Saturday, August 10, 2013

Radicais iranianos ganham mais terreno

 Pedro J. Bondaczuk


A luta pelo poder no Irã, entre o grupo fundamentalista de linha dura, que não quer muito contato com o Ocidente, e o dos moderados, que pretende recolocar o país no mundo, tirando essa sociedade nacional do seu isolamento de uma década, começa a ganhar contornos cada vez mais dramáticos.

A questão do livro “Os Versos Satânicos”, de Salman Rushdie, e mais do que o próprio romance, a forma como o Ocidente tratou o caso, fortaleceram a posição dos seguidores diretos do aiatolá Ruhollah Khomeini, que pretende implantar na República Islâmica um estilo de vida à feição do que existiu nos tempos do imperador Ciro. Ou seja, do século VIII da nossa era.

Convenhamos, pela sua colocação geográfica, pelo seu potencial econômico e pela sua população, não fica bem a um país, que já foi chamado de “Gendarme do Golfo Pérsico”, exercer esse papel retrógrado.

Os iranianos, nestes últimos dez anos, parecem ter entrado numa dessas fantásticas e fictícias “máquinas do tempo”, criadas pela fértil imaginação de algum diretor de cinema criativo, e andado aceleradamente para trás.

Nunca o Irã precisou tanto do Ocidente como agora, quando saiu arrasado de uma duríssima guerra de oito anos com o Iraque e não dispõe de capitais suficientes para a reconstrução. Estes, até que pode conseguir, graças à reserva de petróleo de que dispõe. Mas o país não conta com tecnologia. E o ambiente que impera ali não atrai muita gente de fora, dada a sua permanente instabilidade.

O Ocidente, por seu turno, cometeu um pecado mortal no caso do livro de Rushdie. Houvesse, diplomaticamente, feito uma condenação a essa obra (que nos trechos que tivemos a oportunidade de ler ofende, de fato, a religião muçulmana), antes de Khomeini ter lançado, com grande senso de oportunismo político (em âmbito interno, evidentemente) sua ordem de morte contra o escritor, e certamente os radicais não teriam tido esse espaço de manobra. Os moderados teriam sua posição reforçada e muita coisa que se disse e que se fez, de lá para cá, não teria sido dita e nem feita.

A renúncia do aiatolá Ali Montazari à sucessão do atual todopoderoso do Irã, divulgada ontem, é um duro golpe para aqueles que tinham a esperança de transformar o Golfo Pérsico num autêntico “mar de tranqüilidade”. Essa área, nem é preciso repetir, é muito importante para todos os ocidentais.

É a autêntica “veia jugular” energética da Europa e dos Estados Unidos, por ser a região de onde sai bem mais da metade do petróleo consumido neste lado do mundo. Até quando a diplomacia, especialmente a européia, vai continuar dando dessas mancadas, ignorando as diferenças culturais existentes entre os povos?

(Artigo publicado na página 11, Internacional, do Correio Popular, em 29 de março de 1989).


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