Radicais iranianos ganham mais terreno
A luta pelo poder no Irã, entre o grupo fundamentalista de
linha dura, que não quer muito contato com o Ocidente, e o dos moderados, que
pretende recolocar o país no mundo, tirando essa sociedade nacional do seu
isolamento de uma década, começa a ganhar contornos cada vez mais dramáticos.
A questão do livro “Os Versos
Satânicos”, de Salman Rushdie, e mais do que o próprio romance, a forma como o
Ocidente tratou o caso, fortaleceram a posição dos seguidores diretos do
aiatolá Ruhollah Khomeini, que pretende implantar na República Islâmica um
estilo de vida à feição do que existiu nos tempos do imperador Ciro. Ou seja,
do século VIII da nossa era.
Convenhamos, pela sua colocação
geográfica, pelo seu potencial econômico e pela sua população, não fica bem a
um país, que já foi chamado de “Gendarme do Golfo Pérsico”, exercer esse papel
retrógrado.
Os iranianos, nestes últimos dez
anos, parecem ter entrado numa dessas fantásticas e fictícias “máquinas do
tempo”, criadas pela fértil imaginação de algum diretor de cinema criativo, e
andado aceleradamente para trás.
Nunca o Irã precisou tanto do
Ocidente como agora, quando saiu arrasado de uma duríssima guerra de oito anos
com o Iraque e não dispõe de capitais suficientes para a reconstrução. Estes,
até que pode conseguir, graças à reserva de petróleo de que dispõe. Mas o país
não conta com tecnologia. E o ambiente que impera ali não atrai muita gente de
fora, dada a sua permanente instabilidade.
O Ocidente, por seu turno,
cometeu um pecado mortal no caso do livro de Rushdie. Houvesse,
diplomaticamente, feito uma condenação a essa obra (que nos trechos que tivemos
a oportunidade de ler ofende, de fato, a religião muçulmana), antes de Khomeini
ter lançado, com grande senso de oportunismo político (em âmbito interno,
evidentemente) sua ordem de morte contra o escritor, e certamente os radicais
não teriam tido esse espaço de manobra. Os moderados teriam sua posição
reforçada e muita coisa que se disse e que se fez, de lá para cá, não teria
sido dita e nem feita.
A renúncia do aiatolá Ali
Montazari à sucessão do atual todopoderoso do Irã, divulgada ontem, é um duro
golpe para aqueles que tinham a esperança de transformar o Golfo Pérsico num
autêntico “mar de tranqüilidade”. Essa área, nem é preciso repetir, é muito
importante para todos os ocidentais.
É a autêntica “veia jugular”
energética da Europa e dos Estados Unidos, por ser a região de onde sai bem
mais da metade do petróleo consumido neste lado do mundo. Até quando a
diplomacia, especialmente a européia, vai continuar dando dessas mancadas,
ignorando as diferenças culturais existentes entre os povos?
(Artigo publicado na página 11,
Internacional, do Correio Popular, em 29 de março de 1989).
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