de 1979, sobre a tomada de reféns, que prevê, entre outras coisas, a extradição dos autores desse ato extremista ou o seu julgamento imediato. Entre respeitar a palavra empenhada aos terroristas e honrar um documento assinado, facilitando a prisão dos seqüestradores do Achille Lauro, quem o leitor acha que o presidente Hosni Mubarak iria atender?

Outro fator que contribuiu para o sucesso da captura dos criminosos, forçando o Boeing em que viajavam a se desviar para a Sicília, mediante a pressão de caças F-14 do porta-aviões Saratoga, foi a colaboração de países da área. Síria, Grécia, Chipre e Tunísia recusaram-se a autorizar o pouso do avião egípcio em seus territórios, livrando-se, prudentemente, de encrencas.

Gregos e cipriotas pelos motivos óbvios de serem aliados naturais dos norte-americanos. A Síria por não desejar contribuir para o parcial sucesso de uma operação de um grupo ao qual não empresta apoio, já que a Frente para a Libertação da Palestina é uma facção da OLP. E a Tunísia, certamente, por ter sido pressionada e por temer nova incursões israelenses contra seu território, como a realizada no início deste mês.

Mas se a ação fulminante, e por que não dizer, moderada dos Estados Unidos teve amplo sucesso, o próprio presidente norte-americano Ronald Reagan, com sua experiência e tirocínio, está ciente de que ela poderá redundar em muita dor de cabeça no futuro. Por exemplo, os reféns, daqui por diante, estarão muito mais ameaçados quando novos seqüestros ocorrerem.

Os extremistas, por outro lado, procurarão, certamente, a cumplicidade de países que não morram de amores pelos Estados Unidos e farão o possível para dificultar a sua localização. E vão, com certeza, inventar outros meios para impedir ou pelo menos complicar, operações como a de ontem.

Falar em termos de exemplo para esses bandos de fanáticos, como muitos afoitos estão apregoando, ao exigirem que os quatro palestinos sejam extraditados para os EUA e condenados à morte, não passa de ficção. O que os extremistas mais desejam é "mártires", para que sirvam de bandeiras para aglutinar adeptos.

Esses terroristas são uns obcecados. Não medem as conseqüências dos seus atos e nem temem morrer. Se temessem, não haveriam tantas ocorrências com carros-bombas conduzidos por motoristas suicidas. A escala de valores deles é muito diferente da nossa. O fanatismo tolda a sua capacidade de compreensão da realidade.

Mas que a lição de ontem foi válida, não tenham dúvidas. Pelo menos ficou demonstrado que o terrorismo não é invencível. E que as vítimas prediletas de sua ação não estão mais dispostas a ficar de braços cruzados, apenas assistindo às suas estrepolias.

(Artigo publicado na página 12, Internacional, do Correio Popular, em 12 de outubro de 1985)


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