Guerra que não pode ter vencedores
Pedro J.
Bondaczuk
A guerra do Golfo Pérsico, entre o Irã e o Iraque, não tem
condições de apresentar um vitorioso. Isto vem sendo dito e repetido por
estrategistas militares há oito anos, sem que nenhuma das partes lhes desse
crédito até aqui.
Esse conflito envolve uma série
de variáveis que tornam virtualmente impossível o sucesso pelas armas, quer do
lado de Teerã, quer do de Bagdá. Ambos, aliás, deixaram de perceber o óbvio,
talvez insuflados por algum esperto vendedor de armas, quem sabe, que desejava
vender seus produtos e não queria, dessa maneira, perder clientes.
Para que o Irã perdesse o
conflito, seria necessário conquistar a sua capital, Teerã, situada a cerca de
800 quilômetros de Bagdá, cercada e protegida por montanhas e por terríveis e
inclementes desertos. O presidente iraquiano, em fins de setembro de 1980, em
tom de bazófia, garantiu que em duas semanas chegarias a essa metrópole para
depor os aiatolás. Bem que ele tentou.
Os primeiros meses de batalha
constituíram-se em estrondosos êxitos militares. Cidades após cidades caíram,
uma depois da outra, aumentando a euforia árabe, que acreditava ter como aliado
principal para ganhar essa guerra o estado caótico em que a República Islâmica
se encontrava após a expulsão do xá Mohammed Rhezza Pahlevi do país.
Tudo foi bem até que os tanques
invasores chegaram à orla do deserto. As areias entravam nas lagartas e
emperravam essas máquinas de combate. As tropas e blindados empacaram. A maior
parte deles está, até hoje, no mesmo lugar, como monumentos à imbecilidade
humana.
Esse revés animou os aiatolás, que a esta altura já haviam
conseguido organizar o novo regime e remodelar suas Forças Armadas. Ocorreu o
processo inverso. Foram os iranianos que passaram a empurrar,
irresistivelmente, seus inimigos cada vez mais para o interior do seu próprio
território. Até que os guardas revolucionários e os soldados islâmicos toparam,
também, com uma intransponível barreira. A sucessão de pântanos e de lagos
artificiais criados para proteger o porto de Basra (a tradicional Bassora das
estórias das “Mil e Uma Noites”), a segunda maior cidade do Iraque.
Ali, naquele lamaçal, os persas
deixaram a nata da sua juventude. Sepultaram, em meio ao ódio irracional e à
estupidez de uma vingança estéril (ou histérica?) toda uma geração, que lhe vai
fazer falta agora, na tarefa de reconstrução.
Por isso, começou de novo,
recentemente, o refluxo iraquiano. Caso os dois países não estivessem em vias
de negociar um cessar-fogo, as tropas do general Saddam Hussein levariam de
roldão, outra vez, as defesas da República Islâmica até a orla do deserto.
Ali, inexoravelmente, teriam que
recuar de novo. E o processo prosseguiria até que os dois países se
destruíssem, totalmente exauridos. Custou muito para que os dois adversários do
Golfo Pérsico percebessem isso, que sempre foi óbvio para todos.
(Artigo publicado na página 14, Internacional, do Correio Popular, em 26
de julho de 1988).
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