Operação tipo Rambo
Pedro J. Bondaczuk
O
presidente Ronald Reagan, quando da ocorrência do seqüestro do Boeing da TWA,
em junho passado, e da detenção de 39 reféns norte-americanos em um bairro de
Beirute, em mãos de muçulmanos xiitas, prometeu, meio em tom de pilhéria, agir,
da próxima vez que algo semelhante acontecesse, como "Rambo", o
personagem de Sylvester Stallone, no filme do mesmo nome. Ou seja, libertar, a
poder da força, os que estivessem nas mãos dos inimigos. Ontem de madrugada cumpriu,
pelo menos em parte, sua ameaça.
É
verdade que não libertou reféns em qualquer temerária operação de assalto. Mas
fez algo melhor. Deu uma lição, que deverá ficar inesquecível por algum tempo,
aos extremistas, ao combater fogo com fogo. Aplicou "veneno" para combater
o "envenenamento" e literalmente seqüestrou os seqüestradores do
transatlântico italiano Achille Lauro, entregando-os ao governo da Itália, para
que eles sejam julgados pelo seu delito. Conseguiu, dessa forma, a primeira
vitória do "leão" contra a "vespa" incômoda, prendendo-a
entre as suas "manoplas", ao invés de se limitar a dar urros, como
até aqui vinha fazendo.
É
claro que as circunstâncias favoráveis permitiram esse desfecho e que em
seqüestros futuros (e não tenham dúvidas, eles irão ocorrer e em maior número
do que até aqui) nem sempre essa mesma manobra poderá ser usada com sucesso.
Afinal, os seqüestradores palestinos entregaram-se às autoridades de um país,
no caso o Egito, que é leal aliado dos Estados Unidos no Oriente Médio (e que, em
certa medida, substitui o Irã dos tempos do Xá como "xerife" da
região).
Os
egípcios são signatários de um tratado, que data de 1979, sobre a tomada de
reféns, que prevê, entre outras coisas, a extradição dos autores desse ato
extremista ou o seu julgamento imediato. Entre respeitar a palavra empenhada
aos terroristas e honrar um documento assinado, facilitando a prisão dos
seqüestradores do Achille Lauro, quem o leitor acha que o presidente Hosni
Mubarak iria atender?
Outro
fator que contribuiu para o sucesso da captura dos criminosos, forçando o
Boeing em que viajavam a se desviar para a Sicília, mediante a pressão de caças
F-14 do porta-aviões Saratoga, foi a colaboração de países da área. Síria,
Grécia, Chipre e Tunísia recusaram-se a autorizar o pouso do avião egípcio em
seus territórios, livrando-se, prudentemente, de encrencas.
Gregos
e cipriotas pelos motivos óbvios de serem aliados naturais dos
norte-americanos. A Síria por não desejar contribuir para o parcial sucesso de
uma operação de um grupo ao qual não empresta apoio, já que a Frente para a
Libertação da Palestina é uma facção da OLP. E a Tunísia, certamente, por ter
sido pressionada e por temer nova incursões israelenses contra seu território,
como a realizada no início deste mês.
Mas
se a ação fulminante, e por que não dizer, moderada dos Estados Unidos teve
amplo sucesso, o próprio presidente norte-americano Ronald Reagan, com sua
experiência e tirocínio, está ciente de que ela poderá redundar em muita dor de
cabeça no futuro. Por exemplo, os reféns, daqui por diante, estarão muito mais
ameaçados quando novos seqüestros ocorrerem.
Os
extremistas, por outro lado, procurarão, certamente, a cumplicidade de países
que não morram de amores pelos Estados Unidos e farão o possível para dificultar
a sua localização. E vão, com certeza, inventar outros meios para impedir ou
pelo menos complicar, operações como a de ontem.
Falar
em termos de exemplo para esses bandos de fanáticos, como muitos afoitos estão
apregoando, ao exigirem que os quatro palestinos sejam extraditados para os EUA
e condenados à morte, não passa de ficção. O que os extremistas mais desejam é
"mártires", para que sirvam de bandeiras para aglutinar adeptos.
Esses
terroristas são uns obcecados. Não medem as conseqüências dos seus atos e nem
temem morrer. Se temessem, não haveriam tantas ocorrências com carros-bombas
conduzidos por motoristas suicidas. A escala de valores deles é muito diferente
da nossa. O fanatismo tolda a sua capacidade de compreensão da realidade.
Mas
que a lição de ontem foi válida, não tenham dúvidas. Pelo menos ficou
demonstrado que o terrorismo não é invencível. E que as vítimas prediletas de
sua ação não estão mais dispostas a ficar de braços cruzados, apenas assistindo
às suas estrepolias.
(Artigo
publicado na página 12, Internacional, do Correio Popular, em 12 de outubro de
1985)
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